Uma menina com deficiência no pátio fechado de uma instituição para pessoas com deficiência no Rio de Janeiro.

“Eles ficam até morrer”

Uma vida de isolamento e negligência em instituições para pessoas com deficiência no Brasil

Uma menina com deficiência no pátio fechado de uma instituição para pessoas com deficiência no Rio de Janeiro.  © 2016 Human Rights Watch

Síntese

Leonardo, 25 anos, tem distrofia muscular – uma deficiência que causa fraqueza progressiva e perda de massa muscular. Desde os 15 anos, ele morou em uma instituição de acolhimento para pessoas com deficiência no Brasil. Sua mãe achava que não tinha escolha a não ser colocá-lo lá. “Sofri muito quando Leonardo precisou ser transferido para a instituição…, mas não tive outra escolha. O Estado não me dá nenhum apoio para cuidar dele em casa”, ela disse. Sua esperança era que a instituição pudesse cuidar dele de uma forma que ela não poderia.

Leonardo dividia um quarto com outros 24 homens e mulheres com deficiência. As camas eram colocadas diretamente uma ao lado da outra, sem sequer uma cortina para dar privacidade. Leonardo não tinha controle sobre sua vida; ele estava sujeito ao cronograma e às decisões da instituição. Ele ficava na cama a maior parte do dia, mesmo para as refeições, sem nada relevante para fazer:

Eu sou colocado na cadeira de rodas de manhã, mas tenho que ser colocado de volta na cama porque... não há ninguém para me colocar de volta à noite. Sinto falta da minha casa e gostaria de morar com minha mãe, mas entendo que ela está envelhecendo e que não poderia me aguentar fisicamente.

Em 2017, Leonardo voltou a morar com sua mãe por um curto período porque a instituição onde morava não podia mais fornecer o apoio especializado que ele precisava. No final de 2018, ele se mudará para outra instituição que está em construção.

***

A experiência de Leonardo não é única. Ele é uma entre milhares de pessoas no Brasil que vivem em instituições de acolhimento para pessoas com deficiência. A maioria das pessoas entra ainda criança e continua a viver lá quando adulto, algumas por toda a vida. Nessas instituições, crianças e adultos podem enfrentar negligência, condições desumanas e abuso, com pouco respeito a sua dignidade e necessidades ou preferências individuais. Muitos adultos que vivem em instituições são vítimas de detenção ilegal, de acordo com as obrigações do Brasil perante o direito internacional, uma vez que um responsável legal os coloca nessa situação, sem reconhecer-lhes o direito de contestar essa decisão. O governo brasileiro oferece apoio insuficiente para que famílias de crianças com deficiência criem seus filhos em casa e que adultos com deficiência vivam de forma independente, resultando na escolha pela institucionalização.

De acordo com a legislação internacional, os governos devem respeitar a dignidade inerente das pessoas com deficiência, reconhecendo-as como pessoas em igualdade de condições com as demais pessoas. Isso inclui reconhecer que as pessoas com deficiência têm o direito de viver de forma independente em sociedade, e não segregadas e confinadas em instituições onde estão sujeitas ao controle por parte de outras pessoas. Os governos também devem coibir a discriminação e o abuso contra pessoas com deficiência e remover barreiras que impeçam sua plena inclusão na sociedade. Todas as crianças, incluindo crianças com deficiência, têm o direito de crescer em família. Nenhuma criança deve ser separada de seus pais por causa de uma deficiência ou pobreza.

Este relatório documenta uma série de abusos contra crianças e adultos com deficiência em instituições de acolhimento no Brasil. A pesquisa é baseada em observações diretas durante visitas a 19 instituições de acolhimento (conhecidas no Brasil como abrigos institucionais e casas-lares), incluindo 8 abrigos para crianças, bem como 5 residências inclusivas para pessoas com deficiência. Além disso, os pesquisadores da Human Rights Watch entrevistaram 171 pessoas, incluindo crianças com deficiência e suas famílias, adultos com deficiência em instituições, defensores dos direitos das pessoas com deficiência, representantes de organizações não governamentais – incluindo organizações de pessoas com deficiência –, funcionários de instituições e autoridades governamentais. A pesquisa foi realizada entre novembro de 2016 e março de 2018 nos estados de São Paulo (incluindo São Paulo e Campinas), Rio de Janeiro (incluindo Rio de Janeiro, Duque de Caxias, Niterói e Nova Friburgo), Bahia (Salvador) e Distrito Federal (incluindo Brasília e Ceilândia).

A maioria das pessoas com deficiência em instituições visitadas pela Human Rights Watch no Brasil vivia isolada da sociedade e tinha pouco mais do que suas necessidades mais básicas atendidas, como alimentação e higiene. A maioria não tinha qualquer controle relevante sobre suas vidas, era limitada pelo cronograma de atividades das instituições e pela vontade dos funcionários. Muitas pessoas ficavam confinadas em suas camas ou quartos por longos períodos ou, em alguns casos, o dia inteiro. Elas não podiam fazer escolhas simples do dia-a-dia que a maioria das pessoas faz sem sequer perceber, como quando e o que comer, com quem se relacionar, qual programa de televisão assistir, ou se vai sair e participar de uma atividade de lazer.

Em oito das instituições que a Human Rights Watch visitou, funcionários frequentemente restringiam a liberdade de adultos e crianças. Em alguns casos, funcionários prendiam os adultos à cama com pedaços de pano amarrados na cintura ou nos pulsos. Em duas instituições, os funcionários amarravam meias ou panos nas mãos de crianças para evitar que colocassem as mãos na boca, ou se coçassem, em vez de adotar outros métodos como o fornecimento de apoio pessoal individual para evitar que as crianças se machuquem. Os funcionários de algumas instituições reconheceram que davam medicamentos para adultos e crianças para controlar seu comportamento, e não para qualquer propósito médico legítimo, sem o consentimento dos adultos.

Quaisquer restrições usadas como forma de punição, controle, retaliação ou como uma medida conveniente ao trabalho de funcionários devem ser proibidas.

Adultos com deficiência tinham pouca ou nenhuma privacidade em 12 das instituições visitadas. Cerca de 30 pessoas viviam em grandes alas ou quartos com camas colocadas lado a lado, sem uma cortina ou qualquer outra separação. Algumas instituições tinham salas menores, com um número menor de pessoas, mas também com privacidade limitada. A maioria dos adultos e crianças com deficiência tinha poucos itens pessoais, ou nenhum, e, em alguns casos, eram forçados a compartilhar roupas – em um caso até mesmo escovas de dentes – com outras pessoas da instituição. Em uma instituição, os funcionários não forneciam absorventes higiênicos às mulheres durante o período menstrual, e sim fraldas. Funcionários de várias instituições não auxiliavam alguns adultos a se vestirem totalmente, de modo que os adultos usavam apenas camisas ou blusas e fraldas. A Human Rights Watch constatou que as condições e o tratamento oferecido eram particularmente ruins nas instituições visitadas que abrigavam um grande número de pessoas com necessidade de apoio intensivo. As condições e o tratamento eram desumanos e degradantes em algumas instituições para pessoas com deficiência visitadas pela Human Rights Watch no Brasil.

Um jovem amarrado a sua cama em uma instituição para 32 pessoas com deficiência no Rio de Janeiro. Funcionários em algumas instituições para pessoas com deficiência no Brasil restringem o movimento de adultos amarrando-os às barras das camas com pedaços de pano em volta dos braços ou cintura. © 2017 Human Rights Watch

Em todas as instituições para adultos visitadas no Brasil, diretores ou funcionários disseram à Human Rights Watch que quase todas as pessoas morando no local foram privadas de sua capacidade legal, ou do direito de tomarem decisões por conta própria, e se encontravam sob a curatela de outra pessoa – como o diretor da instituição ou um familiar. A maioria das pessoas é colocada em instituições por seus responsáveis legais e não pode sair sem consentimento destes, nem sequer por um curto período de tempo. Os adultos com deficiência destituídos da sua capacidade legal e colocados em instituições com base na sua deficiência contra a sua vontade, sem o seu consentimento ou com o consentimento de um responsável legal, são vítimas de detenção que é ilegal nos termos da Convenção Internacional sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), que o Brasil ratificou em 2008.

Carolina (nome fictício), uma mulher de 50 anos com deficiência física, descreve sua experiência na instituição quando conversou com a Human Rights Watch:

Este lugar é muito ruim, é como uma prisão. Eu não quero ficar aqui. Eu sou obrigada a ficar aqui. Meus filhos não querem me ajudar em casa. Embora dois dos meus filhos venham me visitar a cada duas semanas, eu nunca saio. Eu gostaria de sair, ir embora daqui. É o meu sonho. Quando você fica assim [com uma deficiência], acabou.

Crianças e adultos com deficiência tinham pouca ou nenhuma atividade relevante dentro das instituições que visitamos. Muitos ficavam deitados na cama sem fazer nada ou eram colocados na frente de uma televisão por horas a fio. A insuficiência de funcionários fazia com que as crianças com deficiência muitas vezes não tivessem contato humano regular. Poucas crianças com deficiência em instituições visitadas pela Human Rights Watch frequentavam escolas na comunidade. Aquelas que tinham acesso à educação geralmente recebiam instrução limitada, de forma segregada.

O Fundo das Nações Unidas para a Infância (UNICEF), a Organização Mundial de Saúde e décadas de pesquisa em ciências sociais revelam que ambientes institucionais podem limitar o desenvolvimento físico, intelectual, emocional e social de crianças separadas das famílias e colocadas em instituições, devido a uma estimulação ou motivação inadequada, à falta de um envolvimento ou contribuição consistente de cuidadores, à falta de reabilitação, além de outras privações.

Embora a legislação brasileira determine que a institucionalização de crianças não deva durar mais do que 18 meses, salvo comprovada necessidade fundamentada por autoridade judicial, muitas crianças com deficiência são colocadas em instituições por períodos muito mais extensos. Na maior parte das instituições visitadas, funcionários contaram à Human Rights Watch que a maioria das crianças tinha pelo menos um dos pais vivos. Muitas crianças com deficiência perdem contato com suas famílias e permanecem segregadas em instituições durante toda a sua vida. Em uma instituição, por exemplo, todos os 51 residentes estavam lá desde que eram crianças. Vários residentes tinham mais de 50 anos de idade. O diretor de uma instituição em São Paulo nos disse: “Eles ficam até morrer”.

Um quarto para 10 pessoas em uma instituição para adultos e crianças no Rio de Janeiro. Os residentes tinham pouca ou nenhuma privacidade, nem itens pessoais.  © 2017 Human Rights Watch

Segundo dados da Secretaria Nacional de Assistência Social, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Social, até 2016 havia 5.078 crianças com deficiência vivendo em instituições no Brasil. Este número provavelmente não reflete o número real, pois os dados são obtidos por meio de questionário preenchido pelas próprias instituições, sem posterior checagem ou supervisão por autoridade competente. De acordo com a mesma base de dados, 5.037 adultos com deficiência viviam em instituições.

No Brasil, as instituições muitas vezes são as únicas opções de residência de longo prazo para muitas pessoas com deficiência. Os insuficientes arranjos alternativos de moradia independente e serviços de apoio na comunidade para garantir que adultos com deficiência possam viver sozinhos, com o apoio necessário, impedem que muitos adultos sejam inseridos na sociedade. Dentro do sistema de assistência social no Brasil, as pessoas com deficiência que não podem se sustentar de forma independente ou com a ajuda de suas famílias têm direito a um benefício mensal, o Benefício de Prestação Continuada (BPC) no valor de um salário mínimo que hoje equivale a R$ 954,00. Pais de crianças com deficiência entrevistados pela Human Rights Watch confirmaram que seus filhos precisam de apoio além do BPC, incluindo serviços que não são consistentemente fornecidos pelo Estado ou não são disponibilizados em quantidade suficiente, como fonoaudiologia, fisioterapia, equipamentos de mobilidade e acesso a creches.

A maior parte dos funcionários de instituições com quem a Human Rights Watch falou era bastante comprometida e motivada a apoiar pessoas com deficiência. Eles frequentemente enfatizavam que estavam fazendo o melhor que podiam para apoiar as pessoas com deficiência nas instituições com os poucos recursos que tinham. No entanto, mesmo funcionários muito bem-intencionados muitas vezes se envolvem em práticas inaceitáveis, pois lhes faltam informações e treinamento, e porque há insuficiência de funcionários em número adequado e outros recursos para cuidar de um grande número de pessoas, especialmente pessoas com necessidade de apoio intensivo.

Respostas Governamentais

O Brasil tem um forte aparato legislativo sobre os direitos das crianças e, em 2016, o Congresso aprovou uma avançada Lei Brasileira de Inclusão (o Estatuto das Pessoas com Deficiência), que harmoniza a legislação do país com a CDPD. A lei estabelece um novo quadro de proteção, baseado em direitos, incluindo acessibilidade, educação, participação política, capacidade legal, entre outros direitos fundamentais. O governo também implementou vários programas e benefícios para apoiar pessoas com deficiência, incluindo suporte financeiro – a qual ele deve considerar fortalecer e expandir.

O governo depende quase exclusivamente de instituições privadas para acolher crianças e adultos com deficiência. A maioria dessas instituições, incluindo as que a Human Rights Watch visitou, enfrenta significativas dificuldades financeiras. O Brasil enfrenta uma grave crise econômica que tem levado a reduções e cortes orçamentários, incluindo nos serviços sociais. Algumas instituições possuem convênios com órgãos municipais ou estaduais para seu financiamento; em alguns casos, as autoridades não repassaram recursos em tempo hábil ou interromperam o financiamento de instituições por longos períodos. Em outros casos, há por parte do governo a expectativa que as instituições garantam seu próprio financiamento de forma independente, por meio de doações locais ou estrangeiras.

Uma mãe com sua filha adotiva de 3 anos que tem deficiência de desenvolvimento. O governo brasileiro deve expandir programas de adoção e acolhimento familiar para assegurar que crianças com deficiência cresçam em famílias, e não em instituições.  © 2017 Human Rights Watch

Apesar dos limitados recursos financeiros, o governo e outros que apoiam instituições devem procurar, de forma responsável, realocar os gastos para o desenvolvimento e expansão de serviços na comunidade, que sejam acessíveis e de qualidade. Pesquisas e experiências práticas em diversos países mostram que o apoio a serviços para pessoas com deficiência providos na comunidade, em vez de concentrados nas instituições de acolhimento, muitas vezes não é mais caro, ou não é significativamente mais caro, do que a institucionalização.

Instituições de acolhimento devem ser registradas pelas autoridades competentes para funcionarem no Brasil. Juízes, promotores e defensores públicos visitam instituições onde residem crianças pelo menos uma vez a cada seis meses para avaliar a situação de crianças na instituição. No entanto, o Estado não realiza o monitoramento regular de instituições para adultos com deficiência. Embora a lei exija que os mecanismos de denúncia sejam acessíveis às pessoas com deficiência, na prática eles não são para pessoas com vários tipos de deficiência, dificultando e, em alguns casos, impossibilitando-as de registrar denúncias de supostos abusos por meio dos canais existentes.

Uma iniciativa notável em andamento no Brasil para pessoas com deficiência é o programa de residências inclusivas, que oferece residência para grupos pequenos de até 10 pessoas com deficiência vindas de grandes instituições. A Human Rights Watch visitou cinco residências inclusivas. Este programa pode servir como um bom primeiro passo para permitir que pessoas com deficiência exerçam seu direito de viver de forma independente. No entanto, como funcionam atualmente, as residências não garantem totalmente esse direito. Como nas instituições tradicionais, os residentes não têm controle sobre suas vidas, sobre como e com quem morar ou mesmo se querem morar em uma residência inclusiva.

As residências inclusivas podem ser úteis a curto prazo, uma vez que o Brasil se distancia das grandes instituições de acolhimento, mas elas não devem ser vistas como uma alternativa aos programas que proporcionam às pessoas com deficiência a possibilidade de uma vida verdadeiramente independente, que pode ser facilitada por uma variedade de serviços de apoio residencial, dentro de sua própria casa, e outros serviços providos na comunidade, incluindo assistência pessoal se necessária. O governo brasileiro também está desenvolvendo programas de adoção e de acolhimento familiar para crianças, que devem ser expandidos e incluir integralmente crianças com deficiência em igualdade de condições com todas as outras crianças.

Recomendações e Caminhos a Seguir

O governo brasileiro deve prioritariamente:

  • Desenvolver um plano e cronograma para dar fim à institucionalização de crianças e adultos com deficiência e desenvolver serviços providos na comunidade para pessoas com deficiência e famílias de crianças com deficiência. Isso deve incluir esforços para realocar gastos e outros programas governamentais focados em instituições para um apoio maior às pessoas com deficiência para que elas vivam de forma independente em suas comunidades e para que famílias criem suas crianças com deficiência em casa.
  • Acabar com os abusos contra adultos e crianças com deficiência em instituições. O governo brasileiro deve criar uma força-tarefa intergovernamental e intersetorial que reúna autoridades relevantes, incluindo promotores e autoridades públicas das variadas esferas e setores de governo para monitorar sistematicamente instituições, prevenir e remediar abusos de direitos humanos, incluindo as preocupações quanto a restrições usadas como punição, controle, retaliação, ou como medida conveniente para facilitar o trabalho de funcionários; uso de medicação sem consentimento e sem propósito médico claro; e negligência. Garantir mecanismos de denúncia acessíveis.
  • Além do benefício do BPC, garantir serviços acessíveis e de qualidade para que adultos e crianças tenham uma vida independente, de acordo com suas necessidades individuais, incluindo serviços de assistência pessoal, bem como serviços específicos com base nas necessidades particulares de indivíduos. Priorizar o apoio à assistência familiar para crianças com deficiência, em igualdade de condições com as demais, inclusive apoiando famílias –incluídas as adotivas e acolhedoras – com crianças com deficiência a criá-las junto a suas comunidades.
  • Assegurar às crianças com deficiência que vivem em instituições uma educação inclusiva e de qualidade nas escolas regulares, em igualdade de condições com as outras crianças, e fornecer adaptações razoáveis ​​com base nas necessidades individuais de aprendizagem.
  • Aprimorar o programa de residências inclusivas para garantir que facilitem aos residentes uma vida independente, incluindo o exercício de habilidades essenciais para a vida diária, em vez de servirem como instituições substitutas. Todos os residentes devem estar lá voluntariamente, ter autonomia e participar da gestão da residência.
  • Assegurar que nenhuma pessoa adulta com deficiência seja privada de capacidade legal. Reformar as leis para remover o sistema de curatela com base na deficiência e substituí-lo por um sistema eficaz de tomada de decisão apoiada. Isso significa garantir que as pessoas com deficiência recebam o apoio necessário para fazerem escolhas e gerirem suas próprias vidas, inclusive quanto a tratamento médico, maternidade e paternidade, relacionamentos e sobre como querem viver suas vidas.
 

Metodologia

A pesquisa para este relatório foi realizada entre novembro de 2016 e março de 2018 nos seguintes locais no Brasil: São Paulo (incluindo São Paulo e Campinas), Rio de Janeiro (incluindo Rio de Janeiro, Duque de Caxias, Niterói e Nova Friburgo), Bahia (Salvador) e Distrito Federal (incluindo Brasília e Ceilândia).

Os estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Bahia foram selecionados por apresentarem a maior concentração de instituições de acolhimento, inclusive para pessoas com deficiência, abrigos, casas lares, e outros programas de assistência social no Brasil. O estado de São Paulo possui 1.586 equipamentos e programas desse tipo; o Rio de Janeiro tem 359; a Bahia tem 261 e o Distrito Federal 40.[1] A visita à cidade de Brasília, no Distrito Federal, também foi feita em razão de ser a sede dos escritórios de autoridades federais responsáveis pelo desenvolvimento de políticas nacionais, inclusive para adultos e crianças com deficiência.

Este relatório baseia-se em 171 entrevistas realizadas no Brasil e também por telefone, antes e após a pesquisa de campo. A Human Rights Watch entrevistou 10 crianças com idade entre 10 e 18 anos e 50 adultos com deficiência em instituições de acolhimento, incluindo 26 mulheres. Dentre outros entrevistados estão 12 pais ou outros membros da família; 50 servidores (inclusive secretários de estado e autoridades nas áreas de assistência social, infância e deficiência, membros do Congresso, juízes, promotores estaduais e federais, defensores públicos, membros de conselhos de direitos das crianças e adolescentes, membros de conselhos tutelares e assessores jurídicos); 35 funcionários de instituições; e 17 representantes de organizações não-governamentais ou defensores dos direitos das pessoas com deficiência. Sempre que possível, a Human Rights Watch falou diretamente com crianças e adultos com deficiência.

A Human Rights Watch visitou 19 instituições de acolhimento para pessoas com deficiência no Brasil, sendo 11 para adultos e 8 para crianças (cinco das quais eram especificamente para crianças com deficiência), e uma unidade de saúde para crianças com deficiência. Nós também visitamos 5 residências inclusivas para pessoas com deficiência. Realizamos 7 visitas no Rio de Janeiro; 5 em São Paulo; 1 6 no Distrito Federal; e 6 na Bahia. Também visitamos dois centros-dia para crianças e adultos com deficiência onde as pessoas ficam durante o dia e voltam para suas casas para passar a noite.

Para os propósitos deste relatório, usamos o termo “instituição” para nos referirmos a três tipos de instituições para pessoas com deficiência visitadas pela Human Rights Watch: abrigos institucionais, casa lares, hospitais de retaguarda, além de outras que são híbridas desse tipo de equipamento.

As crianças e adultos entrevistados tinham uma série de deficiências, incluindo deficiências físicas, sensoriais (cegueira, surdez e surdo-cegueira), de aprendizagem, intelectuais e psicossociais. Algumas crianças e adultos tinham deficiências múltiplas.

Neste relatório, “criança” e “crianças” são usados para se referir a qualquer pessoa com menos de 18 anos, consistente com a definição usada na legislação internacional. A lei brasileira define crianças como menores de 12 anos e adolescentes aquelas entre 12 e 18 anos.

Entrevistas com autoridades e servidores públicos foram realizadas em inglês com tradução para o português ou espanhol, com o entrevistado falando em português. Entrevistas com crianças e adultos com deficiência foram realizadas em inglês e espanhol com tradução para o português.

A fim de proteger a privacidade e a confidencialidade das pessoas que entrevistamos, não nomeamos as instituições que visitamos e usamos pseudônimos para a maioria das pessoas entrevistadas para este relatório.

Para cada entrevista, explicamos nosso trabalho em termos apropriados à idade quando necessário. Antes de cada entrevista, informamos os entrevistados sobre o objetivo da pesquisa e perguntamos se eles queriam participar. Informamos aos entrevistados que eles poderiam interromper a entrevista a qualquer momento ou recusar-se a responder quaisquer perguntas específicas sem qualquer consequência. Aos entrevistados foi reafirmado que eles poderiam livremente não responder a nenhuma pergunta.

A Human Rights Watch entrevistou crianças com deficiência de uma maneira apropriada e sensível à idade e garantiu que a entrevista fosse realizada em um local onde a privacidade do entrevistado fosse protegida.

A Human Rights Watch também consultou especialistas nacionais e internacionais em direitos da pessoa com deficiência em vários estágios da pesquisa e redação deste relatório. Também revisamos documentos oficiais, em particular a legislação sobre assistência social, sobre crianças e pessoas com deficiência, e relatórios e resoluções relevantes de órgãos de tratados das Nações Unidas, órgãos interamericanos de direitos humanos, especialistas e organizações não-governamentais.

A Human Rights Watch enviou cartas a vários órgãos governamentais sobre as preocupações detalhadas neste relatório, incluindo o Ministério do Desenvolvimento Social, o Ministério dos Direitos Humanos, o Conselho Nacional do Ministério Público, bem como os Procuradores-Gerais de Justiça, e outras autoridades estaduais e municipais responsáveis pela assistência social e pelos direitos das pessoas com deficiência das localidades onde a pesquisa foi realizada. Recebemos respostas dos seguintes órgãos: Ministério do Desenvolvimento Social, Conselho Nacional do Ministério Público, Ministério Público do Estado de São Paulo, Secretaria Municipal de Assistência e Desenvolvimento Social de São Paulo, Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, Secretaria de Ciência, Tecnologia e Desenvolvimento Social do Estado do Rio de Janeiro, e Fundação para a Infância e Adolescência do Rio de Janeiro. A lista completa de órgãos governamentais e as respostas estão anexadas à versão online deste relatório.

 

I. Contexto

Crianças e Adultos em Instituições

De acordo com dados oficiais de 2016 da Secretaria Nacional de Assistência Social, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Social, existem aproximadamente 5.078 crianças com deficiência vivendo em instituições de acolhimento.[2] No entanto, existem falhas na coleta de dados do Brasil sobre crianças que vivem em instituições e esses números possivelmente não refletem a realidade.[3] Em dezembro de 2016, 5.037 adultos com deficiência se encontravam em instituições e residências inclusivas para pessoas com deficiência.[4]

Números e Tipos de Instituições

Há 2.998 instituições de acolhimento para crianças no Brasil, das quais 2.537 acolhem crianças com deficiência, incluindo 35 instituições exclusivamente para crianças com deficiência.[5] Existem dois tipos principais: o abrigo institucional e a Casa-Lar. Os abrigos não devem abrigar mais de 20 crianças e contam com profissionais que trabalham em turnos.[6] As casas-lares são menores, projetadas para um máximo de 10 crianças, e têm o objetivo de simular um ambiente familiar, com um educador presente em período integral.[7] Existem 258 instituições de acolhimento para adultos com deficiência no Brasil, incluindo abrigos institucionais e residências inclusivas.[8] Além disso, existem outros tipos de instituições no sistema de saúde onde as pessoas com deficiência, incluindo crianças e idosos, vivem por longos períodos.[9]

Como medida de proteção, os juízes determinam o encaminhamento das crianças a instituições com base em petição do Ministério Público, que pode ser acionado pelo Conselho Tutelar respectivo, nos casos em que uma criança está em risco ou quando seus direitos foram violados (abandono, negligência ou violência) e não é possível que seja cuidada pela família.[10] As secretarias de assistência social, nas esferas estadual e municipal, e as organizações privadas que administram instituições são obrigadas a cumprir ordens judiciais para cada criança.

Os adultos com deficiência muitas vezes acabam em instituições porque lá estão desde a infância, e então permanecem na instituição ou são transferidos para uma instituição de adultos. Um adulto com deficiência também pode ser colocado em uma instituição por um parente ou diretor de instituição que tenha sua curatela, conforme descrito abaixo em mais detalhes.

Os governos estaduais e municipais administram algumas instituições para pessoas com deficiência, mas a maioria é administrada por organizações sem fins lucrativos. O financiamento de instituições provém de várias fontes, incluindo de estados e municípios, grupos religiosos, fundações privadas e indivíduos, inclusive de países estrangeiros. De acordo com dados de 2016, 32 instituições para crianças com deficiência – uma pequena amostra do número do total de instituições – recebem financiamento público, principalmente dos municípios. Entre as instituições para adultos, 201 recebem financiamento governamental.[11]

Consequências da Institucionalização de Crianças

Diversos estudos de caso demonstram que a institucionalização de crianças, independentemente de suas condições materiais, é prejudicial ao seu desenvolvimento emocional, cognitivo, físico e social quando o cuidado prestado foca apenas nas necessidades básicas, sem uma relação individualizada.[12] Segundo a UNICEF, os ambientes de instituições podem causar “atrasos no desenvolvimento e danos psicológicos irreversíveis devido à falta de um envolvimento consistente de cuidadores, estimulação inadequada, falta de reabilitação e má nutrição”. Muitas crianças com deficiência demandam acesso a oportunidades adicionais de aprendizado ou serviços especializados como reabilitação, que muitas vezes são insuficientes em instituições.[13]

Especialistas em desenvolvimento infantil revelam que a institucionalização de bebês prejudica o desenvolvimento inicial do cérebro e os coloca em risco de transtorno afetivo, atraso no desenvolvimento e atrofia neural.[14] Sobre as crianças mais velhas, o Comitê da ONU sobre os Direitos da Criança constata: “Há evidências significativas de consequências negativas para adolescentes em grandes instituições de longo prazo... Esses adolescentes experimentam menor nível de progressão educacional, dependência de assistência social e maior risco de enfrentamento de situação de rua, prisão, gravidez indesejada, maternidade ou paternidade precoce, abuso de substâncias, autoflagelação e suicídio”.[15]

Estudos mostram que crianças transferidas de uma instituição para ambientes familiares apresentam sinais de melhora em seu funcionamento intelectual e padrões de afeto, bem como redução de sinais de abstinência emocional e da prevalência de condições de saúde mental.[16] Um diretor de uma instituição no Brasil confirmou: “Quando uma criança de uma instituição volta para a família ou é adotada, é possível observar como seu desenvolvimento melhora rapidamente, é visível”.[17]

 

II. Tratamento e Condições em Instituições

A Human Rights Watch visitou 19 instituições no Brasil em três estados e no Distrito Federal, incluindo 11 instituições para adultos com deficiência e 8 instituições para crianças, incluindo 5 exclusivamente para crianças com deficiência.[18] Todas as instituições para adultos também abrigavam crianças, e algumas das instituições especializadas para crianças com deficiência também tinham adultos.

A capacidade das instituições variava de 20 a 110 pessoas. A maioria das instituições tinha aproximadamente entre 30 e 50 pessoas. Em várias instituições, a Human Rights Watch documentou abusos, incluindo maus-tratos, negligência, uso de restrições para controlar ou punir os residentes, sedação, bem como condições desumanas e degradantes. As condições e o tratamento foram particularmente abusivos nas instituições com número elevado de pessoas com necessidade de apoio intensivo.

Muitos administradores de instituições alegaram que não tinham funcionários em número suficiente para prestar atenção individualizada aos residentes. Pesquisas mostram que, para as crianças, a ausência de um cuidado individualizado é uma das principais causas de danos ao desenvolvimento da criança e de transtornos afetivos. A maioria das crianças com deficiência nas instituições não frequentava a escola. Entre aquelas que recebiam educação, esta não era significativa para o desenvolvimento de competências acadêmicas ou de competências básicas de vida e ocorriam principalmente em ambientes segregados.

Funcionários em uma instituição no Rio de Janeiro prendem as mãos de crianças com deficiência para prevenir que elas mordam seus dedos ou se arranhem, em vez de implementar outros métodos para prevenir as crianças de se machucarem, como o cuidado pessoal individualizado. Por conta da insuficiência de funcionários, “nós somos incapazes de oferecer uma atenção individualizada o tempo todo”, disse um funcionário.  © 2017 Human Rights Watch

A maior parte dos funcionários em instituições com quem a Human Rights Watch falou era altamente comprometida e motivada a apoiar pessoas com deficiência. Eles frequentemente enfatizavam que estavam fazendo o melhor que podiam com os poucos recursos disponíveis. No entanto, mesmo funcionários bem-intencionados muitas vezes se envolvem em práticas inaceitáveis ​​porque lhes faltam informações, treinamento e recursos, como funcionários adicionais para ajudá-los a cuidar de um grande número de pessoas, especialmente aquelas com necessidade de apoio intensivo.

As pessoas com deficiência têm o direito, em igualdade de oportunidades com as demais pessoas, de não serem submetidas a tratamento desumano e degradante, bem como a restrições ou tratamento médico forçados. As crianças desfrutam destes mesmos direitos, bem como o direito à educação, entretenimento e lazer.

Uso de Restrições e Isolamento

Em oito das 19 instituições visitadas, que acolhiam mais de 50 pessoas, a Human Rights Watch identificou que funcionários usavam de algum tipo de restrição em relação aos adultos e crianças residentes. Eles prendiam os residentes a barras nas camas com pedaços de pano amarrados na cintura ou nos pulsos. Em duas instituições, a Human Rights Watch viu como funcionários amarravam firmemente as mãos de crianças com meias ou panos para evitar que elas colocassem as mãos na boca ou se arranhassem.

Em uma instituição, funcionários disseram à Human Rights Watch: “às vezes usamos camisa-de-força e colocamos as pessoas em um cômodo de isolamento para se acalmarem”. Uma enfermeira disse: “às vezes, a gente amarra as pessoas com lençóis ou usamos camisa-de-força por cerca de 30 minutos até a medicação fazer efeito”. [19]

Um homem com deficiência espia pelas grades da ala psiquiátrica de uma instituição no Rio de Janeiro. Pessoas confinadas nesta área da instituição nunca deixam seus quartos, de acordo com funcionários. © 2016 Human Rights Watch

Funcionários em algumas instituições afirmaram que imobilizavam indivíduos para que não se machucassem. [20] Funcionários em instituições visitadas pela Human Rights Watch no Brasil aparentemente utilizam restrições porque não há número suficiente de funcionários para prover a atenção e apoio individualizado necessários para ajudá-los a lidar com comportamentos que poderiam ser prejudiciais. [21] Embora o governo tenha emitido diretrizes técnicas determinando quantidades de funcionários em instituições para crianças, elas não são vinculantes. Não há diretrizes para funcionários de instituições para adultos (abrigos-institucionais). [22] Em uma instituição no Rio de Janeiro, apenas quatro funcionários por turno forneciam apoio direto a 51 residentes adultos, todos com necessidade de apoio intensivo.

A restrição física nunca é aceitável como meio de punição ou controle de comportamento e pode se equiparar a tortura ou maus-tratos. O relator especial da ONU sobre tortura declarou que “qualquer restrição às pessoas com deficiência, mesmo por um curto período de tempo, pode constituir tortura e maus-tratos”.[23]

A Organização Mundial de Saúde (OMS) constatou que a agressividade e o comportamento indesejado podem surgir quando pessoas são constrangidas pela natureza intrinsecamente rígida da instituição que não dá atenção adequada às vontades e demandas pessoais.[24] A OMS está criando programas de capacitação de funcionários para prevenir situações que podem levar à agressividade, violência, e comportamentos que podem resultar em autoflagelação. Um elemento-chave é a criar um ambiente institucional que reconheça as necessidades e demandas individuais e ofereça serviços de maneira apropriada e digna. Outras alternativas incluem a criação de planos individualizados para entender e reconhecer causas, sintomas precoces e situações de tensão.[25] O governo brasileiro deve agir rapidamente para implementar esses tipos de medidas enquanto trabalha para promover a desinstitucionalização.

Confinamento a Camas e Quartos

A Human Rights Watch visitou oito instituições onde os residentes permaneciam em suas camas ou quartos continuamente ou por longos períodos, inclusive durante as refeições. Em cinco instituições para adultos, as camas tinham altas barras de metal para confinar alguns residentes com deficiência intelectual.

Muitas pessoas consideradas “muito comprometidas” por funcionários, especialmente aquelas que tinham múltiplas deficiências e não podiam se mover sozinhas, permaneciam quase continuamente deitadas em suas camas, sem fazer nada. No momento da visita da Human Rights Watch a uma instituição, 32 residentes, tanto crianças quanto adultos, estavam deitados em suas camas ou berços.[26] Em uma instituição, um funcionário confirmou que os residentes com necessidade de apoio intensivo ficavam deitados quase continuamente, sendo tirados da cama e colocados em uma cadeira de rodas apenas por curtos períodos.[27] Em uma instituição que a Human Rights Watch visitou no Rio de Janeiro, dezenas de pessoas com as chamadas deficiências “severas” ficavam separadas no andar superior do imóvel. Até oito pessoas vivam em quartos pequenos, algumas delas presas às barras de metal das camas por um pano amarrado à cintura. Uma enfermeira dessa instituição disse que lá as pessoas "nunca saem do quarto".[28]

Uma instituição especializada para pessoas com paralisia cerebral em São Paulo possuía uma ala para aquelas com necessidade de apoio intensivo, onde pessoas ficavam deitadas na cama quase todo o tempo, ligadas por tubos a tanques de oxigênio na parede. De acordo com um funcionário, residentes ficavam sentados em cadeiras de rodas por algumas horas durante as manhãs, mas tinham poucas outras atividades. Eles nunca saíam da instituição.[29] Em Salvador, em uma instituição para 87 pessoas, algumas pessoas ficavam na cama constantemente, sem estímulo ou atividade; outra instituição para 109 crianças tinha um quarto com crianças que, do mesmo modo, ficavam em camas por períodos contínuos.[30]

Um grupo de crianças com deficiência em uma instituição superlotada com 109 crianças na Bahia. 30 crianças, incluindo uma que tinha no máximo 5 anos, viviam nessa ala.  © 2017 Human Rights Watch

Em algumas instituições, a maioria dos residentes usava fraldas e sequer saía da cama para usar o banheiro. Uma enfermeira em uma instituição nos disse: “Todas as pessoas que vivem nessa ala usam fraldas”.[31] A mãe de um dos residentes disse à Human Rights Watch que ela acreditava que alguns deles, incluindo seu filho, poderiam usar banheiros se fosse oferecido o apoio adequado.[32]

A Human Rights Watch observou que as instituições visitadas não possuíam, com exceção de cadeiras de rodas em alguns casos, dispositivos de elevação ou quaisquer outros equipamentos para mobilidade, que permitissem que pessoas com deficiência física saíssem de suas camas, ou da instituição. Os residentes que não podiam se levantar e andar sem essa assistência ficavam completamente dependentes dos funcionários.

Um rapaz com deficiência física sentado em seu quarto em uma instituição na Bahia, a aproximadamente 200 metros do Oceano Atlântico. “Meu sonho é ver o mar, mas eu não tenho cadeira de rodas para ir e ver”, disse ele.  © 2017 Human Rights Watch

Por exemplo, Leonardo Barcellos, um jovem de 25 anos com distrofia muscular, foi colocado em uma instituição para pessoas com necessidade de apoio intensivo aos 15 anos. Ele vivia em um grande quarto, junto a outros 24 homens e mulheres. Ele disse à Human Rights Watch que passava grande parte do dia na cama devido à falta de funcionários:

“Eu sou colocado na cadeira de rodas pela manhã, mas depois tenho que ser colocado de volta na minha cama porque sou pesado e não há ninguém para me colocar de volta durante a noite. Sinto falta da minha casa e gostaria de morar com minha mãe, mas entendo que ela está envelhecendo e que não poderia me aguentar fisicamente.”[33]

Em uma instituição em Salvador, um jovem de 18 anos, com uma deficiência progressiva que gradualmente comprometeu os músculos de suas pernas, tinha dificuldade para sair do quarto que compartilhava com outra pessoa. Ele não tinha cadeira de rodas e andar sozinho era extremamente doloroso. Embora a instituição estivesse localizada a apenas 200 metros do mar, ele não podia ir à praia e disse à Human Rights Watch que seu sonho era "ver o mar".[34]

Condições Desumanas e Degradantes

A maioria das grandes instituições tinha um ambiente impessoal, lembrando hospitais ou mesmo centros de detenção. Em algumas instituições, portas e janelas tinham grades. As condições em instituições visitadas pela Human Rights Watch eram frequentemente desumanizantes. Em alguns casos, muitos adultos ou crianças que não partilhavam nenhum vínculo pessoal eram mantidos juntos em quartos, por vezes severamente lotados com até 32 pessoas. Além de ficarem confinados à instituição, muitas pessoas permaneciam em seus quartos ou camas durante a maior parte do dia, seja porque estavam presas às camas ou porque os funcionários não davam apoio para que as pessoas saíssem de suas camas.

Um banheiro em uma instituição nos arredores de Brasília (Distrito Federal). Muitas instituições para pessoas com deficiência no Brasil não garantem privacidade aos residentes.  © 2017 Human Rights Watch

Os residentes não tinham privacidade e tinham poucos itens pessoais. Em alguns casos, eles tinham até que dividir roupas uns com os outros – e em uma instituição, inclusive escovas de dente. Em algumas instituições para adultos, funcionários não ajudavam os residentes a se vestirem, deixando-os despidos da cintura para baixo, usando apenas fraldas. Diversas instituições anunciavam visitas ao público e pediam doações on-line usando imagens de pessoas com deficiência e as retratando como pessoas carentes, vulneráveis e necessitadas de cuidados, em vez de indivíduos autônomos. Em muitas das instituições visitadas pela Human Rights Watch, os problemas descritos abaixo criaram um ambiente de vida desumano e degradante para os residentes.

Superlotação e Falta de Privacidade

A superlotação grave foi um problema em várias instituições visitadas pela Human Rights Watch. Por exemplo, em uma instituição para 109 crianças em Salvador, um quarto tinha cerca de 28 camas distribuídas lado a lado em quatro fileiras, com muito pouco espaço para se movimentar e sem separação entre as camas para garantir privacidade básica. Em uma instituição para adultos, 32 pessoas viviam em um cômodo, novamente com camas colocadas lado a lado. Algumas instituições tinham grandes alas com apenas pequenas paredes que separavam grupos de seis a sete pessoas. Ao menos um funcionário estava constantemente presente. Uma dessas instituições superlotadas tinha um banheiro sem portas ou quaisquer outras formas de separação entre os vasos sanitários para garantir privacidade.

Em cinco instituições visitadas, as pessoas dormiam em quartos com apenas uma cama (ou várias camas), sem qualquer outro móvel, ou um colchão sobre uma plataforma de concreto.[35] Em um caso, as pessoas deitavam-se em colchões no chão. O diretor desta instituição alegou que as camas estavam sendo pintadas. Alguns dormiam em colchões sem lençol de baixo, com apenas um lençol para se cobrir. Não havia outros móveis que em geral vemos em um quarto, como uma mesa de cabeceira, prateleiras para pertences pessoais ou cômodas ou armários de roupas.

Em algumas instituições visitadas pela Human Rights Watch, os residentes não tinham nenhum item pessoal. [36] Em uma instituição, uma enfermeira nos disse: "Não temos escovas de dente separadas para cada um deles. Eles dividem”.[37] Em algumas instituições, funcionários afirmaram que as pessoas que viviam lá eram obrigadas a compartilhar roupas.[38]

Um rapaz deitado em um colchão em um quarto vazio em uma instituição no Rio de Janeiro. A maioria dos adultos e crianças com deficiência em instituições tem poucos ou mesmo nenhum item pessoal. Em várias instituições, as camas consistem em plataformas de concreto com colchões cobertos com apenas um lençol. © 2017 Human Rights Watch

A legislação internacional de direitos humanos exige que todas as pessoas com deficiência sejam tratadas com dignidade. Respeitar a dignidade inerente das pessoas com deficiência implica reconhecê-las como pessoas em igualdade com quaisquer outras, e não como objetos para tratamento e cuidado.[39] O direito internacional também estabelece o direito à privacidade, inclusive para pessoas com deficiência em igualdade de condições com as demais pessoas. Isso se aplica independentemente do local de residência ou alternativa de moradia.[40]

Fracasso em Apoiar Adultos a se Vestirem e Falta de Privacidade ao Trocar Fraldas

A Human Rights Watch visitou sete instituições, em todos os municípios, onde os funcionários não ajudavam adultos considerados com “deficiências graves” a se vestirem completamente. Como resultado, esses residentes só usavam roupas na parte superior, vestindo nada abaixo da cintura, exceto uma fralda. Isso é feito para a conveniência dos funcionários na troca de fraldas. Além disso, como as camas são colocadas próximas umas das outras, sem qualquer separação, funcionários trocavam as fraldas dos residentes com outros adultos ao redor.

Um homem com deficiência em uma instituição na Bahia vestido apenas da cintura para baixo, com fraldas. Funcionários em algumas instituições no Brasil não vestem por completo adultos com deficiência, desrespeitando sua dignidade. © 2017 Human Rights Watch

Funcionários de uma instituição disseram que as fraldas estavam em falta, e contavam com apenas duas fraldas para adultos ou crianças por dia. Como resultado, alguns residentes tinham que permanecer com fraldas sujas por longos períodos. Mulheres residentes na mesma instituição não recebem absorventes para menstruação, “então usamos fraldas”, de acordo com uma enfermeira. [41]

A Human Rights Watch considera que não vestir totalmente os residentes e não garantir privacidade ao trocar fraldas de adultos podem constituir tratamento degradante. O fracasso no fornecimento de absorventes às mulheres é desumanizante.

Negligência e Falta de Atividades Significativas nas Instituições

Em todas as instituições que a Human Rights Watch visitou, crianças e adultos com deficiência não contavam com atenção individual suficiente e atividades significativas. Na maior parte dos casos, funcionários das instituições declararam que não ofereciam atenção individual aos residentes, em razão do seu grande número, somado à falta de pessoal suficiente para trabalhar diretamente com eles. Funcionários disseram que eles se concentravam quase exclusivamente nos cuidados básicos, como alimentar, ir ao banheiro e gerenciar rotinas de repouso, com tempo para atividades de lazer apenas ocasionalmente. As observações da Human Rights Watch em instituições confirmaram que poucos funcionários cuidam de um grande número de residentes ao mesmo tempo, com pouco tempo para atender além das necessidades básicas dos residentes. Como observado acima, a falta de atenção individualizada suficiente e atendimento das necessidades individuais podem contribuir para agressão, autoflagelação e outros comportamentos indesejáveis.

Uma funcionária de uma das instituições disse que as crianças são privadas de contato pessoal. Ela disse: “Não podemos dar isso a elas. Elas precisam ser abraçadas, mas não temos tempo para abraçá-las”. Ela continuou:

“A principal questão é o cuidado individualizado… Em muitas instituições, eles só fornecem comida e uma cama. As crianças não passam tempo brincando. Os cuidadores estão preocupados apenas em dar comida e colocá-las para dormir. Não há afeto, não há brincadeira. A vida não é apenas comer e dormir.”[42]

Em muitas instituições visitadas pela Human Rights Watch, alguns ou mesmo a maioria dos residentes – adultos e crianças – ficavam apenas olhando para o que estivesse à sua frente, sem participar de nenhuma atividade. Isso acontecia em todas as 10 instituições para adultos que a Human Rights Watch visitou.

Por exemplo, em uma instituição que a Human Rights Watch visitou ao meio-dia, todos os 32 residentes estavam sentados ou deitados em um cômodo grande e escuro, sem fazer nada. Funcionários explicaram que eles apagavam as luzes regularmente por causa do calor.

Um jovem amarrado a sua cama em uma instituição para 32 pessoas com deficiência no Rio de Janeiro. Funcionários em algumas instituições para pessoas com deficiência no Brasil restringem o movimento de adultos amarrando-os às barras das camas com pedaços de pano em volta dos braços ou cintura.  © 2016 Human Rights Watch

Na ocasião da visita da Human Rights Watch a uma instituição exclusiva para crianças com deficiência no Rio de Janeiro, no meio do dia, todas as 12 crianças que viviam no local estavam deitadas em seus berços, sem nada para entretê-las.[43] Em cinco instituições no Rio de Janeiro e em São Paulo, funcionários colocavam as crianças em frente à televisão para assistir a qualquer programa.[44] Em uma instituição visitada, dezenas de crianças com menos de 10 anos tinham sido colocadas em frente a uma televisão durante todo o período da visita de quatro horas da Human Rights Watch.[45]

Algumas atividades eram organizadas dentro das instituições para crianças e adultos, inclusive trazendo grupos externos para oferecer entretenimento. Por exemplo, um grupo de voluntários vestidos de palhaços faz visitas periódicas às instituições para entreter os residentes.

Funcionários em algumas instituições disseram que ocasionalmente organizam passeios à praia, cinema e outras atividades, embora em algumas instituições isso seja raro e em outras inexistente.

Um adolescente com deficiência física vivendo em uma instituição exclusiva para crianças com deficiência disse:

“A instituição é estressante porque é barulhenta e chata. Muitas vezes não tenho nada para fazer quando não estou na escola. Eu não tenho privacidade ou um espaço só para mim. Viagens especiais de um dia são organizadas durante os fins de semana, mas a funcionária encarregada de nos levar para passear sofreu um acidente e se machucou, de modo que, no momento, não estamos saindo.”[46]

A Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC) estabelece o direito de as crianças se envolverem em atividades lúdicas e recreativas apropriadas à sua idade.[47] A CDPD estabelece o direito de crianças com deficiência terem acesso igualitário com outras crianças à participação em atividades lúdicas, recreativas e de lazer e esportivas.[48]

Captação de Recursos para Instituições com Base em Estereótipos Negativos de Pessoas com Deficiência

Muitas instituições privadas para pessoas com deficiência que a Human Rights Watch visitou promovem visitas do público e incentivam doações. Essas visitas são divulgadas em seus sites e redes sociais, como o Facebook.[49] Uma instituição divulgava em seu site visitas para um público de até cinco pessoas duas vezes ao dia; grupos de mais de cinco pessoas poderiam ser organizados aos sábados. Os visitantes podem tirar fotos e fazer vídeos com autorização e acompanhamento da instituição. O site informa aos visitantes que ao falar com os residentes da instituição deve-se levar em consideração que “se trata de pessoas sensíveis e que às vezes, fantasiam”.[50] A Human Rights Watch também examinou os sites de oito outras instituições que tinham vídeos e recursos semelhantes.

Os sites das instituições acessados pela Human Rights Watch promovem uma imagem negativa das pessoas com deficiência; eles perpetuam e reproduzem estigmas ao retratar os residentes de instituições como vulneráveis e carentes, ao invés de pessoas autônomas cujas escolhas individuais e dignidade inerente devem ser respeitadas.

A CDPD obriga os governos a combater estereótipos, preconceito e práticas nocivas em relação a pessoas com deficiência; inclusive encorajando todos os veículos de comunicação, bem como as mídias sociais, a retratarem pessoas com deficiência de uma maneira consistente com o propósito da CDPD.[51] O comitê da CDPD destacou, em numerosas observações conclusivas sobre o cumprimento da convenção por Estados, que as campanhas que estereotipam as pessoas com deficiência como objetos de caridade são incompatíveis com o conteúdo e propósito da CDPD.[52]

Uso Involuntário e Potencialmente Inadequado de Medicamentos Psicoativos

 

Embora nossa pesquisa não tenha se concentrado no uso de medicação inadequada para pessoas com deficiência vivendo em instituições, encontramos vários exemplos de residentes que, segundo funcionários, foram medicados com o intuito de controlar seu comportamento. Funcionários de várias instituições confirmaram que administravam medicamentos psicoativos aos residentes sem solicitar seu consentimento. O uso de medicamentos como uma forma de restrição química para controlar o comportamento de residentes – por conveniência ao trabalho do funcionário ou como punição – viola os padrões internacionais de direitos humanos.

Em março de 2017, os pesquisadores da Human Rights Watch encontraram um homem de 19 anos com deficiência intelectual imobilizado em um colchão no meio do dia em uma instituição agitada. A diretora da instituição explicou que a equipe havia lhe dado sedativos porque ele tinha mordido pessoas.[53] Ela disse que 12 dos 24 residentes da instituição recebiam, sob prescrição de um médico, Risperdone – um medicamento antipsicótico desenvolvido para tratar esquizofrenia. Nem todos os pacientes tinham esquizofrenia. A instituição não solicitou o consentimento informado dos residentes para o uso dos medicamentos.[54]

Funcionários de várias outras instituições disseram que também usavam medicamentos psicoativos para controlar o comportamento dos residentes. Uma enfermeira em uma instituição de adultos afirmou: "Se os residentes se comportam mal, lhes damos medicamentos". Outro funcionário da mesma instituição disse: “Para controlá-los, nós os sedamos; alguns deles recebem pílulas para dormir”.[55] Em outra instituição de adultos, a Human Rights Watch visitou uma ala com oito pessoas, onde a equipe médica disse dar medicamentos aos residentes para “torná-los estáveis, controlar crises ou sedá-los”. Um funcionário disse: "Se não os medicarmos, eles ficam agressivos".[56]

Uma rotina institucional rígida, o confinamento, a falta de atividades relevantes e a frequente falta de reconhecimento da vontade e das preferências individuais dos residentes nas instituições podem desencadear um comportamento agressivo.[57]

Embora os funcionários das instituições precisem garantir que o ambiente na instituição seja seguro para os residentes e funcionários, o uso de medicamentos para o controle do comportamento não é apropriado. O Brasil deve rever seus procedimentos para o uso de medicamentos psicoativos em instituições com vistas a proibir seu uso como meio de restrição química, e garantir uma supervisão adequada para impor essa proibição.

Funcionários na maioria das instituições visitadas afirmaram dar regularmente medicamentos aos adultos sem seu consentimento. Em uma instituição no Rio de Janeiro, a direção afirmou: “Não pedimos consentimento porque são pessoas com deficiências graves. Eles não falam, eles não pensam.” [58] Para adultos, os medicamentos devem ser providos com o consentimento do indivíduo a ser tratado. O Comitê da CDPD considera que tratar um adulto com medicamentos sem seu consentimento é uma violação do direito a reconhecimento igual perante a lei e uma violação do direito à integridade física, do direito de não ser submetido à tortura e tratamento desumano e degradante, e à liberdade contra o abuso e a exploração violenta.[59]

O consentimento informado pode ser obtido por meio de tomada de decisão apoiada. A lei brasileira de inclusão estabelece uma estrutura geral para implementar a tomada de decisão apoiada. Ela deve ser desenvolvida por meio de medidas de acessibilidade e adaptações razoáveis (linguagem simples e formas alternativas de comunicação), e informações antecipadas na nomeação de uma ou mais pessoas que fornecerão o apoio, escolhidas pela pessoa em questão. Veja também, mais adiante, sobre Capacidade Legal.

Para as crianças, o consentimento deve ser dado pelo responsável, em consulta com a criança, e usado apenas para fins terapêuticos e consistente com o direito ao mais alto padrão de saúde possível.

Educação Inadequada

A Human Rights Watch constatou que a educação para pessoas com deficiência nas instituições que visitamos era limitada. A maioria das pessoas com deficiência intelectual ou que não podem se comunicar não recebia nenhuma educação. O Estatuto da Pessoa com Deficiência de 2016 afirma que as pessoas com deficiência têm direito à educação e devem contar com apoio e adaptações razoáveis em escolas regulares, sem custo adicional e independentemente de onde vivam.[60]

Um homem amarrado à cama pela cintura em uma instituição para pessoas com deficiência no Rio de Janeiro. Funcionários em algumas instituições no Brasil restringem o movimento de pessoas com deficiência por prolongados períodos a fim de controlá-las. © 2016 Human Rights Watch

No Rio de Janeiro, em quatro instituições visitadas para crianças e adultos com deficiência, os residentes com deficiência intelectual e outras deficiências com necessidade de apoio intensivo não recebiam nenhuma educação. Em São Paulo, a Human Rights Watch visitou duas instituições para crianças com deficiência com necessidade de apoio intensivo; nenhuma delas tinha acesso à educação. Em uma instituição para 49 crianças e adultos com deficiências intelectuais e múltiplas em Ceilândia, apenas uma pessoa frequentava uma escola regular, e o restante não frequentava nenhuma escola. Na Bahia, a Human Rights Watch visitou uma instituição com 87 crianças e adultos; nenhum deles recebia qualquer educação.[61] Em uma segunda grande instituição na Bahia, das 109 crianças com deficiência, 37 com autismo ou necessidade de apoio intensivo, ou ambos, não tinham acesso à educação.[62]

A inquérito civil do Ministério Público iniciado em 2016 sobre 16 instituições exclusivas para crianças com deficiência no município descobriu que dois terços das instituições não tinham nenhuma ligação com serviços educacionais.[63]

Nas instituições visitadas pela Human Rights Watch, apenas frequentam as escolas as crianças que os funcionários consideram possuir algum nível de autonomia. Crianças com deficiência que vivem em instituições gerais ou que não têm deficiência intelectual são geralmente encaminhadas a escolas regulares nas comunidades locais. Em alguns casos, as crianças que vivem em instituições também frequentam escolas especiais na comunidade, que são exclusivamente para crianças com deficiência, em vez de frequentar escolas regulares para todas as crianças. Algumas instituições oferecem às crianças com deficiência intelectual ou sensorial programas de educação especial dentro da instituição, que não tem status oficial de estabelecimento educacional. As crianças recebem um certificado que não é um diploma oficial e não permite que o indivíduo continue sua educação em outro lugar.

Crianças com deficiência física e sensorial desenham, sentadas no chão de um espaço comum em uma instituição no Rio de Janeiro. Desenhar é uma das poucas atividades que funcionários da instituição oferecem a crianças e adultos com deficiência.  © 2017 Human Rights Watch

Durante as entrevistas realizadas pela Human Rights Watch com funcionários de instituições e servidores públicos, houve uma clara tendência de classificar as pessoas de acordo com o que a equipe acreditava ser o “nível de deficiência” da criança, que variava de moderada a grave. De acordo com funcionários na maioria das instituições visitadas e algumas autoridades públicas entrevistadas pela Human Rights Watch, aqueles tidos como “muito comprometidos” eram considerados incapazes de receber educação.[64] Alberto, um homem de 52 anos com deficiência física, institucionalizado há 40 anos, disse que só completou o primeiro ano: “Moro aqui desde os 12 anos. Consegui estudar até o primeiro ano do ensino fundamental. Eu gostaria de estudar física”.[65]

Mariana, uma jovem cega de 18 anos, vivia em uma instituição desde os 12 anos, onde permaneceu enquanto a instituição era transformada em uma residência inclusiva. Ela contou à Human Rights Watch que não sabia ler nem escrever e só recentemente tinha começado a aprender a usar braile no Instituto de Cegos da Bahia. Ela contou à Human Rights Watch que queria trabalhar como professora ou como fisioterapeuta.[66]

Clementina Bagno, membro de um Conselho Tutelar em Brasília, confirmou que:

As políticas gerais de educação não consideram os requisitos das pessoas com deficiência que vivem em instituições, o que as leva à exclusão e marginalização. [67]

A CDPD exige que os Estados signatários assegurem o direito das pessoas com deficiência à educação sem discriminação e em igualdade com as demais pessoas por meio da educação inclusiva em todos os níveis: educação pré-escolar, primária, fundamental, ensino médio e superior, formação vocacional e formação continuada, e atividades extracurriculares e sociais.[68] A CDPD proíbe a exclusão de pessoas do sistema educacional com base no chamado “nível de deficiência”. Nenhuma avaliação formal ou informal deve ser feita para determinar se uma criança ou um adulto com deficiência é capaz de ser educado no sistema regular de ensino.[69] Qualquer avaliação deve ter o objetivo de avaliar as necessidades específicas que uma pessoa precisa para dar a ela apoio integral no sistema regular de ensino. A CDC também estabelece o direito de todas as crianças à educação.[70] Em sua revisão de 2015 do Brasil, o Comitê da CRPD expressou preocupação com a recusa de admissão de crianças com deficiência nas escolas ou com a cobrança de taxas extras, bem como a falta de adaptação razoável e ambientes escolares acessíveis no sistema educacional tradicional. [71]

Uma determinação arbitrária de que uma criança pode ou não acessar serviços educacionais com base no seu alegado nível de autonomia ou deficiência constitui discriminação. O Estado tem a obrigação de garantir que particulares, incluindo organizações sem fins lucrativos, não discriminem pessoas com deficiência, inclusive com base em suposições sobre sua capacidade de ser educada.[72]

“Muito comprometido”? “Deficiências graves” não tem uma definição

Durante a pesquisa realizada pela Human Rights Watch no Brasil, servidores públicos e funcionários de instituições constantemente se referiram a pessoas com certos tipos de deficiência ou com deficiências múltiplas como “muito comprometidos” ou com “deficiências graves”. Isso geralmente fazia referência a pessoas que não conseguiam se comunicar, tinham dificuldades de compreensão e autossuficiência, tinham condições médicas que exigiam auxílio intenso ou apresentavam múltiplas deficiências.

Muitas autoridades e funcionários de instituições pareciam essencialmente justificar a falta de gozo de direitos e serviços por certas pessoas com base nesse conceito vago e essencialmente arbitrário de “deficiências graves”. Os termos que eles empregavam não têm um significado claro e parecem representar um esforço subjetivo e descuidado para criar uma categoria de pessoas que podem ser despojadas de sua autonomia e direitos. A legislação internacional de direitos humanos protege todas as pessoas com deficiência, independentemente do chamado “nível da deficiência”.

Problema de Acessibilidade em Instituições para Crianças

Embora as crianças com deficiência sejam colocadas em instituições, incluindo instituições gerais para crianças, por longos períodos de tempo, todas as três instituições gerais para crianças visitadas pela Human Rights Watch não dispunham de um ambiente físico acessível para pessoas com deficiência. Em uma instituição em São Paulo, por exemplo, as escadas na entrada impossibilitavam que uma criança com deficiência física entrasse ou saísse de forma independente.[73] Uma instituição em Salvador tinha apenas um banheiro com espaço suficiente para acomodar uma cadeira de rodas – mas ele estava na ala feminina.[74] Nenhum banheiro em qualquer das instituições comuns era totalmente acessível com banheiros com assentos sanitários elevados e barras de apoio.

Uma porta trancada com cadeado em uma instituição para pessoas com deficiência nos arredores de Brasília (Distrito Federal). Muitas instituições para adultos com deficiência no Brasil lembram centros de detenção, devido a portas pesadas com travas e grades nas janelas para manter as pessoas dentro. © 2016 Human Rights Watch

De acordo com as Orientações Técnicas Serviços de Acolhimento Para Crianças no Brasil, as instituições para crianças devem ser administradas com base no princípio da inclusão. [75] No entanto, um levantamento nacional de 2016 revela que dentre aproximadamente 3.000 instituições para crianças e adolescentes em todo o Brasil, apenas 584 têm entradas acessíveis, 767 contam com quartos e espaços de uso comum acessíveis, e 539 possuem banheiros acessíveis.[76]

III. Institucionalização prolongada e permanente de pessoas com deficiência

Funcionários de diferentes instituições, residentes e especialistas disseram à Human Rights Watch que crianças com deficiência que não podem ser assistidas por suas famílias são frequentemente institucionalizadas por períodos prolongados. Crianças com deficiência permanecem em instituições de acolhimento por mais tempo que outras crianças e, muitas vezes, permanecem nas instituições quando adultos – às vezes por toda a vida. Alguns funcionários das instituições visitadas relataram à Human Rights Watch que as crianças frequentemente perdem contato com suas famílias[77]. Como contou à Human Rights Watch a diretora de uma instituição para adultos com deficiência em São Paulo, as pessoas que vivem em instituições “ficam até morrer”[78]. Alguns diretores de instituições relataram à Human Rights Watch que, uma vez dentro, poucos residentes deixam a instituição. Um inquérito civil do Ministério Público do Estado de São Paulo sobre as condições de 16 instituições na capital confirma que poucas pessoas deixam as instituições de acolhimento. Nos últimos 10 anos, pouco mais de 500 pessoas teriam deixado as 16 instituições analisadas, metade devido à morte; 77 transferidas para outras instituições. No restante dos casos, as crianças foram adotadas, ou adultos e crianças voltaram para suas famílias.[79]

Adultos com deficiência destituídos de sua capacidade legal, ou do direito de tomar decisões por contra própria, e institucionalizados com base em sua deficiência contra sua vontade, são vítimas de privação de liberdade, de acordo com o CDPD.

As normas de direitos humanos reconhecem o direito igual de toda pessoa com deficiência viver de forma independente e ser incluída na comunidade, com a liberdade de fazer escolhas e controlar sua própria vida. O fundamento é o princípio básico dos direitos humanos de que todos os seres humanos nascem iguais em dignidade e direitos, e que toda vida é de igual valor[80]. Pessoas com deficiência não devem ser isoladas da sociedade em instituições de acolhimento como as verificadas no Brasil.

Uma mulher de 50 anos com uma deficiência física em uma instituição nos arredores de Brasília (Distrito Federal). Ela vive na instituição há 8 anos e não pode sair da instituição sem permissão de seus filhos.  © 2017 Human Rights Watch

O Comitê da CDPD declarou que a realização sistemática do direito a viver de maneira independente na comunidade requer mudanças estruturais, incluindo a eliminação gradual da institucionalização. A orientação do comitê é de que nenhuma nova instituição deve ser construída por Estados signatários, nem instituições devem ser reformadas para além das medidas mais urgentes necessárias para salvaguardar a segurança física dos residentes. As instituições não devem ser ampliadas e novos residentes não devem entrar no lugar daqueles que saem. Em conjunto com a desinstitucionalização, os Estados devem fornecer uma gama de serviços de apoio individualizados que viabilizem a escolha pessoal e autonomia. O objetivo desse apoio é a realização da inclusão plena na sociedade e a prevenção de isolamento e segregação em relação a outras pessoas da comunidade.[81]

Com relação a crianças, a lei brasileira estabelece que a institucionalização só pode ser determinada por um juiz e deve ser uma medida de proteção excepcional e temporária, adotada somente quando os direitos da criança estão ameaçados e não há meios alternativos para remediar a situação. Um juiz da vara da infância e juventude determina quais as medidas de proteção necessárias para a criança. A institucionalização deve ser revista a cada seis mese[82]s e, preferencialmente, não deve ultrapassar 18 meses[83]. No entanto, esse limite nem sempre é respeitado, principalmente para crianças com deficiência. Um defensor público do Rio de Janeiro disse à Human Rights Watch: “Quando se trata de crianças com deficiência, o limite [de 18 meses] é apenas uma recomendação geral, e muitas vezes na prática ele é mais longo”.[84]

A CDC, a CDPD e a Convenção Americana sobre Direitos Humanos, da qual o Brasil também é parte, reconhecem que a família é o ambiente natural para o crescimento e o bem-estar de todos os seus membros, especialmente crianças, incluindo crianças com deficiência.[85] Os Estados também devem garantir que as crianças não sejam separadas de seus pais contra sua vontade, a menos que essa separação esteja no "melhor interesse" da criança[86].

As Diretrizes das Nações Unidas sobre Cuidados Alternativos para Crianças também declaram que “a pobreza financeira e material nunca deve ser a única justificativa para que uma criança seja retirada do cuidado parental, para que a criança seja entregue a cuidados alternativos ou impedida sua reintegração, mas deve ser vista como um sinal à necessidade de fornecer apoio adequado à família”[87]. A CDPD declara que uma criança nunca deve ser separada de seus pais contra sua vontade, exceto quando uma autoridade judicial assim determina no melhor interesse da criança – e nunca com base na deficiência da criança ou dos pais. Quando a família imediata não tem condições de cuidar de uma criança com deficiência, Estados devem empreender “todo esforço para que cuidados alternativos sejam oferecidos por outros parentes e, se isso não for possível, dentro de ambiente familiar, na comunidade”. [88]

Os comitês da CDC e da CDPD encorajam os Estados a estabelecerem programas para que crianças com deficiência não sejam institucionalizadas, também conhecido como desinstitucionalização, devolvendo-as às suas famílias biológicas ou ampliadas ou incluindo-as em programas de adoção ou acolhimento familiar. Isso inclui o fornecimento de assistência adequada na comunidade às crianças e suas famílias, conforme descrito em mais detalhes abaixo.[89]

Durante a revisão de 2015 do Brasil, o Comitê das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, órgão especializado que monitora a implementação do tratado, expressou sua preocupação com a falta de acesso a serviços de apoio, especialmente serviços de assistência pessoal, destinados a permitir que pessoas com deficiência possam viver de forma independente e ser incluídas na comunidade. O Comitê recomendou ao Brasil a elaboração e implementação de uma estratégia de desinstitucionalização e de convivência comunitária, com prazos e critérios de mensuração claros, em consulta com organizações de pessoas com deficiência.[90]

Crianças com deficiência permanecem em instituições por longos períodos

De acordo com um levantamento de 2016 sobre instituições, mais de 60% das crianças com deficiência viviam nas instituições há mais de seis anos, em comparação com 5,7% das crianças sem deficiência. Para adultos com deficiência, quase 62% estão em instituições há mais de seis anos.[91]

Do mesmo modo, um estudo de 2008 conduzido por uma pesquisadora da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro constatou que, no Rio de Janeiro, crianças com deficiência normalmente vivem em instituições por longos períodos de tempo, mais da metade de suas vidas; elas não participam da vida pública e têm seus laços sociais e familiares rompidos ou enfraquecidos.[92]

Por fim, um estudo realizado por ordem do Conselho Nacional do Ministério Público em 2013 confirma que, em relação a crianças com deficiência, as instituições não estão cumprindo seus objetivos. As instituições deveriam ser um ambiente provisório para crianças, mas elas se tornam lares permanentes para pessoas com deficiência. O estudo mostra que uma medida inicialmente provisória se transformou em confinamento para crianças com deficiência.[93]

Chegando quando crianças, permanecendo enquanto adultos

Em sete instituições visitadas pela Human Rights Watch, funcionários declararam que havia adultos com deficiência residindo na instituição desde a infância.[94] Por exemplo, em uma instituição, em São Paulo, à época da visita da Human Rights Watch em novembro de 2016, 40 adultos viviam na instituição, sendo que a maioria chegou ainda criança[95]. Outra instituição, também em São Paulo, abriga pessoas que permanecem mesmo depois de atingirem a idade adulta. Em novembro de 2016, dois moradores eram crianças e oito eram adultos com até 44 anos.[96]

Em uma instituição em Nova Friburgo, estado do Rio de Janeiro, a Human Rights Watch encontrou um homem de 70 anos que estava na instituição há 65 anos.[97] Em outra instituição no Rio de Janeiro, a direção explicou: “Agora temos 51 moradores, a maioria deles está aqui desde criança. Eles perderam contato com seus entes queridos fora da instituição. Apenas cerca de 10% deles recebem visitas de familiares.”[98]

Em uma instituição diferente, também no Rio de Janeiro, um funcionário descreveu como Bernardo, um morador que recentemente completou 18 anos, retornaria à instituição. Apontando para um berço vazio, o funcionário disse à Human Rights Watch:

“Este é o berço de Bernardo; ele completou 18 anos há algumas semanas e retornou [brevemente] para sua família. No entanto, daqui a algumas semanas, ele vai voltar à ala adulta desta instituição. A família de Bernardo não pode dar assistência a ele em casa.”[99]

Uma instituição no Rio de Janeiro tem nove crianças de 12 a 18 anos, além de 43 residentes adultos que nela cresceram. Da mesma forma, a maioria das pessoas em uma outra instituição do Rio de Janeiro, é de adultos que chegaram ainda crianças.[100] Em Brasília, Distrito Federal, um adulto de 28 anos permaneceu em uma instituição, originalmente criada para crianças, após completar 18 anos.[101] Em outra instituição em Nova Friburgo, Rio de Janeiro, a Human Rights Watch encontrou um homem de 70 anos que ali residia desde os 10 anos de idade.[102] Novamente, a maioria das pessoas que viviam na instituição havia chegado ainda quando criança.

Antônia, uma mulher de 50 anos com deficiência intelectual, vive em instituições de acolhimento desde criança, mudando-se de uma para outra. Ela disse:

“A equipe me trata bem aqui, mas eu preferiria morar com minha família. Minha família não consegue cuidar de mim. Eu vivi em muitas instituições [diferentes] na minha vida porque algumas delas fecharam. Quando eles fecham a instituição, eu sou mandada para outra.”[103]

Ela disse que os funcionários da instituição nunca a consultaram sobre sua transferência de uma instituição a outra, simplesmente a transferiram sem apresentar quaisquer alternativas.[104]

Negação da capacidade legal e privação ilegal de liberdade

Em todas as instituições de adultos visitadas no Brasil, diretores ou funcionários disseram à Human Rights Watch que quase todas as pessoas que ali residiam não tinham reconhecida sua capacidade legal e estavam sob a curatela de outra pessoa, normalmente o diretor da instituição ou um parente. Diretores de instituições relataram que indivíduos com deficiência foram institucionalizados sem seu consentimento, com base apenas no consentimento do responsável legal. A negação da capacidade legal de pessoas com deficiência no Brasil e a sua detenção em instituições contra a sua vontade, isto é, sem o seu consentimento ou com base no consentimento de alguém que tome decisões em seu nome, constitui privação ilegal da liberdade, de acordo com o CDPD.[105]

Capacidade legal é o direito das pessoas de fazerem escolhas sobre suas vidas, tomar decisões legais e firmar relações contratuais vinculantes. A capacidade legal afeta todas as áreas da vida, desde escolher sobre onde morar, se e com quem casar, ter filhos, assinar um contrato de trabalho ou votar. Ser reconhecido como alguém capaz de tomar decisões é fundamental para assumir o controle da própria vida e participar da sociedade com outras pessoas. Sem isso, um indivíduo não pode exercer a maioria dos direitos humanos e suas decisões não têm força legal. O direito à capacidade legal é uma pedra angular para permitir que pessoas com deficiência vivam de forma independente e sejam incluídas na comunidade.

Um homem com deficiência intelectual, vivendo em uma instituição para 51 pessoas com deficiência nos arredores de Brasília, Distrito Federal, espia através de uma porta trancada. © 2016 Human Rights Watch

De acordo com a legislação brasileira, as pessoas com deficiência podem ser privadas de sua capacidade legal a pedido de parentes ou tutores, do cônjuge, do diretor de uma instituição ou do Ministério Público por meio de um procedimento em que um juiz determina que a pessoa não é capaz de tomar decisões para administrar seus bens ou, se for o caso, de realizar atos da vida civil, e um responsável pela tutela ou curatela é nomeado para tomar decisões em seu nome.[106] A CDPD afirma que as pessoas com deficiência têm o direito de serem reconhecidas em qualquer lugar como pessoas perante a lei, e que as pessoas com deficiência devem ter capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas em todos os aspectos da vida.[107]

O Pacto Internacional sobre Direitos Civis e Políticos, do qual o Brasil é parte, proíbe a privação ilegal de liberdade. Pessoas com deficiência no Brasil privadas de sua capacidade legal, institucionalizadas e impedidas de sair da instituição, são detidas ilegalmente, nos termos da CDPC. Não há como uma pessoa privada de capacidade legal, na prática, contestar sua institucionalização porque ela não tem legitimidade para tanto. Elas podem fazê-lo apenas com o consentimento do responsável, que foi a pessoa que os colocou na instituição.[108] Para pessoas adultas sob curatela e institucionalizadas no Brasil, esta decisão não é revista periodicamente.[109]

Em uma instituição no Rio de Janeiro visitada pela Human Rights Watch, todos os 50 residentes com deficiência física, intelectual ou psicossocial estavam sob a curatela do diretor. Todos eles haviam sido institucionalizados ainda quando crianças.[110] Em uma segunda instituição visitada no Rio de Janeiro, todos os 25 residentes estavam sob curatela, mas neste caso um deles estava sob a responsabilidade legal de sua mãe – o restante estava sob a curatela da direção da instituição[111]. Em São Paulo, a Human Rights Watch visitou uma instituição onde todos os oito residentes com deficiência intelectual ou física estavam sob curatela.[112]

Em uma instituição no Distrito Federal, funcionários explicaram que a maioria de seus residentes estava sob curatela; o diretor da instituição mantinha-se como responsável legal de 26 deles[113]. Na Bahia, a Human Rights Watch visitou uma instituição para 87 pessoas com diferentes tipos de deficiência, todas sob curatela. Apenas cinco dos residentes tinham sido autorizados a administrarem seu próprio dinheiro e todas as mulheres residentes recebiam contraceptivos sem seu consentimento.[114] A Human Rights Watch visitou cinco residências inclusivas e todos os residentes estavam sob curatela.[115]

Pessoas residindo em instituições sob a curatela não têm liberdade para sair permanentemente nem sequer para um passeio sem autorização, pois seus responsáveis mantêm controle total sobre suas vidas, incluindo onde moram, para onde vão e até mesmo com quem falam. Por exemplo, Luciene Lima, uma mulher de 50 anos com paralisia cerebral em uma instituição no Rio de Janeiro, compartilhou uma cópia de seu livro, uma autobiografia detalhada que escreveu na instituição. Quando criança, ela vivia com a mãe, que trabalhava como empregada doméstica. Quando Luciene completou 12 anos, sua mãe não podia mais cuidar dela e a encaminhou para uma instituição. Seu livro descreve sua experiência:

“Eu costumava me questionar sobre porque eu tinha que viver em uma instituição, sem poder ir à escola como a maioria das crianças faz. Eu até tive a oportunidade de voltar a ficar com minha mãe por um tempo. Parentes e amigos nos ajudaram a encontrar uma casa, […] mas as despesas eram altas e minha mãe começou a envelhecer [82 anos] e não conseguia me ajudar a me pôr na cama, então depois de conversarmos, decidimos que eu devia voltar aqui.”[116]

Embora Luciene tenha participado da decisão de retornar à instituição a diretoria da instituição passou a ser sua responsável, e agora seus funcionários controlam sua saída da instituição, mesmo que por pouco tempo. Por exemplo, quando questionado sobre a possibilidade de Luciene sair para jantar com um amigo, um funcionário disse que isso estava fora de questão.[117]

Em outra instituição visitada pela Human Rights Watch, Carolina, 50, descreveu sentir-se presa na instituição onde estava há oito anos, devido à falta de oportunidades para sair e viver na comunidade. Ela adquiriu uma deficiência física devido a uma lesão nas costas, após ser gravemente espancada por um membro da família. Seus filhos a colocaram na instituição contra sua vontade, porque ela tinha dificuldade para cuidar de si mesma. Ela quer deixar a instituição, mas não tem para onde ir. Ela disse,

“Este lugar é muito ruim, é como uma prisão. Eu não quero ficar aqui. Eu sou obrigada a estar aqui. Meus filhos não querem me ajudar em casa. […] Embora dois dos meus filhos venham me visitar a cada duas semanas, eu nunca saio [para qualquer lugar]. Eu gostaria de sair daqui, é meu sonho. Quando você fica assim [com uma deficiência], acabou.”.[118]

Funcionários das instituições visitadas pela Human Rights Watch também mantêm o controle sobre os horários e as escolhas pessoais dos residentes. Por exemplo, a Human Rights Watch perguntou a um homem de 29 anos com deficiência física e que estuda em uma universidade sobre o controle sobre sua rotina na instituição. Em relação aos horários de dormir, ele disse que não tinha escolha a não ser obedecer aos funcionários. "Eu tenho que ir para a cama quando eles me mandam", disse ele[119]. A Human Rights Watch tentou entrevistar adultos com deficiência nessa instituição, mas um funcionário se referiu a residentes adultos como se fossem crianças: “Pra que você vai conversar com as crianças diretamente? Elas não são responsáveis por si mesmas, nós somos. Você deve falar conosco, não com elas.”[120] Em uma instituição em São Paulo, a Human Rights Watch conversou com dois residentes que concordaram em participar da entrevista, mas uma diretora administrativa interveio e encerrou a conversa. Ela disse: "Eles são pessoas com deficiência, você não pode considerar tudo o que eles dizem como verdade." Ela se recusou a reconhecer o consentimento que eles deram à entrevista como válido, dizendo que apenas a direção da instituição pode dar tal autorização.[121]

Passos para dar fim à interdição no Brasil

Em 2015, o Brasil adotou o Estatuto da Pessoa com Deficiência, que estabeleceu o direito da pessoa com deficiência de exercer sua capacidade legal em igualdade de condições com as demais pessoas. A lei limitou a restrição à capacidade legal apenas para os atos relacionados aos direitos de natureza patrimonial e negocial, mas não para outras decisões.[122] Contudo, antes do Estatuto entrar em vigor, o Congresso adotou um novo Código de Processo Civil que revogou essas disposições. Até a elaboração deste relatório, a possibilidade de interdição ainda estava em vigor. No entanto, o Congresso brasileiro está considerando um projeto de lei para harmonizar seu ordenamento jurídico, o que parcialmente levaria à criação de mecanismos de tomada de decisão apoiada[123]. A tomada de decisão apoiada é um sistema para aqueles que desejam assistência na tomada de decisões ou apoio para comunicá-las a outras pessoas.

Em diversas instituições, funcionários usam camas com barras altas para confinar pessoas com deficiência. © 2016 Human Rights Watch

A CDPD exige que os Estados adotem as medidas apropriadas para prover acesso ao apoio que pessoas com deficiência podem necessitar e desejar a fim de exercer plenamente seus direitos e tomar decisões importantes sobre suas vidas. As medidas relativas ao apoio no exercício da capacidade legal devem incluir salvaguardas adequadas para evitar abusos.[124] O apoio a pessoas com deficiência pode assumir várias formas e abrange: medidas de acessibilidade e adaptações razoáveis para a compreensão de informações e das consequências dos atos legais, provisão de orientações antecipadas, e a nomeação de uma ou mais pessoas para apoio escolhidas pela pessoa envolvida. De acordo com o Comitê da CDPD, em casos excepcionais, quando não for possível determinar a vontade e as preferências da pessoa, mesmo depois de sérios e sucessivos esforços, a melhor interpretação da vontade e das preferências deve substituir qualquer determinação de “melhor interesse”. Isso garante o respeite aos direitos, vontade e preferências do indivíduo; o princípio do “melhor interesse” não é uma salvaguarda para adultos de acordo com a CDPD.[125]

Fiscalização das Instituições

A Human Rights Watch identificou lacunas no monitoramento e fiscalização de instituições de acolhimento da pessoa com deficiência. De acordo com a legislação brasileira, organizações sem fins lucrativos que prestem serviços assistenciais devem ser registradas perante os conselhos de assistência social dos respectivos municípios ou do Distrito Federal, incluindo instituições como abrigos institucionais, casas-lares e outras com atendimento de saúde, como os hospitais de retaguarda[126]. Instituições de assistência social que prestem serviços a crianças devem ser registradas também no respectivo conselho de direitos da criança e do adolescente[127]. Os conselhos monitoram e avaliam entidades que prestam assistência social, e têm autoridade para visitar instituições de acolhimento a fim de avaliar sua adequação a diretrizes técnicas de operação[128]. Os conselhos podem suspender ou anular o registro de entidades de assistência social que não cumprirem as diretrizes e normas técnicas estabelecidas. Todas as instituições registradas perante os conselhos de assistência social são obrigadas a apresentar relatórios anuais detalhando sua adequação às regras técnicas de operação a fim de que possam renovar registro.[129] Os conselhos, por sua vez, devem publicar seus próprios relatórios anuais.[130]

O presidente do Conselho Municipal de Assistência Social em Salvador disse à Human Rights Watch que existem 298 instituições na cidade, e que o Conselho visitou 65% delas nos últimos dois anos. O número limitado de funcionários os impediu de visitar mais instituições. Quando o Conselho verifica que uma instituição de acolhimento está fora do cumprimento das regras técnicas, ele emite orientações para que efetuem as mudanças necessárias. No entanto, não é capaz de acompanhar de maneira consistente se determinada instituição de acolhimento vem seguindo suas orientações, exceto examinando seu relatório anual obrigatório. Os Conselhos municipais não têm competência para receber denúncias individuais relativas a entidades que prestam serviços sociais.[131]

Para instituições de acolhimento de crianças, há maior monitoramento regular. Para crianças que residem nessas instituições, os juízes têm a obrigação de realizar audiências periódicas para avaliar a situação de todas as crianças encaminhadas a cada instituição por ordem judicial, a fim de determinar se a criança deve ali permanecer, ser transferida para outra forma de medida protetiva, ou retornar a sua família.[132] O Ministério Público é obrigado a visitar instituições de acolhimento para crianças, inclusive para crianças com deficiência.[133] Existem algumas instituições onde residem crianças com deficiência, que funcionam como hospitais de retaguarda, não estão registradas como instituições de acolhimento ou casas-lares para crianças, e não estão sujeitas à avaliação obrigatória dos promotores públicos[134]. Os promotores também têm autoridade para monitorar instituições de acolhimento para adultos com deficiência embora não haja uma resolução vinculativa obrigando-os a fazê-lo, somente uma recomendação do Conselho Nacional do Ministério Público de janeiro de 2018.[135]

Uma jovem em um dormitório de uma instituição no Rio de Janeiro.  © 2017 Human Rights Watch

Alguns membros do Ministério Público no âmbito estadual solicitaram aos respectivos tribunais o encerramento de atividade ou intervenção em instituições de acolhimento após identificarem má gestão e abuso.[136] Em todos os Estados que a Human Rights Watch visitou durante esta pesquisa, os Ministérios Públicos contavam com unidades especiais para os direitos das pessoas com deficiência e para os direitos da criança e do adolescente.[137]

Mecanismos de denúncia

No Brasil, o Ministério Público pode iniciar investigações com base em denúncias individuais. No entanto, a Human Rights Watch constatou que nenhuma das instituições para pessoas com deficiência dentre as visitadas tinha informações claras sobre mecanismos e procedimentos de denúncia, e não havia nenhum procedimento individualizado que permitisse que os residentes apresentassem uma denúncia. Para determinadas pessoas, a deficiência pode impedir que apresentem uma denúncia de forma independente ao Ministério Público ou outro órgão sob os procedimentos existentes nessas entidades. Alguns indivíduos podem necessitar de assistência ou adaptações para isso. Membros do Ministério Público, situados em Brasília e em São Paulo, confirmaram que não há ajustes procedimentais disponíveis para garantir que as pessoas com deficiências em instituições possam apresentar denúncias, apesar de a Lei de Inclusão de 2016 exigir que o governo os proporcione.[138]

Os ajustes procedimentais envolvem modificações individualizadas nos procedimentos para assegurar que pessoas com deficiência tenham acesso à justiça em igualdade de oportunidades provendo, por exemplo, atendente pessoal, versões de leitura facilitada dos textos, tradução em língua de sinais, ou documentos em formato braile.[139]

A falta de um mecanismo de denúncia acessível gera um risco de que violações de direitos humanos - como negligência, uso de contenção ou restrição física, sedação ou medicação forçada e desnecessária - possam ocorrer sem que as vítimas tenham a oportunidade de denunciá-las e buscar proteção. As pessoas com deficiência têm o direito de ser informadas sobre seus direitos e obrigações perante a lei por meios apropriados e acessíveis, incluindo ao apresentar denúncias e solicitações.

Fatores econômicos que contribuem para a institucionalização

Gestores de instituições, defensores dos direitos das pessoas com deficiência e pais disseram à Human Rights Watch que, para algumas famílias de crianças com deficiência, a falta de apoio governamental e de serviços acessíveis para os pais criarem seus filhos em casa foi um fator na decisão de institucionalizar seus filhos, por vezes por tempo indeterminado. A Human Rights Watch também documentou alguns casos em que crianças com famílias acolhedoras ou famílias adotivas eram devolvidas a instituições, sob alegação de falta de serviços suficientes para assisti-las em sua criação. Os serviços de que crianças com deficiência e suas famílias precisam incluem educação inclusiva em escolas na comunidade onde vivem, creches acessíveis, transporte acessível, assistência médica e terapias relevantes, além de apoio financeiro para ajudar as famílias a atender às necessidades específicas da criança com deficiência.

Um estudo do Conselho Nacional do Ministério Público constatou que a falta de recursos materiais necessários para cuidados básicos, tratamento e serviços de saúde para filhos com deficiência, é um dos principais motivos para pais não conseguirem criar seus filhos em casa e juízes decidirem pela institucionalização.[140] Conforme descrito em mais detalhes abaixo, embora as autoridades federais, estaduais e municipais no Brasil tenham adotado algumas medidas para garantir o provimento de serviços e benefícios essenciais para crianças com deficiência, as autoridades em todos os níveis de governo devem procurar expandir e revisar políticas e programas de apoio às crianças com deficiência para que elas cresçam com suas famílias.

Celia Barcellos, uma mulher que vive no Rio de Janeiro, disse à Human Rights Watch que gostaria de criar em casa seu filho Leonardo, agora com 25 anos, mas não conseguiu por razões financeiras:

“Eu sofri profundamente quando Leonardo teve que ser transferido à instituição quando completou 15 anos – mas eu não tinha alternativa. […] O Estado não me dá nenhum apoio e não tenho direito a receber o BPC porque ganho mais que o salário mínimo. Tem sido muito difícil para nós. Leonardo teve que abandonar a escola porque as autoridades disseram que não podiam prestar assistência durante o dia, e que eu tinha que ficar com ele durante o horário escolar se ele quisesse continuar estudando. Eu tenho que trabalhar e não conseguia fazer isso, então ele só conseguiu terminar o primeiro ano do ensino médio.”[141]

Outras famílias disseram sentir que a institucionalização era sua única opção, apesar dos esforços para criar seus filhos em casa. Vilma, mãe de uma menina de 13 anos com espinha bífida que vive em Salvador, disse à Human Rights Watch estar preocupada em não ter escolha e precisar colocar sua filha em uma instituição devido à falta de serviços de apoio para criar sua filha em casa. Vilma disse que não podia trabalhar, pois precisa cuidar da filha em tempo integral devido à ausência de serviços providos na comunidade, incluindo uma escola inclusiva:

“O benefício social [...] é essencial para mim e minha filha. Consigo comprar comida, roupas e pagar o aluguel, mas não é suficiente para atender a todas as necessidades da minha filha. Minha filha precisa de uma cadeira de rodas e eu não posso comprá-la. A gente ganhou uma cadeira de rodas, mas ela não é adaptada às necessidades dela. Os apoios para os pés são muito longos para as pernas.”[142]

Residindo em instituições, crianças podem acabar isoladas de suas famílias, o que aumenta a probabilidade de que permaneçam ali por longos períodos – possivelmente até a idade adulta. Um fator pode ser o custo de transporte até a instituição. Por exemplo, Rita Barreto, diretora de uma instituição no Rio de Janeiro, bem fora do centro da cidade, disse:

“Embora as crianças tenham seus pais vivos, eles não vêm visitá-las porque moram em outras cidades distantes e não podem pagar pelo transporte.”[143]

A Human Rights Watch entrevistou pais de crianças com deficiência que se preocupavam com o futuro de seus filhos e com a falta de opções além da institucionalização. Por exemplo, Roseli, mãe de João, um jovem adulto com deficiência, disse à Human Rights Watch: “A gente está envelhecendo. A gente não quer que eles vão para uma instituição, então estamos pensando em uma maneira de garantir o futuro deles para que eles possam viver na comunidade quando não estivermos mais aqui”.[144]

Crianças devolvidas às instituições pelas famílias adotivas e acolhedoras

Por meio de entrevistas com alguns pais e funcionários de instituições, a Human Rights Watch documentou como algumas crianças com deficiência foram devolvidas às instituições depois de terem sido adotadas ou colocadas em famílias acolhedoras devido à insuficiência de serviços providos nas comunidades para as famílias.

Álvaro disse à Human Rights Watch que chegou à instituição aos 10 anos, foi brevemente adotado por uma família e depois retornou à instituição. Álvaro tem uma deficiência que provoca o declínio progressivo nas funções sensorial e motora, particularmente nas pernas e pés. A falta de apoio suficiente para ele e sua família para viver na comunidade contribuiu para seu primeiro contato e posterior retorno à instituição. Álvaro disse que nunca teve uma cadeira de rodas e contava com outras pessoas para ajudá-lo a se movimentar. Devido à dificuldade para andar, ele teve que abandonar a escola.

De acordo com a gerência da instituição, embora eles quisessem assistir Álvaro o máximo possível, eles não tinham permissão para gastar dinheiro na construção de infraestrutura e, portanto, não podiam construir um banheiro acessível. Dificuldades financeiras impediram que eles lhe comprassem uma cadeira de rodas. Como resultado, Álvaro permanecia grande parte do tempo confinado em seu quarto.[145]

No início de 2017, Catarina adotou Teresa, uma menina de 6 anos com deficiência intelectual que residia em uma instituição no Rio de Janeiro. Catarina disse à Human Rights Watch que enquanto Teresa estava na instituição, ela era alimentada apenas por tubos; em casa, ela começou a comer por via oral. As habilidades motoras de Teresa se desenvolveram enormemente e ela consegue se mover com facilidade. Teresa frequentou uma escola na comunidade com outras crianças da mesma idade. Apesar dos desenvolvimentos, após cerca de seis meses, Catarina sentiu-se obrigada a devolver Teresa à instituição. De acordo com a direção da instituição, o maior obstáculo para a Catarina foi a falta de serviços sociais para apoiá-la na criação de Teresa em casa.[146]

Em 2016. Neiva Correa Marins e Carlos Eduardo Cruz, do Rio de Janeiro, adotaram Silvana e Sofia, duas meninas de 3 e 4 anos com deficiência intelectual. “Elas começaram a se desenvolver quando a trouxemos para casa”, disse Neiva.  © 2018 Human Rights Watch

A diretora da instituição confirmou um caso semelhante. Ela contou à Human Rights Watch sobre uma criança com microcefalia que foi devolvida rapidamente por uma família acolhedora à instituição. Um dos pais declarou que tomar conta da criança era muito caro e tomava muito tempo, dada a insuficiência de serviços de assistência social.[147] A direção de uma instituição em Niterói, no Rio de Janeiro, disse à Human Rights Watch que um homem de 19 anos com deficiência intelectual foi adotado brevemente quando criança, mas depois retornou à instituição. A gerente disse que esse rapaz passou por sérios problemas emocionais depois de ser devolvido.[148]

Janete Aparecida Giorgetti, gestora do programa de serviço de acolhimento familiar em Campinas, também expressou que os serviços de assistência social não são suficientes e que potenciais famílias acolhedoras “nem sempre estão disponíveis para assistir crianças com deficiência porque trabalham e não têm tempo para cuidar das necessidades especiais de uma criança.”[149]

Francisca (nome fictício), de 3 anos, tem deficiência física e intelectual e foi adotada por uma família no Rio de Janeiro em 2016. Quando Francisca foi adotada, não conseguia andar; sob os cuidados da família, ela gradualmente começou a desenvolver habilidades motoras. Sua mãe, Flávia, disse:

“Francisca surpreende meu marido e eu todos os dias. O neurologista nos disse que ela não seria capaz de fazer nada. Mas agora temos a prova de que isso não é verdade. Ela agora pode comer sozinha em vez de ter que ser alimentada com uma seringa. […] Sua capacidade de aprendizado está se desenvolvendo rapidamente, ainda que as habilidades motoras possam melhorar muito mais. Ela superou todas as nossas expectativas.”[150]

Neiva Correa Marins e Carlos Eduardo Cruz são um casal que adotou duas meninas com deficiência intelectual, Silvana e Sofia, de 3 e 4 anos, em 2016. Neiva disse:

“Nossas filhas progrediram bastante. Silvana não conseguia andar na instituição, mas depois de seis meses morando com a gente, agora ela está andando. Tem tudo a ver com apoio individualizado. Todos ficaram surpresos quando Silvana voltou para visitar os amigos na instituição e viram que ela estava caminhando.

 

IV. Respostas Governamentais

O governo do Brasil adotou políticas para ajudar a proteger os direitos das pessoas com deficiência. Não faz parte do escopo deste relatório detalhar todas elas. Este capítulo concentra-se nas políticas e programas mais relevantes que o governo pode desenvolver para melhor garantir os direitos das pessoas com deficiência, incluindo o direito das crianças à convivência familiar e comunitária, o direito das pessoas com deficiência de viver independentemente em sociedade, e outros direitos.

A Crise Econômica no Brasil e o Financiamento de Instituições

O Brasil enfrenta atualmente uma grave crise econômica que resultou em reduções e cortes orçamentários, inclusive em muitos serviços sociais. O governo depende quase exclusivamente de instituições privadas para acolher crianças e adultos com deficiência. A maioria dessas instituições, incluindo aquelas visitadas pela Human Rights Watch, enfrenta graves dificuldades financeiras. Em alguns casos, em situações que as instituições têm convênios com autoridades municipais ou estaduais para financiamento de suas atividades, autoridades não repassaram recursos em tempo hábil ou interromperam o financiamento por longos períodos de tempo. No Rio de Janeiro, duas instituições foram obrigadas a fechar em 2016, e 113 adultos com deficiência foram transferidos para outras instituições.[151] Em outros casos, as instituições dependem inteiramente de doações locais ou estrangeiras, sem o apoio do governo. O governo tem a responsabilidade de garantir condições em todos os equipamentos autorizados a operar, para que garantam os direitos básicos e a dignidade humana das pessoas com deficiência. Essas questões de financiamento destacam ainda mais os problemas práticos das instituições de acolhimento para pessoas com deficiência.

Enquanto se distanciam do modelo de institucionalização, os governos devem realocar os recursos atualmente destinados às instituições para o fornecimento de serviços na comunidade. O Escritório do Alto Comissariado para os Direitos Humanos, a UNICEF, alguns governos nacionais que investiram na desinstitucionalização, e organizações não-governamentais descobriram que serviços providos na comunidade – em vez de concentrá-los em instituições de acolhimento– e o apoio às famílias muitas vezes não são mais caros do que um sistema institucionalizado.[152] Durante o período de transição de instituições de acolhimento para serviços e alternativas de moradia na comunidade, é provável que haja custos adicionais devido ao processo de transição e à existência concomitante de dois sistemas.[153]

Potencial para Oferecer Apoio a uma Vida Independente

Residências Inclusivas

Em 2009, o Conselho Nacional de Assistência Social iniciou um programa chamado “residências inclusivas”[154], que visa proporcionar atendimento personalizado a pequenos grupos de pessoas com deficiência que não podem cuidar de si mesmas sem apoio, e que não possuem assistência familiar ou estão no processo de deixar os abrigos.[155] As secretarias municipais de assistência social identificam pessoas que são elegíveis para viver em uma das residências, que não devem abrigar mais de 10 adultos com deficiência. Residências inclusivas podem incluir homens e mulheres, com diversos tipos de deficiência. Serviços como de saúde e de educação devem ser oferecidos na comunidade e não dentro da residência.[156] Em dezembro de 2016, havia 155 residências inclusivas no Brasil.[157]

O objetivo das residências inclusivas é dar fim à segregação e promover a vida em sociedade, mudando o paradigma do isolamento e da discriminação intrínsecos a ambientes de instituições para pessoas com deficiência. Elas buscam promover a autonomia das pessoas e fortalecer seus laços com suas famílias e comunidade.[158] Este programa levou em consideração a necessidade de reestruturar os serviços de acolhimento no Brasil, abandonando o modelo de grandes instituições de longa permanência, chamados, popularmente, como orfanatos, internatos, educandários, asilos, entre outros.[159] Esses serviços devem ser oferecidos em um imóvel em áreas residenciais na comunidade e “devidamente adaptado, amplo e arejado o suficiente para propiciar conforto e comodidade”.[160]

Potencial Não Alcançado pelo Programa das Residências Inclusivas

A Human Rights Watch visitou residências inclusivas – quatro em São Paulo e uma em Salvador – que abrigavam principalmente pessoas com deficiência intelectual, mas também pessoas com deficiências físicas e uma mulher cega. Nas residências visitadas, os pesquisadores da Human Rights Watch observaram um atendimento mais personalizado, e conheceram alguns residentes que trabalham ou têm mais oportunidades de participar da sociedade do que pessoas que vivem nas instituições maiores. Todas as residências visitadas pela Human Rights Watch eram casas recém-construídas localizadas em comunidades. As casas eram limpas, bem organizadas e alguns residentes participavam de tarefas domésticas. Os funcionários eram profissionais e pareciam prestar serviços de qualidade e atendimento personalizado aos residentes. Alguns residentes trabalham, estudam ou têm outras oportunidades de participar da sociedade.

Apesar de serem novas e terem menor tamanho, as cinco residências inclusivas que a Human Rights Watch visitou no Brasil mantêm o caráter de instituições. As pessoas geralmente têm pouca privacidade; pouco controle sobre suas vidas, incluindo em relação à rotina diária para comer e dormir, a relacionamentos afetivos, e como gastar seu próprio dinheiro. Elas têm poucas oportunidades para tomar decisões de forma independente, incluindo se querem ou não viver na residência inclusiva em primeiro lugar. A diretora de uma residência confirmou que “as residências inclusivas são instituições menores, mas com um nome diferente”.[161]

De acordo com o comitê da CDPD e o Escritório do Alto Comissariado das Nações Unidas para os Direitos Humanos, as características mais proeminentes de uma instituição incluem: a falta de controle sobre as decisões do dia a dia; rigidez da rotina, independentemente de preferências ou necessidades pessoais; atividades idênticas no mesmo local para um grupo de pessoas sob uma autoridade central; abordagem paternalista na prestação de serviços; e supervisão das alternativas de moradia sem consentimento.[162]

A Human Rights Watch constatou que as cinco residências inclusivas visitadas no Brasil empregaram esforços para promover a autonomia e competências básicas de vida de alguns residentes, mas deixam a desejar no que diz respeito à promoção de uma independência significativa. Por exemplo, Francisco, um jovem de 19 anos com deficiência intelectual, disse que trabalhava em um restaurante fast food como ajudante geral e ganhava seu próprio dinheiro. Ele gostava de morar na residência. No entanto, ele tinha que pedir permissão para sair e fazer atividades, e que os funcionários às vezes negavam. "É como ter uma mãe", disse ele.[163] Francisco sentia falta de ter uma vida mais independente, que ele poderia administrar, com apoio:

“Eu acho que devíamos ter mais liberdade, eu sonho em começar meu próprio negócio, casar e ter minha própria família. Posso precisar de apoio para fazer isso, mas tenho certeza de que consigo dar conta.” [164]

Uma mulher em uma residência nos disse que tinha um namorado em uma residência próxima e que mal podia esperar para se casar, mas funcionários da residência não permitiam que ela o visse sozinha. Ela disse:

 “Eu tenho um namorado que mora na residência para homens. Ele agora tem 32 anos. Eu gostaria de casar com ele, mas só posso visitá-lo nos finais de semana quando alguém me leva onde ele está. Eu não tenho permissão para ir sozinha porque [os funcionários dizem que] seria perigoso [sair sozinha].”[165]

Em uma residência, os residentes podiam ter suas próprias contas bancárias, mas os funcionários a administravam e apenas davam dinheiro aos residentes de acordo com o que julgavam razoável.[166]

Apesar da essência da política de residências inclusivas, a Human Rights Watch observou que os funcionários em duas das cinco residências visitadas pareciam não apoiar a autonomia e igualdade dos residentes. Embora todos os residentes fossem adultos, os funcionários geralmente se referiam a eles como crianças, chamando-os de “meninos” ou “meninas”. Eles incentivavam os residentes a chamarem os visitantes de "tia" ou "tio", como se fosse um relacionamento criança-adultos.[167]

As pessoas com deficiência que vivem em residências inclusivas não podem decidir se querem ou não morar lá. Como resultado, lhes é negado o direito de decidir onde e com quem viver, em igualdade de condições com os outros. A diretora de uma residência explicou que a secretaria municipal de assistência social decide onde colocar as pessoas, com base nas vagas disponíveis.[168] Assim, as pessoas são colocadas em uma residência inclusiva sem expressamente darem seu consentimento.

O programa de residência inclusiva tem o potencial de ajudar pessoas com deficiência atualmente sob cuidados de instituições a adquirirem as habilidades e autonomia necessárias para deixarem as instituições, viverem de forma independente e exercerem controle sobre suas próprias vidas. No entanto, elas não devem ser vistas como uma solução definitiva e adequada por si mesmas. O Comitê da CDPD tem reiterado que lares pequenos, como as residências inclusivas do Brasil, ainda são uma forma de institucionalização que segrega pessoas com deficiência e limita a autonomia pessoal, e não podem ser confundidas com alternativas de moradia independentes. [169] A vida independente significa que os indivíduos com deficiência podem tomar todas as decisões que dizem respeito a sua vida, incluindo a decisão sobre o local de residência, rotina diária, relacionamentos pessoais, vestuário, higiene, alimentação e cuidados de saúde, liberdade religiosa, direitos culturais e sexuais ou reprodutivos.[170] O direito de viver de forma independente e ser incluído na comunidade não deve depender do nível de apoio que uma pessoa com deficiência precisa.[171] Instituições, grandes ou pequenas, restringem pessoas com deficiência de exercerem controle sobre suas vidas.[172]

Outros países têm boas práticas de alternativas às instituições, as quais podem servir como exemplo de como garantir que as pessoas com deficiência possam viver de forma independente e fazer escolhas em igualdade de condições com os outros, com o apoio necessário. Por exemplo, o governo da Croácia garantiu apartamentos para algumas pessoas com deficiência intelectual e psicossocial que anteriormente viviam em instituições e lhes deu a opção de morarem nos apartamentos, com apoio na administração de tarefas diárias, se necessário. Programas similares no Cazaquistão, um administrado pelo governo e dois por organizações não-governamentais, apoiam 60 pessoas com deficiências intelectuais, de desenvolvimento e psicossociais a morarem em apartamentos ou casas.[173]

O Ministério do Desenvolvimento Social no Brasil deve considerar reformas no programa de residências inclusivas para garantir que elas sirvam como lares de transição com o objetivo de facilitar a autonomia genuína e a vida independente, em vez de servirem simplesmente como uma instituição menor. As autoridades devem adotar medidas para estruturar e assegurar uma série de serviços de apoio residencial, dentro de sua própria casa, e outros serviços de apoio na comunidade, incluindo a assistência pessoal necessária para apoiar a vida e a inclusão social.

Repúblicas para Jovens

O Brasil possui um sistema de pequenas residências, conhecidas como repúblicas para jovens, com adultos entre 18 e 21 anos que cresceram em instituições para crianças, destinadas a desenvolver competências básicas de vida e promover a autonomia. Elas são organizadas em grupos de até seis homens ou mulheres por apartamento, supervisionado por profissionais que gerenciam o lar e auxiliam os jovens no acesso à assistência social. Os jovens neste sistema são encorajados a encontrar um emprego e gradualmente começar a viver de forma independente.[174] Claudia Vidigal, ex-Secretária Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente, disse à Human Rights Watch que esses programas não são acessíveis para jovens com deficiência. Os prédios e apartamentos não são fisicamente acessíveis e o Estado não fornece adaptações razoáveis ​​para pessoas com deficiência, como atendentes pessoais.[175] As autoridades brasileiras devem buscar formas de incluir jovens com deficiência que crescem nas instituições de acolhimento para crianças para que sejam incluídos nas repúblicas para jovens, como meio de apoiar sua vida independente em igualdade de condições com as demais pessoas.

Benefícios Sociais Governamentais Relevantes para Pessoas com Deficiência

O Brasil oferece benefícios assistenciais pecuniários diretos para pessoas com deficiência, bem como serviços sociais que incluem serviços prestados em instituições e na comunidade, como centros-dia e atendimento médico. Os serviços podem ser prestados por autoridades municipais, estaduais e federais e organizações sem fins lucrativos. Os tipos e a qualidade dos serviços podem ser altamente variáveis, pois dependem dos recursos financeiros disponíveis em cada um desses níveis de governo.

Serviços sociais

No Brasil, a assistência social é organizada em um sistema descentralizado que abrange todos os níveis de governo (federal, estadual, municipal), conhecido como Sistema Único de Assistência Social (SUAS). O SUAS é projetado para coordenar a gestão, o financiamento e a assistência técnica em diferentes níveis de governo. Ele também trabalha com uma rede de serviços, programas e projetos públicos e privados. Também faz parte do SUAS o monitoramento e avaliação dos programas de assistência social.[176]

O sistema de assistência social oferece dois tipos de serviços: proteção social básica e especial. A proteção social básica é um conjunto de serviços, projetos e benefícios da assistência social para tentar prevenir situações de vulnerabilidade e risco social, bem como para construir e fortalecer a convivência familiar e comunitária[177]. A proteção social especial é o conjunto de serviços, programas e projetos para apoiar indivíduos e famílias que estão em situações de vulnerabilidade ​​ou cujos direitos foram violados.[178] As autoridades governamentais responsáveis pelos serviços de assistência social trabalham em colaboração com entidades não-governamentais e sem fins lucrativos para prover serviços, como centros-dia ou visitas médicas a domicílios, e fazem encaminhamentos a outros serviços na rede de assistência social, como saúde, educação, proteção social e outros programas. As secretarias municipais de saúde, educação, desenvolvimento e outros também fornecem serviços para pessoas com deficiência. De acordo com uma autoridade em Campinas, um município relativamente rico, os serviços prestados pelo município podem incluir equipamento para mobilidade ou intérpretes de língua de sinais.[179]

O Ministério do Desenvolvimento Social (MDS) implantou serviços para pessoas com deficiência, como centros-dia, para combater o isolamento, confinamento, barreiras discriminatórias e negligência.

De 2011 a 2014, o programa nacional Viver sem Limite contribuiu para uma melhoria na proteção dos direitos das pessoas com deficiência em quatro áreas: acesso à educação, inclusão social, acesso à saúde e acessibilidade.[180] Não existem programas nacionais semelhantes desde 2014. Em outubro de 2017, o Tribunal de Contas da União (TCU) fez uma recomendação ao Ministério dos Direitos Humanos para criar uma política permanente para a proteção dos direitos das pessoas com deficiência porque nenhum outro programa federal foi lançado desde o fim do Viver sem Limite.[181]

Benefícios Assistenciais Pecuniários

O Brasil disponibiliza dois tipos de benefícios assistenciais pecuniários para pessoas com deficiência: o Benefício de Prestação Continuada (BPC) e o Bolsa Família, que não é exclusivamente para pessoas com deficiência e visa aliviar a pobreza. Ambos são administrados pelo governo federal. O Bolsa Família é um programa iniciado em 2003 para combater a pobreza e a desigualdade social no Brasil. É um benefício financeiro transferido diretamente pelo governo federal às famílias.[182] Segundo dados oficiais, 14 milhões de famílias brasileiras se beneficiam do programa.[183]

O BPC é um benefício mensal pecuniário, garantido pela constituição do Brasil, equivalente ao salário mínimo mensal que hoje equivale a R$ 954,00[184]. O BPC é prestado à pessoa com deficiência ou à família (cônjuge, companheiro, pais, padrastos, irmãos solteiros, filhos, enteados solteiros e menores tutelados), desde que viva sob o mesmo teto. O BPC é disponibilizado apenas para pessoas cuja renda familiar total seja inferior a um quarto do salário mínimo por pessoa ou inferior a R$ 240,00 por mês[185]. Os pais de crianças com deficiência que trabalham e recebem valor maior do que isso, não são aptos para receber o BPC. O BPC pode ser combinado com o benefício do Bolsa Família, de assistência médica ou outra pensão mensal, como aposentadoria ou pensão por morte[186]. Além disso, estados e municípios administram benefícios eventuais, que podem ser oferecidos a indivíduos e famílias em virtude de nascimento, morte, vulnerabilidade temporária ou desastre natural.

Todas as pessoas com deficiência em instituições, independentemente da renda familiar e se cumprirem todos os outros requisitos estabelecidos pelo BPC, deveriam estar aptas para receber este benefício, visto que não vivem sob o mesmo teto da família. A Human Rights Watch constatou que algumas pessoas com deficiência que moram nas instituições visitadas, incluindo crianças, foram registradas para receber o BPC.

Quando uma pessoa está em uma instituição e é privada da capacidade legal, o BPC geralmente é gerenciado pela direção da instituição, enquanto responsável pela pessoa. Em um inquérito civil em andamento, o Ministério Público do estado de São Paulo identificou aspectos preocupantes na falta de transparência e prestação de contas da gestão do BPC em instituições na cidade de São Paulo. Não há supervisão sobre como as instituições de acolhimento usam os recursos do BPC que eles recebem em nome dos residentes[187]. Diretores de algumas instituições de acolhimento disseram à Human Rights Watch que usam o BPC para atender às necessidades individuais da pessoa que recebe o BPC, bem como para a instituição.[188]

De acordo com um estudo de 2011 sobre crianças em instituições no Rio de Janeiro, apenas 9,8% das crianças em instituições específicas para crianças com deficiência e 6,6% das que estão em instituições gerais recebiam o BPC. O Centro de Referência de Assistência Social (CRAS) no município tem a responsabilidade de fornecer informações a famílias e indivíduos, inclusive em instituições, sobre o BPC e como obtê-lo.[189]

Como observado acima, as famílias e funcionários entrevistados pela Human Rights Watch destacaram que as dificuldades financeiras são frequentemente um fator significativo para a institucionalização das crianças. As famílias que não são elegíveis ao BPC usam seu próprio dinheiro para pagar por serviços, às vezes dependendo de membros da família. Por exemplo, no Rio de Janeiro, Luciana contou que sua filha, uma mulher de 20 anos com uma condição genética cerebral, não seria capaz de ler e escrever segundo a previsão dos médicos. Mas agora ela consegue graças a um tratamento que seus pais e outros parentes procuraram e puderam prover. Luciana disse:

 “Desde que ela era um bebê, ela recebeu muita atenção e interação, e seu desempenho dependeu da estimulação precoce. Mas, claro, ela vem de uma classe social privilegiada e eu pude lhe dar todo o apoio necessário para ter certeza que ela conseguia. Famílias pobres não podem tratar [...] uma pessoa como minha filha sem apoio do Estado”.[190]

Na área de educação, os pais identificaram apoio insuficiente para seus filhos no sistema regular de ensino, e muitas vezes pagam por terapias adicionais particulares. Outros pais sentiram que a escola particular era a única opção para o seu filho devido à falta de educação inclusiva significativa. Neiva Correa Marins e Carlos Eduardo Cruz adotaram duas meninas com deficiência intelectual, mas não foram elegíveis a receber o BPC porque suas rendas combinadas superam o salário mínimo. Neiva disse à Human Rights Watch:

“Desde que adotamos Silvana, ela fez um enorme progresso, mas ela precisa de apoio adicional na escola, como fonoaudiologia. O Estado oferece apenas uma sessão de fonoaudiologia por semana, o que claramente não é suficiente, por isso pagamos por uma sessão adicional com o nosso próprio dinheiro”.[191]

Raquel Terra, que trabalha como fonoaudióloga em uma creche no Rio de Janeiro, também mencionou que as famílias de crianças com deficiência enfrentam dificuldades econômicas na aquisição de equipamentos para mobilidade que são essenciais. Como resultado, algumas famílias tiveram que aceitar cadeiras de rodas de tamanho único que “não são apropriadas para elas”.[192]

Alternativas Centradas na Convivência Familiar

Acolhimento Familiar

Alternativas ao acolhimento institucional para crianças estão se desenvolvendo no Brasil lentamente. O acolhimento familiar é uma forma de cuidado que ocorre dentro da casa de uma família. Antes de ser nomeada como família acolhedora, os candidatos passam por treinamento com uma equipe técnica. Um juiz concede a guarda provisória da criança a uma família. O acolhimento familiar é temporário e deve ser avaliado periodicamente, priorizando a reintegração com a família biológica e, quando isso não for possível, identificando uma solução de longo prazo para a criança. De acordo com a legislação brasileira, uma família acolhedora não pode se tornar uma família adotiva.[193] Uma família acolhedora só pode cuidar de uma criança ou até três irmãos. Quando são mais de três irmãos, as crianças são colocadas em instituições.[194]

Até novembro de 2016, 1.107 crianças no Brasil viviam em acolhimento familiar.[195] Segundo Isabel Penteado, diretora executiva do Instituto Fazendo História, uma das principais organizações que promovem o acolhimento familiar em São Paulo, apenas uma pequena porcentagem das crianças que poderiam se beneficiar do acolhimento familiar o fazem.[196] Além disso, mesmo os programas mais bem-sucedidos atualmente não incluem crianças com deficiência.

A Human Rights Watch visitou Campinas, um município a cerca de 100 quilômetros de São Paulo, que implementou um dos programas de maior sucesso de acolhimento familiar no país[197]. Em março de 2017, o município de Campinas contava com 23 crianças em acolhimento familiar (em comparação com 379 crianças em instituições)[198]. No entanto, à época, nenhuma das crianças no programa de acolhimento familiar tinha deficiência.

Janete Aparecida Giorgetti Valente, secretária municipal de assistência social do município de Campinas e encarregada do programa de acolhimento familiar, disse que este está aberto a todos, inclusive crianças com deficiência. Ela explicou:

“A política do Estado é incluir crianças com deficiência no programa de acolhimento familiar, mesmo com recursos suplementares. Uma família recebe um salário mínimo para cuidar da criança, mas se a criança tiver alguma deficiência, a família recebe uma quantia extra para assistir a criança (um terço do salário mínimo, independentemente das necessidades de apoio da criança). ”[199]

As famílias que desejam participar do programa de acolhimento familiar em Campinas devem participar de um treinamento de dois a três meses e passar por diferentes avaliações, incluindo testes psicossociais e uma análise das redes familiares e sociais. Segundo Janete, o treinamento inclui um módulo especial sobre crianças com deficiência, mas seu alcance é curto e limitado.[200]

A Human Rights Watch tentou entrar em contato com programas de acolhimento familiar no Rio de Janeiro e em Salvador, mas as autoridades responsáveis no Rio de Janeiro não responderam e as autoridades em Salvador declinaram a visita porque estavam no processo de iniciar o programa.

Adoção

Existe um sistema de adoção no Brasil, mas apesar dos esforços empregados, as crianças com deficiência raramente são adotadas.[201] Os juízes das Varas da Infância e da Juventude são obrigados a realizar uma busca ativa para que crianças com deficiência encontrem pais adotivos. Até 30 de janeiro de 2018, o cadastro de adoção do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) registrava 40.058 crianças disponíveis para adoção e 40.831 candidatos buscando adotar. Das 7.271 crianças que foram adotadas no Brasil entre 2013 e 2018, apenas 8% tinham alguma deficiência ou “doença”.[202]

De acordo com o cadastro do Conselho Nacional de Justiça sobre adoção, a maioria das famílias adotivas está disposta a adotar somente crianças sem deficiência. Do total de candidatos (40.831), quase 64% informaram que não aceitam crianças com deficiência ou outras condições de saúde. Seis por cento (2.560 candidatos) declararam disposição de adotar crianças com deficiência física e apenas 3% (1.374 candidatos) adotariam uma criança com deficiência psicossocial.[203]

O Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, exige que as crianças com deficiência sejam priorizadas para adoção e determina que o Estado crie campanhas de conscientização especificamente voltadas para promover a adoção para crianças com deficiência.[204]

Lei de Inclusão de Pessoas com Deficiência

A Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência) de 2016, harmoniza a legislação nacional com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), ratificada pelo Brasil em agosto de 2008[205]. A lei incorpora os princípios básicos do modelo de deficiência baseado em direitos humanos e inclui uma definição específica de discriminação indireta. Para garantir que as pessoas com deficiência possam exercer seus direitos, a lei inclui disposições sobre capacidade legal, acessibilidade, participação política e educação inclusiva.

A lei também inclui uma provisão que estabelece o auxílio-inclusão, benefício específico para pessoas com deficiência para viverem e serem incluídas na comunidade, quando estavam recebendo o BPC e deixaram de ser elegíveis porque começaram a trabalhar. O governo deve aprovar uma regulamentação sobre esse novo benefício, o que até a redação do relatório ainda não havia sido feito. [206]. A lei menciona crianças com deficiência apenas uma vez (para estabelecer o direito à proteção especial) e não fornece disposições mais detalhadas sobre elas, incluindo referência específica ao direito das crianças com deficiência de crescerem em família.

Recomendações

Para o governo brasileiro

Embora algumas dessas recomendações devam ser implementadas por autoridades ou órgãos governamentais específicos, a maioria poderá ser implementada somente por meio de um esforço intergovernamental e intersetorial significativo em nível federal, estadual e municipal. O governo do Brasil deve estabelecer um grupo de trabalho intergovernamental e intersetorial para tratar das ações e políticas de curto e longo prazo e outras mudanças necessárias para garantir os direitos das crianças e adultos com deficiência no Brasil.

Proteger os direitos de crianças e adultos e que permanecem em instituições até sua completa desinstitucionalização

  • Acabar com o uso de restrições físicas e medicamentos psiquiátricos como forma de controlar ou disciplinar as pessoas com deficiência ou como medida conveniente para facilitar o trabalho de funcionários, especialmente em relação a crianças. Em vez disso, treinar funcionários quanto a métodos e habilidades alternativas para lidar com diferentes comportamentos;
  • Avaliar maneiras de garantir a privacidade das pessoas nas instituições, especialmente para adolescentes e adultos;
  • Adotar medidas para assegurar que todas as crianças em instituições recebam educação inclusiva no sistema regular de ensino;
  • Assegurar que as instituições estaduais, municipais e privadas tenham funcionários suficientes para prestar serviços a crianças e adultos com deficiência, incluindo alimentação, saúde, atividades de lazer e treinamento para preparar os residentes para uma vida independente;
  • Estabelecer monitoramento obrigatório pelo Ministério Público para que realize visitas periódicas às instituições para adultos com deficiência;
  • Garantir mecanismos acessíveis para que crianças e adultos com deficiência nas instituições possam denunciar abusos sem risco de retaliação. Isso inclui informar de maneira acessível as pessoas, incluindo crianças, sobre seus direitos. Assegurar adaptações processuais adequadas individualizadas para que as pessoas acessem os mecanismos de denúncia e procedimentos de revisão, de acordo com o artigo 13 da CDPD;
  • Garantir que as denúncias sejam analisadas e processadas com rapidez e imparcialidade;
  • Garantir que todas as pessoas com deficiência que vivem em instituições, quando cumpridos os requisitos legais, recebam o BPC e possam administrar este benefício com mecanismos de apoio e supervisão adequados.

 

Estabelecer um plano e cronograma para a desinstitucionalização

  • O Brasil deve desenvolver um plano e cronograma para dar fim à institucionalização de crianças e adultos e desenvolver serviços na comunidade para pessoas com deficiência e famílias de crianças com deficiência. Isso deve incluir esforços para realocar os gastos e outros programas governamentais de apoio às instituições para maior assistência para que as pessoas com deficiência vivam de forma independente em suas comunidades e para que crianças com deficiências cresçam com suas famílias em casa.
  • Assegurar que pessoas com deficiência, organizações de pessoas com deficiência, organizações não-governamentais relevantes, o Ministério Público e a Defensoria Pública sejam convidados a participar da elaboração deste plano;
  • Determinar que nenhum financiamento fornecido pelo Sistema Único de Assistência Social seja empregado na construção de novas instituições, em grandes projetos de reformas de instituições existentes e na renovação e financiamento de novas parcerias com instituições de acolhimento administradas por organizações não governamentais, pessoas físicas e corporações, ou governos locais e regionais. O governo deve buscar cooperar com entidades privadas e governos locais para desenvolver e apoiar serviços providos na comunidade;
  • Com relação a crianças, desenvolver e apoiar suficientemente os programas de apoio familiares para ajudar a prevenir a separação de uma criança de sua família biológica;
  • Assegurar a implementação efetiva da política existente, dando prioridade a cuidados alternativos centrados na convivência familiar para crianças que não podem permanecer com suas famílias biológicas, incluindo o acolhimento por família extensa ou ampliada, famílias adotivas e acolhedoras, quando necessário;
  • As crianças não devem ser colocadas em instituições de acolhimento, exceto quando outras alternativas não sejam possíveis ou para impedir a separação de irmãos, e por um período limitado, com o objetivo planejado de reintegração familiar ou colocação sob outro cuidado alternativo de longo prazo apropriado como melhor saída para a criança.
    • Bebês e crianças de até três anos de idade não devem ser institucionalizadas, e sim colocadas em ambientes familiares, como acolhimento familiar provisório.
  • Ao buscar tirar crianças e adultos das instituições, garantir a implementação de planos individuais para a saída de cada pessoa, incluindo um plano que inclua apoio e serviços oferecidos na comunidade que sejam necessários. Os planos individuais devem ser feitos em tempo adequado e cumpridos em um prazo razoável para que não se tornem obsoletos. Assegurar o envolvimento de longo prazo dos profissionais que acompanham o caso e o monitoramento regular da implementação de planos individuais;
  • Treinar funcionários para consultar todas as crianças com deficiência que vivem em instituições no que diz respeito a seus planos futuros antes de completarem 18 anos; as crianças não devem ser automaticamente transferidas a instituições para adultos;
  • Incluir crianças com deficiência em repúblicas para jovens ou em outros programas destinados a facilitar a transição das crianças de uma vida institucionalizada para uma vida independente;
  • Para os adultos com deficiências atualmente vivendo instituições, progressivamente integrá-los na comunidade e desenvolver serviços e sistemas para garantir sua vida independente, conforme detalhado abaixo;
  • Fornecer orientação e treinamento a estados e municípios, instituições, centros-dia e atores privados sobre os papéis que desempenharão no processo de desinstitucionalização;
  • Quando necessário, recorrer às experiências de outros países que passaram por desinstitucionalização.

Desenvolver estratégias para garantir que crianças com deficiência vivam em famílias, fortalecendo o apoio ao nascimento, às famílias adotivas e acolhedoras

  • Desenvolver programas emergenciais de acolhimento familiar, em particular para bebês e outras crianças pequenas, como alternativas à institucionalização;
  • Assistir e fortalecer as famílias biológicas de crianças atualmente em instituições ou em acolhimento familiar com o objetivo de reintegrar a criança com sua família biológica;
  • Assegurar que os sistemas de adoção e acolhimento familiar estejam plenamente operantes no momento em que as crianças forem desinstitucionalizadas, e não após a transformação das instituições;
  • Garantir apoio material, financeiro, psicológico e outros a todas as famílias (biológica, adotiva, acolhedora) após a colocação de uma criança na família para garantir uma transição efetiva e limitar o risco de retorno das crianças às instituições;
  • Estabelecer e manter uma gama de serviços direcionados, acessíveis e diversificados, providos na comunidade, para famílias em situações difíceis, bem como para pessoas com deficiência, incluindo crianças com deficiência e suas famílias, para evitar a institucionalização e apoiar famílias a criarem seus filhos em casa.

Expandir e desenvolver, onde necessário, serviços na comunidade para pessoas com deficiência e para famílias com crianças com deficiência

Desenvolver serviços e equipamentos de apoio a crianças e adultos com deficiência para viverem em sociedade

  • Garantir que todas as famílias e pessoas com deficiência elegíveis recebam o BPC;
  • Além do benefício do BPC, garantir serviços acessíveis e de qualidade para a vida independente de crianças e adultos com deficiência, de acordo com suas necessidades individuais, incluindo serviços de assistência pessoal; bem como serviços direcionados com base nas necessidades específicas do indivíduo;
  • Garantir que os indivíduos sejam plenamente informados das opções disponíveis e prestar assistência, conforme necessário, na tomada de decisões;
  • Realocar os orçamentos existentes destinados a cuidados em instituições de acolhimento, inclusive em parcerias com organizações não governamentais e atores privados;
  • Estabelecer um grupo de pessoas com deficiência e outros especialistas para monitorar e avaliar a eficácia dos serviços de apoio providos na comunidade e incorporar suas conclusões em políticas futuras.

Rever e expandir o programa de residências inclusivas

  • Com base no direcionamento positivo do programa de residências inclusivas, revisitar o programa para garantir que as residências inclusivas aumentem as competências básicas de vida autônoma das pessoas com deficiência, com vistas a promover a vida independente, fora de uma instituição. Residências inclusivas devem:
    • Garantir que as pessoas com deficiência vivam em residências inclusivas com base em seu consentimento livre e informado;
    • Garantir que todas as residências inclusivas sejam acessíveis e que as pessoas disponham de ambientes com adaptações razoáveis;
    • Garantir que todas as pessoas com deficiência que vivem em residências inclusivas sejam consultadas em todas as questões relativas à gestão da residência;
    • Desenvolver uma ampla gama de competências básicas de vida para que os residentes tenham uma vida independente, incluindo:
      • refeições, planejamento alimentar e culinária
      • saúde e higiene pessoal
      • oportunidades de emprego, incluindo fora da residência
      • transações bancárias, pagamento de contas e gestão de finanças domésticas
      • identificação e escolha de moradia
      • serviços de limpeza
      • relacionamentos e matrimônio planejamento familiar
      • maternidade ou paternidade.
    • Permitir que os moradores deixem a residência, se assim o desejarem; prestar apoio quando solicitado para a pessoa em questão;
    • Restabelecer a capacidade legal para os residentes que dela foram destituídos. Criar mecanismos para garantir a tomada de decisão apoiada para residentes que a solicitarem;
    • Estabelecer para funcionários que gerenciam residências inclusivas, programas de treinamento baseados em direitos.
  • Melhorar o acesso à educação inclusiva de qualidade para pessoas com deficiência
  • Em consonância com a Lei de Inclusão, garantir às crianças com deficiência uma educação inclusiva e de qualidade, incluindo todas as crianças que vivem em instituições, por meio das seguintes medidas:
    • Fortalecer os currículos de educação inclusiva e os padrões de treinamento para professores que trabalham com crianças com diferentes deficiências e treinar professores;
    • Garantir infraestrutura e adaptações razoáveis ​​para que as crianças com deficiência recebam educação inclusiva e de qualidade nas escolas regulares perto de onde vivem, de acordo com os padrões da CDPD, incluindo o Comentário Geral nº. 4 sobre o direito à educação inclusiva;
    • Adotar medidas para integrar na educação, tanto quanto possível, os mais recentes avanços em equipamentos e tecnologia assistiva.
    • Desenvolver campanhas de conscientização entre funcionários de instituições, administradores de escolas do ensino regular, professores e outros funcionários da escola, bem como entre crianças sem deficiência e seus pais, sobre os direitos, a dignidade e o potencial das crianças com deficiência, incluindo o direito a ser livre de discriminação de qualquer tipo;
    • Garantir que os funcionários das instituições nunca considerem uma criança incapaz de receber educação e não neguem a nenhuma criança o direito de prosseguir com sua educação;
    • Garantir que as crianças com deficiências em idade pré-escolar tenham acesso a pré-escola e creches, em igualdade de condições com as demais crianças.

Garantir o acesso a cuidados de saúde de qualidade para pessoas com deficiência

  • Exigir que o tratamento médico seja realizado apenas com o consentimento livre e informado da pessoa que o recebe, com o respectivo fornecimento do apoio necessário para dar o consentimento informado. Qualquer intervenção médica forçada deve ser estritamente limitada a situações de emergência, quando a vida de uma pessoa é exposta a uma ameaça iminente ou a uma condição de gravidade semelhante e duradoura e apenas até que a condição tenha sido controlada.

Reformas Legais

Garantir que as reformas do Código Civil e do Código de Processo Civil

  • Reconheçam plenamente a capacidade legal de todas as pessoas com deficiência, em igualdade de condições com as demais pessoas, independentemente da natureza de sua deficiência, revogando qualquer dispositivo que perpetue o sistema de tomada de decisão substitutiva e desenvolvam um modelo de tomada de decisão apoiada que assegure a autonomia, vontade e preferências das pessoas com deficiência;
  • Harmonizem a Lei Brasileira de Inclusão, o Código Civil e o Código de Processo Civil para criar um sistema no qual as pessoas com deficiência contem com a tomada de decisão apoiada, se necessário e solicitado por elas, em vez de privadas de sua capacidade legal. As reformas devem ainda assegurar que quaisquer medidas legislativas relativas à capacidade legal se apliquem igualmente à população geral no Brasil, e não com base na deficiência;
  • Enquanto se aguarda a implementação da reforma sobre a capacidade legal, os seguintes passos para assegurar os direitos das pessoas com deficiência devem ser seguidos:
  • Capacitar defensores públicos para representarem pessoas com deficiência em processos judiciais relativos à capacidade legal;
  • Reformar a Lei Brasileira de Inclusão para garantir o acesso a serviços de apoio e atendente pessoal com base nas necessidades das pessoas, independentemente do seu status de emprego, e fornecer serviços com base em todos os recursos disponíveis.

Melhorar a Coleta e Publicação de Dados

  • Coletar e publicar, nas bases de informações públicas, dados desagregados sobre o número de pessoas com deficiência, desagregados por tipo de deficiência e outros marcadores demográficos, como idade, sexo, etnia, local e equipamento de residência, incluindo instituições de acolhimento. Dados precisos são importantes para o desenvolvimento de políticas, planos e programas eficientes e eficazes;
  • Garantir mecanismos de compartilhamento, intercâmbio e harmonização de dados entre diferentes órgãos.

Para o Comitê da CDPD das Nações Unidas

  • Avaliar de forma critica as melhorias do Brasil na implementação do artigo 19 da CDPD, o direito de viver em comunidade, bem como os artigos 7, 12, 24 e 25 em sua revisão de acompanhamento do Brasil e fazer recomendações positivas sobre como tratar os problemas identificados neste relatório.

À Comissão Interamericana de Direitos Humanos

  • Realizar uma audiência pública sobre a situação de crianças e adultos com deficiência que vivem em instituições no Brasil;
  • Realizar um estudo especial em todo o Brasil para avaliar a situação de crianças e adultos que vivem em instituições e coletar dados desagregados sobre o número de pessoas com deficiência e outras informações relevantes para implementar o plano de desinstitucionalização.
 

Agradecimentos

Este relatório foi pesquisado e escrito por Carlos Ríos-Espinosa, pesquisador sênior da Divisão de Direitos das Pessoas com Deficiência. César Muñoz, pesquisador sênior na Divisão das Américas conduziu entrevistas para o relatório. Andrea Carvalho e Natália Jeronimo, consultora e estagiária da Divisão das Américas, forneceram apoio à pesquisa.

Jane Buchanan, diretora-adjunta da Divisão de Direitos das Pessoas com Deficiência, e Shantha Rau Barriga, diretora, editaram o relatório. Emina Ćerimović, pesquisadora de Divisão de Direitos das Pessoas com Deficiência, realizou uma pesquisa no Brasil e revisou o relatório. Danielle Haas, editora sênior do Departamento de Programas, editou versões iniciais deste relatório. Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch no Brasil, Daniel Wilkinson, diretor da Divisão das Américas, Diederik Lohman, diretor da Divisão de Saúde e Direitos Humanos, e Kriti Sharma, pesquisadora da Divisão de Direitos das Pessoas com Deficiência, revisaram o relatório. Christopher Albin-Lackey, conselheiro legal sênior, forneceu a revisão legal. Iain Levine, Diretor Executivo Adjunto de Programas, forneceu a revisão do respectivo departamento de programas.

Stephanie Collins, assistente, forneceu apoio editorial e de produção. O relatório foi preparado para publicação por Fitzroy Hopkins, gerente de produção.

Agradecemos a todos que compartilharam suas histórias pessoais, bem como funcionários, servidores e especialistas que concordaram em ser entrevistados, entre eles as Dras. Stella Reicher e Rita Barreto. Agradecemos a todas as organizações que apoiaram este trabalho, facilitando entrevistas e fornecendo informações valiosas. Agradecimentos especiais a Luis Rodríguez-Martinez, que prestou apoio a Carlos Ríos-Espinosa durante toda a pesquisa e tirou a maioria das fotos neste relatório.

 

 

[1] Sistema Único de Assistência Social (SUAS), Censo SUAS 2016, Resultados nacionais, http://aplicacoes.mds.gov.br/snas/vigilancia/index2.php (acessado em 1 de novembro de 2017), p. 7.

[2] Censo SUAS 2016.

[3] Esses números são baseados em um questionário enviado às instituições registradas junto ao governo, sendo preenchido pelos funcionários. No entanto, nem todas as instituições respondem ao questionário. Ao analisar as informações de 2016, a Human Rights Watch constatou que dados discriminados por tipo de deficiência não eram consistentes com os números totais relatados, o que indica que as definições ou instruções contidas no questionário não eram suficientemente claras ou precisas. Censo SUAS 2016.

[4] O estudo também identificou 32.877 idosos com deficiência vivendo em asilos. A análise de tal tópico não faz parte do escopo da presente pesquisa. Censo SUAS 2016, questão 29.

[5] Censo SUAS 2016, questão 29.

[6] Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei Nº 8.069, de 13 de julho de 1990, art. 101.

[7] Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes”, Resolução Nº 1, 18 de junho de 2009. pp. 67-74.

[8] Censo SUAS 2016, questão 4.

[9] Ministério Público de São Paulo, Inquérito Civil Nº 033/17, vol. 1., p. 16.

[10] O Conselho Tutelar é um órgão composto por cinco membros eleitos a cada quatro anos, encarregado de zelar pelo cumprimento dos direitos das crianças. Um conselho deve existir em todos os municípios ou regiões administrativas do Distrito Federal. ECA, art. 131.

[11] Censo SUAS 2016, questão 6. Entidades privadas que desejam receber financiamento público devem ser certificadas pelo Ministério do Desenvolvimento Social. “Certificação de Entidades Beneficentes de Assistência Social”, Lei Nº 12.101, de 27 de novembro de 2009.

[12] Center on the Developing Child at Harvard University, The Science of Neglect: The Persistent Absence of Responsive Care Disrupts the Developing Brain: Working Paper No. 12, 2012, www.developingchild.harvard.edu. (acessado em 4 de dezembro de 2017); A. Berens e C. Nelson, “The Science of Early Adversity: Is there a Role for Large Institutions in the Care of Vulnerable Children?” The Lancet (2015); e UNICEF, “Violence against Children in Care and Justice Institutions,” sem data, http://www.unicef.org/violencestudy/5.%20World%20Report%20on%20Violence%20against%20Children.pdf (acessado em 3 de abril de 2018); Marinus H. van Ijzendoorn et. al, “Children in Institutional Care: Delayed Development and Resilience,” Monographs of the Society for Research in Child Development, vol. 76, issue 4 (2001); e Megan M. Julian e Robert B. McCall, “The Development of Children within Alternative Residential Care Environments,” International Journal of Child and Family Welfare, 2011/3-4, pp. 119-147; Georgette Mulheir, “Deinstitutionalization: A Human Rights Priority for Children with Disabilities,” setembro de 2012, http://www.equalrightstrust.org/ertdocumentbank/err9_mulheir.pdf (acessado em 3 de abril de 2018); Kevin Browne, “The risk of harm to young children in institutional care,” Child Rights Information Network, 2009,  www.crin.org/en/docs/The_Risk_of_Harm.pdf (acessado em 3 de abril de 2018); Nelson C, et al., “Cognitive Recovery in Socially Deprived Young Children: the Bucharest Early Intervention Project,” http://www.bucharestearlyinterventionproject.org/Nelson_et_al__combined__2007_.pdf (acessado em 3 de abril de 2018); Bos, K. et al., “Psychiatric Outcomes in Young Children with a History of Institutionalization,” 2011, http://www.bucharestearlyinterventionproject.org/Bos_et al 2010_.pdf (acessado em 3 de abril de 2018).

[13] UNICEF e Organização Mundial da Saúde (OMS), “Early Childhood Development and Disability: A Discussion Paper,” 2012, http://apps.who.int/iris/bitstream/10665/75355/1/9789241504065_eng.pdf (acessado em 1 de março de 2017).

[14] Mulheir, “Deinstitutionalisation;” Browne, “The risk of harm to young children in institutional care;” Inge Bretherton, "The origins of attachment theory: John Bowlby and Mary Ainsworth,” Developmental Psychology (1992), 28, pp. 759-775 http://www.psychology.sunysb.edu/attachment/online/inge_origins.pdf (acessado em 15 de novembro de 2017); e Serena Cherry Flaherty e Lois S. Sadler, “A Review of Attachment Theory in the Context of Adolescent Parenting,” Journal of Pediatric Healthcare, 2011, Março-Abril, https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC3051370/ (acessado em 4 de dezembro de 2017), pp. 114-121.

[15] Comitê das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, Comentário Geral Nº 20 sobre a Implementação dos Direitos da Criança durante a Adolescência, UN Doc. CRC/C/GC/20 (2016), parágrafo. 52.

[16] Johnson R, Browne K e Hamilton-Giachritsis C., “Young children in institutional care at risk of harm,” Save The Children e The Better Care Network, 2009, https://www.crin.org/en/docs/The_Risk_of_Harm.pdf (acessado em 6 de novembro de 2016).

[17] Entrevista da Human Rights Watch com a direção da instituição, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[18] A Human Rights Watch também visitou cinco residências inclusivas.

[19] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários de uma instituição, 7 de novembro de 2016 (local não revelado por motivos de segurança).

[20] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários de instituições (datas e locais não revelados por motivos de segurança).

[21] Orientações técnicas estabelecem critérios mínimos para a contratação de funcionários de instituições voltadas às crianças, mas tais critérios não são vinculantes. As orientações indicam maior número de funcionários para instituições dedicadas a crianças com deficiência. “Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes,” pp. 68-69.  Residências inclusivas também têm orientações a respeito de funcionários. “Orientações sobre o Serviço de Acolhimento Institucional para Jovens e Adultos com Deficiência em Residências Inclusivas. Perguntas e respostas,” novembro de 2014, p. 44.

[22] Entrevistas da Human Rights Watch com funcionários de uma instituição, Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2016; com funcionários de outra instituição nas proximidades do Distrito Federal, 18 de novembro de 2016; e em uma instituição na Bahia, 5 de abril de 2017.

[23] Relatório do Relator Especial da ONU sobre Tortura, A/HRC/22/53, Conselho de Direitos Humanos, 22a sessão, 1º de fevereiro de 2013.

[24] Organização Mundial da Saúde (OMS), “Strategies to end the use of seclusion restraint and other coercive practices,” Kit de ferramentas Direito é Qualidade da OMS [WHO QualityRights Guidance and Training Tools], WHO/MSD/MHP/17.9, http://who.int/mental_health/policy/quality_rights/guidance_training_tools/en/ (acessado em 31 de janeiro de 2018).

[25] Ibid.

[26] Visita da Human Rights Watch a uma instituição, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[27] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários de uma instituição, São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[28] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários de uma instituição, Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2016.

[29] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários de uma instituição, instituição em São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[30] Visitas da Human Rights Watch a instituições, São Paulo, 5 de abril de 2017; e Salvador, Bahia, 5 de abril de 2017.

[31] Entrevista da Human Rights Watch com um funcionário de uma instituição, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[32] Visita da Human Rights Watch a uma instituição, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[33] Entrevista da Human Rights Watch com Leonardo Barcellos, Rio de Janeiro, 28 de março de 2017.

[34] Entrevista da Human Rights Watch com Álvaro [nome fictício] em uma instituição, Salvador, 6 de novembro de 2017.

 

[35] Visitas da Human Rights Watch a uma instituição no Rio de Janeiro, duas instituições na Bahia e três instituições nas proximidades do Distrito Federal, 5 de abril de 2017

[36] Entrevista da Human Rights Watch com uma enfermeira de uma instituição, Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2016.

[37] Entrevista da Human Rights Watch com uma enfermeira de uma instituição, Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2016.

[38] Entrevista da Human Rights Watch com [nome não revelado] em [local não revelado], novembro de 2016.

[39] Convenção da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), adotada em 13 de dezembro de 2006, G.A. Res. 61/106, Anexo I, UN GAOR, 61ª Sess., Supp. (Nº 49) at 65, UN Doc. A/61/49 (2006), em vigor a partir de 3 de maio de 2008, arts. 1, 3 e 5.

[40] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), art. 22.

[41] Entrevista da Human Rights Watch com uma enfermeira da instituição, Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2016

[42] Entrevista da Human Rights Watch com a diretora da instituição, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

 

[43] Visita da Human Rights Watch a uma instituição, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[44] Visitas da Human Rights Watch a uma instituição em São Paulo e a três instituições no Rio de Janeiro, 14 de novembro de 2016.

[45] Visita da Human Rights Watch a uma instituição no Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[46] Entrevista da Human Rights Watch com Cecília, Rio de Janeiro, 27 de março de 2017.

[47] Convenção sobre os Direitos da Criança (CDC), adotada em 20 de novembro de 1989, G.A. Res. 44/25, anexo, 44 UN GAOR Supp. (No.49) at 167, UN Doc. A/44/49 (1989), em vigor a partir de 2 de setembro de 1990, art. 31.1.

[48] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), art. 30.5.

[49] Entrevista da Human Rights Watch com o administrador da instituição, Rio de Janeiro, 15 de novembro de 2016. Página no Facebook da Ação Cristã Vicente Moretti: https://pt-br.facebook.com/AcaoCristaVicenteMoretti/; Página no Facebook do Lar Maria de Lourdes: https://pt-br.facebook.com/larmariadelourdesrj/; Página no Facebook do Lar da Redenção: https://www.facebook.com/LAR-DA-Reden%C3%A7%C3%A3o-660323963998341/; Site da Casa da Criança Betinho: http://www.casadacriancabetinho.com.br/; Página no Facebook da Vila Pequenino Jesus: https://www.facebook.com/pg/vilapequeninojesus/reviews/?ref=page_internal. Página no Facebook do Abrigo Betel: https://www.facebook.com/abrigobetel/?rf=484170998408596.

[50] Site do Abrigo Ceilândia Esperança, http://abrigodeceilandia.blogspot.mx/.

[51] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), art. 4.1 (e) juntamente com art. 5.

[52] Comitê da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, Observações conclusivas sobre o Peru, CRPD/C/PER/CO/1, 9 de maio de 2012, parás. 18 e 19; México, CRPD/C/MEX/CO/1, 27 de outubro de 2014, parás. 17 e 18; Colômbia CRPD/C/COL/CO/1, 30 de setembro de 2016, parás. 20 e 21; Guatemala, CRPD/C/GTM/CO/1, 30 de setembro de 2016, parás. 25 e 26; Uruguai, CRPD/C/URY/CO, 31 de agosto de 2016, parás. 19 e 20; e Chile, CRPD/C/CHL/CO/1, 13 de abril de 2016, parás. 17 e 18.

[53] Entrevista da Human Rights Watch com a direção de uma instituição, Rio de Janeiro, 28 de março de 2017.

[54] Entrevista da Human Rights Watch com a direção de uma instituição, Rio de Janeiro, 21 de março de 2018.

[55] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários de instituições, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[56] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários de instituições, Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2016.

[57] OMS, “Realising recovery and the right to mental health and related services,” Kit de ferramentas Direito é Qualidade da OMS [WHO QualityRights Guidance and Training Tools], WHO/MSD/MHP/17.4, http://www.who.int/mental_health/policy/quality_rights/guidance_training_tools/en/ (acessado em 5 de maio de 2018).

[58] Entrevista da Human Rights Watch com a direção de uma instituição, Rio de Janeiro, 21 de março de 2018.

[59] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), arts. 15, 16, 17.

[60] Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), Nº 13.146/2015, de 6 de julho de 2015, arts. 27 e 28.

[61] Entrevista da Human Rights Watch com funcionário da instituição, Bahia, 5 de abril de 2017.

[62] Entrevista da Human Rights Watch com funcionário da instituição, Bahia, 5 de abril de 2017.

[63] Ministério Público de São Paulo, Inquérito civil Nº 033/2017, vol. 1, p. 97.

[64] Entrevistas da Human Rights Watch com funcionários de uma instituição no Rio de Janeiro e duas instituições em São Paulo, 21 de novembro de 2016.

[65] Entrevista da Human Rights Watch com Alberto [nome fictício], instituição na Bahia, 5 de abril de 2017.

[66] Entrevista da Human Rights Watch com Mariana [nome fictício], instituição em São Paulo, 7 de abril de 2017.

[67] Entrevista da Human Rights Watch com Clementina Bagno, Brasília, 22 de novembro de 2016.

[68] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), art. 24. Comitê da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, Comentário Geral Nº 4, Sobre o Direito à Educação Inclusiva [On the Right to Inclusive Education], UN Doc. CRPD/C/GC/4 (2016).

[69] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), art. 24.2.a

[70] CDC (CRC, na sigla em inglês), art. 28.1.

[71] Comitê da ONU sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência, Observações conclusivas sobre o relatório inicial do Estado Brasileiro, CRPD/C/BRA/CO/1, 29 de setembro de 2015, paragrafos 44 e 45.

[72] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), arts., 1, 4, 5 e 24.

[73] Visita da Human Rights Watch a uma instituição, São Paulo, 13 de novembro de 2016.

[74] Visita da Human Rights Watch a uma instituição, Bahia, 5 de abril de 2017.

[75] Entrevista da Human Rights Watch com o juiz Reinaldo Cintra Torres de Carvalho, 13 de novembro de 2016 e ECA.

[76] Censo SUAS 2016, questão 41.

[77] Por exemplo, entrevista da Human Rights Watch com funcionários de instituições, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[78] Entrevista da Human Rights Watch com a direção da instituição, São Paulo, 16 de novembro de 2016.

[79] Inquérito Civil Nº 033/2017 do Ministério Público de São Paulo.

[80] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), art. 19.

[81] Comitê da CDPD da ONU (CRPD, na sigla em inglês), Comentário Geral Nº 5, Viver de forma independente e ser incluído na comunidade [Living Independently and Being Included in the Community], UN DOC CRPD/C/GC/5, 27 de outubro de 2017, parás. 28-37, 49.

[82] Audiências ocorrem pelo menos a cada seis meses a fim de revisar a institucionalização de crianças. O Juiz da Infância e Juventude, o Ministério Público e a Defensoria Pública visitam as instituições para acompanhar os casos e ouvir reclamações. O Ministério Público em Brasília afirmou que não possuía um procedimento em vigor para receber reclamações de crianças com deficiência.

[83] Lei N° 13.509, alterando a Lei N° 8.069, de 13 de julho de 1990 (Estatuto da Criança e do Adolescente), a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), aprovada pelo Decreto-Lei Nº 5.452, de 1° de maio de 1943, e a Lei Nº 10.406 de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), 22 de novembro de 2017.

[84] Entrevista da Human Rights Watch com Pedro González, defensor público, Defensoria Pública do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro, 11 de novembro de 2016. À época da entrevista, havia um limite de dois anos.

[85] Convenção Americana sobre Direitos Humanos, adotada na Conferência Especializada em Direitos Humanos, São José, Costa Rica, 22 de novembro de 1969, art. 71.1, CDC (CRC, na sigla em inglês), arts. 5, 9, CRPD, art. 23.1, CRC, Comentário Geral Nº 9, e Comitê da ONU sobre os Direitos da Criança, Comentário Geral Nº 7, Implementando os Direitos da Criança no Começo da Infância [Implementing Child Rights in Early Childhood], UN Doc. CRC/C/GC/7/Rev.1 (2006), pará, 49.

[86] CDC (CRC, na sigla em inglês), arts. 3(1) e 9(1).

[87] Diretrizes das Nações Unidas sobre Cuidados Alternativos para Crianças, adotadas em 24 de fevereiro de 2010, G.A. Res. A/RES/64/142, parágrafo 15.

[88] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), artigo 23(5).

[89] CDC (CRC, na sigla em inglês), Comentário Geral Nº 9, parágrafo. 49. E, por exemplo, as Observações conclusivas da CDPD (CRPD, na sigla em inglês) sobre a Armênia (CRPD/C/ARM/CO/1 parágrafo 12 (a) (b)); e Observações conclusivas da CRPD sobre o Irã (CRPD/C/IRN/CO/1 parágrafo 17 (c)).

[90] Observações conclusivas da CDPD (CRPD, na sigla em inglês) sobre o Brasil, parás. 36 e 37.

[91] Censo SUAS 2016, questão 28.

[92] Irene Rizzini, professora e pesquisadora da PUC-Rio, conduziu um estudo sobre crianças com deficiência que residiam em instituições no Rio de Janeiro por um longo período de tempo. “Do confinamento ao acolhimento: mudando a prática de institucionalização de crianças e adolescentes com deficiência no Estado do Rio de Janeiro: desafios e caminhos”, CNPq/Ministério da Saúde, 2008, http://www.ciespi.org.br/media/Livros%20e%20Periodicos/Livros%20e%20periodicos%20pg%203/2Do_confinamento%20ao%20acolhimento.pdf (acessado em 5 de maio de 2018). Um segundo estudo constatou que 42,2 por cento das crianças com deficiência em instituições especializadas no Rio de Janeiro passa metade das suas vidas em instituições. No caso das crianças com deficiência vivendo em instituições não-especializadas, 59 por cento passavam mais da metade da vida em tais instituições. Irene Rizzini e Neli Almeida, Institucionalização de crianças e adolescentes com deficiência: anotações para uma agenda de política pública,” Revista Saúde & DH, ano 7 nº 7, Rio de Janeiro: Fiocruz, 2011, https://www.streetchildrenresources.org/resources/a-institucionalizacao-de-criancas-e-adolescentes-com-deficiencia-anotacoes-para-uma-agenda-de-politica-publica/ (acessado em 5 de maio de 2018), pp. 159 -177.

[93] Relatório da Resolução N° 71/2011, Conselho Nacional do Ministério Público, 2013, p. 42.

[94] Visitas da Human Rights Watch a duas instituições no Rio de Janeiro, novembro de 2016; a uma instituição em Brasília, 18 de novembro de 2016; e a uma instituição em Salvador, 5 de abril de 2017.

[95] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários da instituição, São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[96] Visita da Human Rights Watch a uma instituição, São Paulo, 14 de novembro de 2016.

[97] Visita da Human Rights Watch a uma instituição, Rio de Janeiro, 23 de março de 2018.

[98] Entrevista da Human Rights Watch com a direção da instituição, Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2016.

[99] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários da instituição, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[100] Entrevista da Human Rights Watch com Renata Ignarra, presidente da Fundação para a Infância e Adolescência (FIA), Rio de Janeiro, 9 de novembro de 2016.

[101] Visita da Human Rights Watch a uma instituição, Rio de Janeiro, 18 de novembro de 2016.

[102] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários da instituição, Nova Friburgo, 23 de março de 2018.

[103] Entrevista da Human Rights Watch com Antônia em uma instituição no Rio de Janeiro, 10 de novembro de 2016.

[104] Ibid.

[105] “A privação de capacidade jurídica às pessoas com deficiência e sua detenção contra a vontade em instituições, sem seu consentimento ou consentimento do seu substituto na tomada de decisões, é um problema habitual. Tal prática constitui uma privação arbitrária da liberdade e viola os artigos 12 e 14 da Convenção.” Comitê CDPD (CRPD, na sigla em inglês) da ONU, Comentário Geral Nº 1, UN Doc CRPD/C/GC/1, 19 de maio de 2014, parágrafo 40. Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos (ICCPR, na sigla em inglês), adotado em 16 de dezembro de 1966, G.A. Res. 2200A (XXI), 21 U.N. GAOR Supp. (No. 16) em 52, UN Doc. A/6316 (1966), 999 U.N.T.S. 171, em vigor a partir de 23 de março de 1976, art. 9; ACHR art. 7; CDPD, art 14. Comitê CDPD Comentário Geral Nº 5, parágrafo. 27.

[106] Código de Processo Civil, Lei Nº 13.105, de 16 de março de 2015, arts. 747-763.

[107] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), art. 12(2) e (3).

[108] ICCPR 9(4) e Corte Interamericana de Direitos Humanos, Castillo Petruzzi et al. v. Peru, parágrafo 184. Quando não há recurso a Corte também considera a situação uma violação do direito a um recurso efetivo.

[109] Comitê de Direitos Humanos das Nações Unidas, Comentário Geral 35, Sobre a Liberdade e a Segurança da Pessoa [on Liberty and Security of Person], UN Doc CCPR/C/GC/35, 16 de dezembro de 2014, parágrafo 12.

[110] Entrevista da Human Rights Watch com funcionário da instituição, Rio de Janeiro, 7 de novembro de 2016.

[111] Entrevista da Human Rights Watch com funcionário da instituição, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[112] Entrevista da Human Rights Watch com a direção da instituição, São Paulo, 16 de novembro de 2016.

[113] Entrevistas da Human Rights Watch com funcionários da instituição, Brasília, 18 de novembro de 2016.

[114] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários da instituição, Bahia, 5 de abril de 2017.

[115] Entrevista da Human Rights Watch com a direção de uma residência inclusiva, São Paulo, 16 de novembro de 2016.

[116] Luciene Lima, O aroma de uma Vida
[117] Entrevista da Human Rights Watch com um funcionário da instituição, Rio de Janeiro, 19 de março de 2018.
[118] Entrevista da Human Rights Watch com Carolina [nome fictício], nas proximidades de Brasília, 18 de novembro de 2016.

[119] Entrevista da Human Rights Watch com Joseph [nome fictício], Rio de Janeiro, 19 de março de 2018.

[120] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários da instituição, Rio de Janeiro, 19 de março de 2018.

[121] Entrevista da Human Rights Watch com funcionários da instituição, São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[122] Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência), Nº 13.146/2015, de 6 de julho de 2015.

[123] Projeto de Lei do Senado N° 757, 2015, Ementa que altera a Lei N° 10.406, de 10 de janeiro de 2002 (Código Civil), a Lei N° 13.146, de 6 de julho de 2015 (Estatuto da Pessoa com Deficiência), e a Lei N° 13.105, de 16 de março de 2015 (Código de Processo Civil).

[124] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), art. 12(3).

[125] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), Comentário Geral 1, parágrafo 21.

[126] Os Conselhos De Assistência Social são consitidos por autoridades governamentais e membros da sociedade civil e participa na formulação avaliação, controle e monitoramento das políticas de assistência social.. Lei de Assistência Social, art. 9; Resolução do Conselho Nacional de Assistência Social, no. 109. A Human Rights Watch solicitou entrevista com funcionários dos Conslehos Municipais do Rio de Janeiro, São Paulo e Federal District, mas nenhum deles concordou em conceder entrevistas. O Conselho Municipal de Salvador concordou em ser entrevistado.

[127] Entrevista da Human Rights Watch com Roberto Souza, Promotor de Justiça em São Paulo, 26 de abril 2018.

[128] Ainda, cada Município no Brasil tem suas próprias normas e regulações, incluindo para as atividades dos Conselhos de Assistência social. Lei estabelecento o Conselho Municipal do Rio de Janeiro. legislação no. 2469, 30 de Agosto, 1996; Lei estabelecendo o Conselho Municipal de Assistência Social de São Paulo, lei no. 12.524, 1º de Dezenbri de 1997.

[129] Resolução do Conselho Nacional de Assistência Social no. 16, 5 de maio 2010; E, por exemplo, lei estabelecendo o Conselho Municipal de Assistência Municipal do Distrito Federal, Lei nº 997, 29 de Dezembro de 1995.

[130] Estatuto do Conselho Municipal de Assistência Social do Rio de Janeiro, art. 2, section XVII.

[131] Entrevista da Human Rights Watch com Jozias Sousa, Presidente do Conselho Municipal de Assistência Social de Salvador, Bahia. 19 de Abril de 2018.

[132] Apenas juizes especializados em infância e juventude podem determinar a institucionalização de uma criança em caráter excepcional e temporário, de no máximo 18 meses, como medida protetiva quando os direitos da criança estão ameaçados e não há outras alternativas. Uma explicação mais completa foi elencada acima.

[133] Uma resolução de junho de 2011 do Conselho Nacional do Ministério Público Federal instruiu que todos os Ministérios Públicos a realizar relatórios periódicos de abrigos para criança de acordo com o tamanho do Município em questão. Resolução No. 71, 15 de Junho de 2011.

[134] Entrevista da Human Rights Watch Entrevista com Roberto Souza, Ministério Público do Estado de São Paulo, 26 de abril de 2018

[135] Recomendação do Conselho Nacional do Ministério Público Federal no. 64, 24 de janeiro de 2018. A recomendação estabelece que Ministérios Públicos devem assegurar que instituições de acolhimento provenham condições físicas, material, e recursos para funcionários de forma adequada.

[136] “Promotoria pede afastamento da direção do Abrigo dos Excepcionais de Ceilândia", Diário de Ceilândia, 19 de dezembro de 2014, http://www.diariodeceilandia.com.br/2014/12/promotoria-pede-afastamento-da-direcao.html (acessado em 2 de fevereiro 2018).

[137] Entrevistas da Human Rights Watch com Luisa de Marillac, Ministério Público do Distrito Federal, Brasília, 18 de novembro de 2016; com Eliane de Lima Pereira, Rafael Luiz Lemos de Souza, Rodrigo Merina, Ministério Público do Estado do Rio de Janeiro, 28 de março de 2017; com Sandra Lucía García Massud and Luciana Bergamo, Ministério Público do Estado de São Paulo, 3 de abril de 2017; com Pedro Gonzales, Defensoria Pública Estadual do Rio de Janeiro, 11 de novembro 2016; com Ana Virginia Rocha, Defensoria Pública Estadual da Bahia, 4 de abril de 2017.

[138] Entrevistas da Human Rights Watch com Luisa de Marillac, Ministério Público do Distrito Federal, 18 de novembro de 2016; com Sandra Lucía García Massud, Ministério Público do Estado de São Paulo, 3 de abril de 2017; e com Márcia Regina Ribeiro Teixeira, Ministério Público do Estado da Bahia, abril de 2017.

[139] Por exemplo, ver material de treinamento de Bizchhut (Centro de Direitos Humanos para a Pessoa com Deficiência de Israel) para instituições de justiça e agências para aplicação da lei para a implementação de ajustes procedimentais para pessoas com deficiência. Sharon Primor and Na’ama Lerner, “The Rights of Persons with Intellectual, Psychosocial and Communication Disabilities Access to Justice: Accommodations in the Criminal Process,” http://bizchut.org.il/he/wp-content/uploads/2015/01/Booklet-The-right-of-persons-with-disabilities-to-access-to-justice.pdf (acessado em 9 de abril de 2018).

[140] Conselho Nacional do Ministério Público, “Um olhar mais atento aos serviços de acolhimento de crianças e adolescentes no país,” Relatório da Resolução N° 71/2011, 2013, p. 87.

[141] Entrevista da Human Rights Watch com Celia Barcellos, Rio de Janeiro, 28 de março de 2017. De acordo com a Lei orgânica que regula o Benefício de Prestação Continuada (BPC), essencialmente todas as pessoas com deficiência que vivem em instituições, independentemente da renda de suas famílias, têm o direito de receber o benefício, pois não vivem com a família. Decreto Nº 6.214, 26 de setembro de 2007, art. 4, V.

[142] Entrevista da Human Rights Watch com Vilma, mãe de uma menina de 13 anos com deficiência, Salvador, 5 de abril de 2017.

[143] Entrevista da Human Rights Watch com a direção de uma instituição, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.

[144] Entrevista da Human Rights Watch com Roseli, mãe de João, um jovem com deficiência, Rio de Janeiro, 9 de novembro de 2016.

[145] Entrevista da Human Rights Watch com Álvaro [nome fictício], instituição na Bahia, 6 de novembro de 2017.

[146] Entrevista da Human Rights Watch com Catarina, Rio de Janeiro, 27 de março de 2017, e correspondência da Human Rights Watch por WhatsApp com um diretor de uma instituição, 25 de janeiro de 2018.

[147] Entrevista da Human Rights Watch com Rita Barreto, Rio de Janeiro, 11 de novembro de 2016.

[148] Entrevista da Human Rights Watch com um diretor de instituição, Rio de Janeiro, 28 de março de 2017.

[149] Entrevista da Human Rights Watch com Janete Aparecida Giorgetti Valente, Secretária Municipal de Cidadania, Assistência e Inclusão Social, Campinas, 30 de março 2017.
[150] Entrevista da Human Rights Watch com Flavia [nome fictício], Rio de Janeiro, 27 de março de 2017.

[151] Entrevista da Human Rights Watch com Pedro González, defensor público, Rio de Janeiro, 11 de novembro de 2016.

[152] Ver por exemplo, “Institutional care is eight times more expensive than social services support to vulnerable families,” Lumos, “The Cost of Change,” https://www.wearelumos.org/what-we-do/policy/cost-of-change/ (acessado em 14 de fevereiro de 2018); UNICEF, “Towards Alternative Care Services in Armenia: Costing Residential Care,” https://resourcecentre.savethechildren.net/library/towards-alternative-child-care-services-armenia-costing-residential-care (acessado em 14 de fevereiro de 2018). O estudo da UNICEF constatou que: “serviços de instituições residenciais são muito caros”…“a realocação de crianças para cuidados de famílias não necessariamente cria ônus extra ao orçamento do Estado” e que “o corte de gastos pode ser considerável.” De acordo com um estudo do Reino Unido de 2008, o custo médio de manutenção de uma criança por uma semana em uma instituição residencial é 4,5 vezes maior do que em moradias independentes, oito vezes maior do que em lares adotivos, 9,5 vezes maior do que em moradia com família e amigos e 12,5 vezes maior do que em moradia com os próprios pais. Para cada criança colocada em uma instituição residencial, oito crianças poderiam ser colocadas em lares adotivos. H. Ward, L. Holmes, J. Soper, “Costs and consequences of placing children in care,” Jessica Kingsley Publishers, 2008, em Report of the Ad Hoc Expert Group on the Transition from Institutional to Community-Based Care, 2009, p. 13. Um relatório do Tribunal de Contas Nacional da Estônia mostrou que o Estado paga entre 10.000 e 16.000 kroon por mês para cada criança criada em um lar substituto, enquanto em lares adotivos cada criança custa 3000 kroon. Tribunal de Contas Nacional da Estônia, conforme citado em “Opening Doors for Europe’s Children: Deinstitutionalization and Quality Alternative Care for Europe’s Children,” setembro de 2014.

[153] Grupo Europeu de Especialistas na Transição de Cuidados Institucionais para Cuidados Comunitários [European Expert Group on the Transition from Institutional to Community-based Care], “Common European Guidelines on the Transition from Institutional to Community-Based Care,” Bruxelas, novembro de 2012, pp. 102-103

[154] Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS), Resolução Nº 109, de 11 de novembro de 2009.

[155] Serviço de Acolhimento Institucional para Jovens e Adultos com Deficiência em Residências Inclusivas, “Orientações Técnicas Preliminares, Perguntas e Respostas,” http://www.ocuidador.com.br/imgs/utilidades/cartilha01-50fd29d85bec3.pdf (acessado em 5 de maio de 2018).

[156] Ibid., pp. 10- 11.
[157] Censo SUAS 2016, p. 10.

[158] “Orientações sobre o Serviço de Acolhimento Institucional para Jovens e Adultos com Deficiência em Residências Inclusivas, Perguntas e Respostas,” novembro de 2014, p. 9.

[159] Ibid., e relatório do governo brasileiro enviado ao Comitê da CDPD, 2012, parágrafo 154. Resolução Nº 109, de 11 de novembro de 2009.

[160] Para mais informações sobre este programa favor acessar: http://www.mpsp.mp.br/portal/page/portal/cao_civel/aa_ppdeficiencia/aa_ppd_diversos/Perguntas%20e%20Respostas%20sobre%20Residencia%20Inclusiva.pdf.

[161] Entrevista da Human Rights Watch com o diretor de uma residência inclusiva, São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[162] Escritório do Alto Comissário da ONU para os Direitos Humanos (OHCHR, na sigla em inglês), “Thematic study on the right of persons with disabilities to live independently and be included in the community,” A/HRC/28/37, 12 de dezembro de 2014, parágrafo 21; e Comentário Geral Nº 5, parágrafo 16 do Comitê da CDPD.

[163] Entrevista da Human Rights Watch com Francisco [nome fictício], São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[164] Entrevista da Human Rights Watch com Francisco, São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[165] Entrevista da Human Rights Watch com Mariana, São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[166] Entrevista da Human Rights Watch com a direção de uma residência inclusiva, São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[167] Visita da Human Rights Watch a uma residência inclusiva, São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[168] Entrevista da Human Rights Watch com a direção de uma residência inclusiva, São Paulo, 15 de novembro de 2016.

[169] Comentário Geral Nº 5, parágrafo. 16, do Comitê da CDPD.

[170] Comitê da CDPD, Comentário Geral Nº 5, parágrafo 16.

[171] CDPD (CRPD, na sigla em inglês), preâmbulo (J).

[172] Comitê da CDPD, Comentário Geral Nº 5, parágrafo 16.

[173] Human Rights Watch, “Croatia: Locked up and Neglected. Meager Progress on Moving People with Disabilities into the Community,” Comunicado de Imprensa, 6 de outubro de 2014, https://www.hrw.org/news/2014/10/06/croatia-locked-and-neglected.

[174] “Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes,” p. 95.

[175] Entrevista da Human Rights Watch com Claudia Vidigal, Secretária Nacional do Conselho Nacional para Crianças e Adolescentes, Brasília, 15 de novembro de 2016.

[176]  “Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes.”

[177] Isso é feito no nível municipal por meio do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS).

[178] A proteção social especial é administrada pelo Centro de Referência Especializado de Assistência Social (CREAS), que funciona nos níveis municipal, estadual ou regional.

[179] Entrevista da Human Rights Watch com Janete Aparecida Giorgetti Valente, Secretária Municipal de Cidadania, Assistência e Inclusão Social, Campinas, 30 de março de 2017.

[180] Ver: Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias, http://mds.gov.br/assistencia-social-suas/servicos-e-programas/servico-de-protecao-social-especial-para-pessoas-com-deficiencia-idosas-e-suas-familias.

[181]  “TCU aponta necessidade de política permanente de proteção aos direitos da pessoa com deficiência”, 10 de outubro de 2017, http://portal.tcu.gov.br/imprensa/noticias/tcu-aponta-necessidade-de-politica-permanente-de-protecao-aos-direitos-da-pessoa-com-deficiencia.htm (acessado em 5 de maio de 2018).
[182] Lei que cria o Bolsa Família e dá outras providências, Lei Nº 10.836, de 9 de janeiro de 2004.

[183] “Bolsa Família chega a 225 mil novas famílias em janeiro”, Ministério do Desenvolvimento Social, janeiro de 2018, http://mds.gov.br/area-de-imprensa/noticias/2018/janeiro/bolsa-familia-chega-a-225-mil-novas-familias-em-janeiro (acessado em 7 de fevereiro de 2018).

[184] Para concederem o direito ao BPC, especialistas médicos e assistentes sociais do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) precisam conduzir uma avaliação médica da deficiência e do grau de impossibilitação. O direito ao BPC é reavaliado a cada dois anos. Lei Orgânica da Assistência Social, N° 8.742, de 7 de dezembro de 1993, art 20.3.
[185] Constituição da República Federativa do Brasil, 1988, art. 203, sec. IV; Lei Orgânica da Assistência Social, arts. 2 e 20.
[186] Lei Orgânica da Assistência Social, art. 20.4.
[187] Ministério Público de São Paulo, Inquérito Civil Nº 033/2017, vol. 1.
[188] Entrevista da Human Rights Watch com a direção da instituição, Nova Friburgo, 23 de março de 2018.

[189] “Guia para Técnicos e Gestores da Assistência Social sobre alterações nas regras de Operacionalização do Benefício de Prestação Continuada | BPC,” Ministério do Desenvolvimento Social, http://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Catalogo/cartilha_bpc_2017.pdf.

[190] Entrevista da Human Rights Watch com Luciana, Rio de Janeiro, 11 de novembro de 2016.
[191] Entrevista da Human Rights Watch com Neiva Correa Marino e Carlos Eduardo Cruz, Rio de Janeiro, 27 de março de 2017.
[192] Entrevista da Human Rights Watch com Raquel Terra, Obra Social Dona Meca, instituição filantrópica, Rio de Janeiro, 8 de novembro de 2016.
[193] Entrevista da Human Rights Watch com Janete Valente Giorgetti Valente.

[194]Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes.” p. 83.

[195] Censo SUAS 2016, p. 14.
[196] Entrevista da Human Rights Watch com Isabel Penteado, São Paulo, 31 de março de 2017.
[197] Entrevista da Human Rights Watch com o juiz Reinaldo Cintra Torres de Carvalho, 13 de novembro de 2016.
[198] Entrevista da Human Rights Watch com Janete Aparecida Giorgetti Valente. Desde a sua criação há 20 anos, o programa de famílias adotivas no município colocou 190 crianças em lares adotivos.
[199] Entrevista da Human Rights Watch com Janete Aparecida Giorgetti Valente, e Lei Municipal de Campinas N° 14.253, de 02 de maio de 2012, art. 14.1.
[200] Ibid. 
[201] Em São Paulo, nos últimos 10 anos, 88 crianças com deficiência foram adotadas de instituições. Ministério Público de São Paulo, Inquérito Civil N° 033/2017, volume 1, p. 71.

[202] “Larissa: quebrando a barreira da adoção de crianças com deficiência”, Conselho Nacional de Justiça (CNJ), 13 de março de 2018, http://www.cnj.jus.br/index.php?option=com_content&view=article&id=86328:larissa-quebrando-a-barreira-da-adocao-de-criancas-com-deficiencia-2&catid=813:cnj&Itemid=4640&acm=257617_10526 (acessado em 13 de março de 2018).

[203] De acordo com o cadastro, 14.380 candidatos afirmaram que aceitariam crianças “com outras condições de saúde,” Cadastro Nacional de Adoção, Conselho Nacional de Justiça (CNJ), http://www.cnj.jus.br/cnanovo/pages/publico/index.jsf (acessado em 15 de fevereiro de 2018).
[204] ECA, arts. 47.9 e 88, VII.
[205] Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência.
[206] Ibid., art. 94.