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China

Events of 2021

O presidente chinês Xi Jinping aparece em um telão em uma feira comercial em Pequim para promover os esportes de inverno antes dos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim em 2022, China, 5 de setembro de 2021.

© 2021 AP Photo / Ng Han Guan

Sob o comando do presidente Xi Jinping, o governo chinês dobrou a repressão dentro e fora do país em 2021. Sua política de “tolerância zero” em relação à Covid-19 conferiu maior poder às autoridades, que impuseram duras políticas em nome da saúde pública.

A manipulação de informações exercida por Pequim se tornou generalizada: o governo censura, pune dissidentes, propaga desinformação e busca controlar as grandes empresas de tecnologia. A internet, outrora palco de uma pluralidade de discursos, é agora dominada por vozes pró-governo que transmitem às autoridades informações sobre pessoas cujas opiniões são consideradas insuficientemente nacionalistas.

O governo chinês defendeu valores mais conservadores em 2021, reduzindo o espaço para lésbicas, gays, bissexuais e trans (LGBT) e dos direitos das mulheres - questões anteriormente consideradas menos sensíveis. Pequim se tornou menos tolerante às críticas de empresários privados. Em julho, tribunais impuseram uma sentença de 18 anos a Sun Dawu, um empresário do setor agrícola que apoia ativistas de direitos humanos, por crimes vagos. Tribunais já tinham proferido uma sentença igualmente dura a Ren Zhiqiang, um empresário do setor imobiliário.

A mais recente promessa de Xi de combater a desigualdade e proporcionar “prosperidade comum” se mostra um discurso vazio diante dos esforços de seu governo para abafar as vozes populares. Depois da autoimolação de um caminhoneiro em janeiro, o governo reforçou os controles regulatórios para proteger trabalhadores independentes e temporários, mas também reprimiu seu ativismo. A rápida expansão da desigualdade na China levou alguns jovens a defender uma forma de protesto social conhecida como “tang ping”, o qual é motivado por uma recusa do consumo e do trabalho degradante. O movimento foi condenado e censurado pelo governo chinês.

As autoridades devastaram as proteções aos direitos humanos e às liberdades civis em Hong Kong, transformando muitos dos comportamentos pacíficos integrantes da vida em Hong Kong, como a publicação de notícias, em atos de subversão. Um relatório de abril de 2021 da Human Rights Watch concluiu que as autoridades estavam cometendo crimes contra a humanidade enquanto conduziam um ataque sistemático e generalizado aos uigures e outros muçulmanos turcos em Xinjiang, incluindo detenções em massa, tortura e perseguição cultural. Os tibetanos continuam sendo submetidos a graves abusos, incluindo severas e longas prisões, por exercerem seus direitos básicos.

O histórico do governo chinês em matéria de direitos e sua “diplomacia do lobo guerreiro” resultaram em percepções públicas cada vez mais negativas do governo em alguns países no exterior. Uma nova pesquisa da AidData revelou US$ 385 bilhões em “dívidas ocultas” de países em desenvolvimento às autoridades chinesas. Alguns governos estrangeiros adotaram medidas mais concretas para pressionar o governo chinês a melhorar seu histórico de direitos no plano doméstico e no exterior, mas essas medidas permaneceram inadequadas para enfrentar efetivamente o alcance e a escala dos abusos de Pequim.

Hong Kong

Autoridades de Pequim e de Hong Kong agiram agressivamente para reverter direitos em Hong Kong.

Ativistas pró-democracia foram presos e detidos arbitrariamente. Em janeiro, as autoridades prenderam 53 políticos por “subversão” por conta de seu envolvimento em uma pesquisa de opinião pública em julho de 2020. Em setembro, três membros do grupo Student Politicism (em português, Politicismo Estudantil) foram presos por “conspiração para incitar a subversão” por distribuírem lanches a manifestantes presos. Pessoas comuns foram presas por desobediência pública, por atos como a exibição de bandeiras com o slogan do protesto de 2019 que foi proibido, “Reclaim Hong Kong, Revolution of Our Times” (em português, “Libertar Hong Kong, Revolução dos Nossos Tempos").

Até a elaboração deste relatório, mais de 150 pessoas tinham sido presas por violar a severa Lei de Segurança Nacional (NSL, na sigla em inglês) desde que foi imposta em 30 de junho de 2020. Alguns suspeitos mantidos sob custódia por violarem a NSL foram maltratados. O ativista pró-democracia Tam Tak-chi seguia mantido em solitária desde que foi detido em setembro de 2020.

As autoridades transformaram as instituições quase democráticas de Hong Kong em órgãos de mera formalidade. Em março, Pequim impôs “reformas eleitorais”, exigindo que apenas os leais ao Partido Comunista Chinês pudessem ocupar uma cadeira no legislativo de Hong Kong. Em abril, após apelos dos cidadãos para que as pessoas votassem em branco como forma de protesto contra as mudanças, o governo revisou as leis eleitorais para incluir a proibição de “incitação de terceiros a votar em branco”, sujeito a sentenças de até três anos de prisão. Em setembro, quando o governo exigiu que os membros eleitos do Conselho Distrital - um órgão consultivo que aconselha o governo sobre questões locais - fizessem um juramento de lealdade, cerca da metade de seus membros renunciou, prevendo que seriam desqualificados pelo governo por conta de suas opiniões pró-democracia.

As autoridades proibiram a vigília anual do Victoria Park em homenagem às vítimas do massacre da Praça Tiananmen em Pequim, ocorrido em 1989. No dia da vigília, a polícia prendeu o vice-presidente do grupo organizador da vigília Hong Kong Alliance (em português, Aliança Hong Kong), isolou o parque e posicionou policiais em toda a cidade para evitar celebrações. Em setembro, a polícia congelou US$ 283.000 em ativos da Hong Kong Alliance, fechou o “Museu Memorial do 4 de junho” dedicado à memória do massacre, revogou seu registro, excluiu suas contas nas redes sociais e prendeu seus quatro líderes por “incitação à subversão”.

Dezenas de organizações da sociedade civil foram desfeitas em 2021, incluindo o grupo organizador de protestos Civil Human Rights Front (em português, Frente Civil dos Direitos Humanos) em agosto e o grupo de assistência jurídica 612 Humanitarian Relief Fund (em português, Fundo de Ajuda Humanitária 612) em novembro. As principais organizações trabalhistas, incluindo o Sindicato de Professores Profissionais de Hong Kong e a Confederação de Sindicatos de Hong Kong (HKCTU, na sigla em inglês), se dissolveram em agosto e setembro, respectivamente.

Ao longo de 2021, os jornais de Pequim difamaram a Ordem dos Advogados de Hong Kong e seu presidente, Paul Harris, e pediram sua renúncia. Em agosto, um candidato pró-democracia retirou-se de uma eleição do conselho da Law Society (em português, Sociedade de Direito), uma associação de advogados, e declarou ter sofrido ameaças a si mesmo e sua família. Posteriormente, os candidatos com vínculos com Pequim ganharam a eleição.

As autoridades também atacaram a liberdade de imprensa. Elas forçaram o segundo jornal mais popular da cidade, o Apple Daily¸ a fechar as portas em junho, depois de terem detido seu dono, Jimmy Lai, altos executivos e editores, congelado os ativos de US$ 64 milhões de Lai e invadido a sede do jornal. Lai também foi condenado a um total de 14 meses de prisão em abril por participar de protestos; ele enfrentou seis acusações adicionais em quatro outros casos.

O governo assumiu o controle da anteriormente independente Radio Television Hong Kong (RTHK, na sigla em inglês). Em maio, o governo substituiu o chefe da RTHK por Li Pak Chuen, que não tinha experiência prévia em mídia. Li censurou programas sobre assuntos atuais, proibiu funcionários de comparecerem a eventos de premiação para a imprensa que reconheciam a importância de sua cobertura dos protestos de 2019 e demitiu jornalistas e apresentadores de programas por suas opiniões críticas ao governo.

Pela primeira vez a polícia censurou a internet por meio de bloqueio de sites. Em janeiro de 2021, a polícia ordenou aos provedores de serviços de internet que bloqueassem o acesso ao HKChronicles.com, um site que documenta abusos policiais e que revelou informações pessoais sobre policiais. Em junho, a pedido da polícia de Hong Kong, uma empresa de hospedagem de sites israelense retirou do ar uma iniciativa de exilados de Hong Kong, a 2021 Hong Kong Charter (em português, Carta de Hong Kong 2021), embora tenha reativado o site após críticas internacionais. Em setembro, a polícia de Hong Kong bloqueou o site do Museu Memorial do 4 de junho.

A liberdade acadêmica se deteriorou. Os órgãos administrativos das universidades foram hostis às associações estudantis ao longo de 2021 e vários acadêmicos foram demitidos ou não tiveram seus contratos renovados por conta de suas visões pró-democracia.

As autoridades censuraram a arte, forçando os cinemas a retirarem um documentário sobre os protestos de 2019 em março e obrigando um novo museu, chamado “M+”, a retirar uma obra do artista dissidente chinês Ai Weiwei de sua inauguração em novembro.

Xinjiang

As autoridades chinesas têm cometido crimes contra a humanidade contra os uigures e outros muçulmanos turcomenos em Xinjiang. Os abusos cometidos incluem detenção arbitrária em massa, tortura, desaparecimentos forçados, vigilância massiva, perseguição cultural e religiosa, separação de famílias, regresso forçado à China, trabalho forçado, violência sexual e violações de direitos reprodutivos. No entanto, poucas notícias saíram de Xinjiang em 2021, pois as autoridades mantiveram um controle rígido sobre as informações e o acesso, já limitado, à região foi ainda mais restrito devido às restrições de circulação por conta da COVID-19.

Informações confirmaram a prisão de alguns uigures que tinham desaparecido sob a abusiva campanha de Xinjiang contra o terrorismo violento “Strike Hard Campaign against Violent Terrorism” (em português, “Campanha de ataque dura contra o terrorismo violento”), incluindo a renomada acadêmica Rahile Dawut – embora seu suposto crime, a duração da pena e o local da prisão permanecessem incertos. Também houve relatos de uigures que morreram em detenção, incluindo a pesquisadora de biotecnologia Mihriay Erkin, 31, o empresário Yaqub Haji, 45, e o poeta e editor Haji Mirzahid Kerimi, 82.

Um relatório do Uyghur Human Rights Project revelou que o governo de Xinjiang desapropriou uigures ao confiscar US$84,8 milhões em bens de 21 uigures presos e leiloá-los online.

Os governos vizinhos continuam a facilitar os abusos de Pequim. Em setembro, as autoridades do Cazaquistão baniram do país um pesquisador russo-americano, Yevgeniy Bunin, aparentemente para impossibilitar seu trabalho de documentação dos abusos de Xinjiang. Em setembro, a Turquia negou a entrada de Dolkun Isa, presidente da organização de exilados uigures Uyghur World Congress (em português, Congresso Mundial Uigur). Uigures que vivem no exterior, do Afeganistão ao Marrocos, temem deportações para a China, já que o governo chinês continua solicitando seu retorno por supostos crimes de terrorismo, um termo definido de forma vaga pela lei chinesa que abrange a expressão pacífica e defesa de direitos.

As empresas continuaram a ser submetidas a um escrutínio intensificado de seu envolvimento em Xinjiang. Em março, consumidores chineses boicotaram marcas internacionais de roupas para que se comprometessem a interromper a compra de algodão de Xinjiang devido a relatos de trabalhos forçados. Em abril, a polícia de Shenzhen fechou a filial chinesa de uma organização sem fins lucrativos de auditoria trabalhista dos Estados Unidos, a Verite. Em julho, a empresa de fotografia norte-americana Kodak excluiu do Instagram uma postagem de um fotógrafo que chamou Xinjiang de “distópica”. A agência de Alfândega e Proteção de Fronteiras dos EUA emitiu diversas proibições de importação relacionadas a Xinjiang, incluindo algodão e tomate de Xinjiang, assim como produtos derivados fabricados fora da região, mas que usam algodão e tomates de Xinjiang. Há uma mobilização crescente para que outros países imponham proibições semelhantes às importações de Xinjiang.

Tibete

As autoridades na região tibetana continuam a restringir severamente a liberdade de religião, de expressão, de circulação e de reunião. Elas também não respondem às preocupações populares sobre a mineração e a apropriação de terras por autoridades locais, que geralmente envolvem intimidação e uso ilegal da força pelas forças de segurança.

Em 2021, após o anúncio em novembro de 2020, de um maior controle das comunicações online que “comprometem a unidade nacional”, houve uma onda de detenções de tibetanos por supostos crimes online. Em particular, os tibetanos que se comunicaram com pessoas de fora da China foram perseguidos e punidos, independentemente do conteúdo de suas comunicações.

O governo intensificou políticas assimilação cultural coercitivas. As aulas de língua chinesa já eram obrigatórias para professores de escolas, funcionários locais e estagiários. Em julho, as autoridades anunciaram que os jardins de infância em áreas de minorias étnicas devem usar o chinês como meio de instrução. Durante a conferência nacional “Trabalho Étnico”, em agosto, o presidente Xi enfatizou a subordinação das identidades de minorias à uma única identidade nacional.

As autoridades aumentaram a vigilância e a perseguição em todos os níveis, desde online até bairros e escolas, e fizeram com que protestos – como aqueles contra o desvalorização da língua minoritária da Mongólia Interior em 2020 – se tornassem praticamente impossíveis na região tibetana.

Pelo menos oito tibetanos detidos ou suspeitos foram libertados em decorrência de problemas de saúde, alguns devido à tortura. Quatro deles morreram logo após sua liberação, embora o número verdadeiro ainda seja desconhecido devido ao alto controle de informações no Tibete.

COVID-19

As autoridades continuaram a deter ou processar judicialmente pessoas por criticarem a forma como o governo lidou com a pandemia de COVID-19. Entre janeiro de 2020 e junho de 2021, a conta no Twitter SpeechFreedomCN registrou pelo menos 663 detenções por discursos relacionados à COVID-19. Em março, o professor aposentado Chen Zhaozhi foi julgado sob a acusação de “provocar confusão e causar problemas” por postar nas redes sociais “A pneumonia de Wuhan não é um vírus chinês, mas sim um vírus do Partido Comunista Chinês”.

Em agosto, um tribunal de Pequim sentenciou os ativistas Chen Mei e Cai Wei a 15 meses de prisão após condená-los por “provocar confusão e causar problemas”. Eles foram detidos em abril de 2020 por terem arquivado artigos online e postagens nas redes sociais sobre a pandemia que tinham sido censurados. No mesmo mês, a cidadã e jornalista presa Zhang Zhan adoeceu gravemente após uma greve de fome. Em dezembro de 2020, Zhang foi condenada a quatro anos de prisão depois de viajar para Wuhan para documentar a pandemia em abril. O jornalista independente Fang Bin, detido em abril de 2020 em Wuhan, continua desaparecido.

Em 2021, as autoridades lançaram uma campanha de vacinação em todo o país. Embora o governo central insista que o programa é voluntário, muitos protestaram online sobre as táticas abusivas das autoridades locais para aumentar as taxas de vacinação. Em alguns casos, a polícia deteve fisicamente as pessoas para vaciná-las à força; em outros, as autoridades anunciaram que suspenderiam os benefícios do governo para quem recusasse a vacinação ou condicionaram a matrícula escolar de estudantes à vacinação de toda a sua família. O ativista pela segurança de vacinas, He Fangmei, detido pelas autoridades de Henan em outubro de 2020, continua desaparecido.

Defensores dos direitos humanos

As autoridades continuaram a reprimir os defensores de direitos humanos. A polícia da província de Hunan deteve o ativista Ou Biaofeng em dezembro de 2020 e, mais tarde, acusou-o de "incitar subversão". Ou Biaofeng tem criticado abertamente o governo chinês e apoiado Dong Yaoqiong, cidadã que foi mantida em um hospital psiquiátrico por mais de um ano após ter jogado tinta em um pôster do presidente Xi em 2018. Em fevereiro, Dong foi supostamente levada para um hospital psiquiátrico novamente após ter postado no Twitter que estava sob vigilância policial.

Em janeiro de 2021, um tribunal da província de Guizhou condenou o ex-jornalista Zhang Jialong a um ano e meio de prisão por “provocar confusão e causar problemas” após criticar a censura do governo e fazer um apelo aos EUA para que ajudassem a “derrubar” o Grande Firewall, em uma reunião com o então Secretário de Estado dos EUA, John Kerry, em 2014.

Em abril, a polícia de Pequim prendeu o entregador e ativista de direitos trabalhistas Chen Guojiang, acusando-o de “provocar confusão e causar problemas” depois que ele tentou sindicalizar trabalhadores de entrega, enfraquecendo a promessa do governo de proteger os trabalhadores independentes de condições de trabalho perigosas.

Em maio, a polícia de Guangzhou deteve o ativista de direitos humanos e escritor Wang Aizhong, sob suspeita de “provocar brigas e causar problemas”.

Em julho, um tribunal na província de Hebei condenou o empresário do setor de agricultura, Sun Dawu, a 18 anos de prisão, sob acusações de “provocar confusão e causar problemas” e “reunir multidões para atacar agências estatais”. Sun também foi um apoiador de longa data de ativistas e advogados de direitos humanos.

Em agosto, um tribunal da província de Anhui condenou o ativista Zhou Weilin a três anos e meio de prisão por seus tweets com críticas ao governo e pelos artigos que escreveu para o site da Rights Defense Network (em português, Rede de Defesa de Direitos), com sede no exterior.

Também em agosto, Cheng Yuan, Liu Yongze e Wu Gejianxiong, fundador e funcionários do grupo antidiscriminação Changsha Funeng, foram condenados de dois a cinco anos de prisão em um julgamento secreto. As autoridades detiveram os três em julho de 2019, sob a acusação de “subversão”.

Em setembro, os renomados advogados de direitos humanos Ding Jiaxi e Xu Zhiyong foram indiciados por “subversão”. As autoridades detiveram os ativistas em dois momentos, no final de 2019 e no início de 2020, por participarem de encontros onde os participantes discutiam sobre direitos humanos e o futuro político da China. Em fevereiro, a polícia de Pequim deteve Li Qiaochu, uma ativista dos direitos trabalhistas e dos direitos das mulheres, e companheira de Xu Zhiyong, também acusando-a de “subversão”. Enquanto estava mantida em detenção, Li foi levada várias vezes a um hospital para tratamento de doenças mentais e físicas.

Também em setembro, as autoridades realizaram desaparecimento forçado de Huang Xueqin, jornalista e liderança do movimento #MeToo na China, e de Wang Jianbing, ativista de direitos trabalhistas. No mesmo mês, o advogado de direitos humanos, Chang Weiping, mantido em detenção, recebeu permissão das autoridades para se encontrar com seu advogado pela primeira vez desde seu desaparecimento forçado em 2020.

Liberdade de expressão

As autoridades perseguiram, detiveram ou processaram judicialmente várias pessoas por suas postagens online e mensagens privadas com críticas ao governo, apresentando acusações falaciosas por “difundir rumores”, “provocar confusão e causar problemas” e “insultar os líderes do país”. Uma reportagem do Wall Street Journal de 2021 concluiu que 58 usuários chineses foram punidos com penas de seis meses a quatro anos de prisão desde 2017 por suas postagens no Twitter, Facebook e YouTube - todas plataformas proibidas na China.

Um número crescente de pessoas foram punidas por discursos considerados “antipatrióticos”. Em fevereiro, pelo menos sete pessoas foram detidas por comentários em relação ao confronto contra as tropas indianas na fronteira. Em março, o governo aprovou uma disposição estipulando que caluniar “heróis e mártires” pode levar à punição de até três anos de prisão. O ex-jornalista Qiu Ziming foi condenado à pena máxima de três anos de prisão por dizer que o número real de soldados chineses mortos no confronto era maior do que o número oficial.

As autoridades continuaram a retirar conteúdos online não-alinhados com os “valores socialistas fundamentais”. Eles se voltaram contra celebridades “malcomportadas” e seus grupos de fãs online, além de banirem alguns reality shows. Em abril, um artigo escrito pelo ex-premiê Wen Jiaobao foi censurado do WeChat e de outros sites. No artigo, Jiaobao escrevia: “A China, na minha visão, deveria ser um país de justiça e imparcialidade”.

Em dezembro de 2020, a polícia de Pequim deteve Haze Fan, jornalista da Bloomberg News, sob suspeita de colocar em risco a segurança nacional. Em julho, a Liga da Juventude Comunista incentivou a perseguição e o doxing de jornalistas estrangeiros que cobriam o desastre da enchente em Zhengzhou.

Liberdade de religião

A lei chinesa permite que as pessoas pratiquem apenas cinco religiões oficialmente reconhecidas em instalações oficialmente aprovadas, e as autoridades mantêm o controle sobre as nomeações de funcionários, publicações, finanças e inscrições para cultos. Desde 2016, quando o presidente Xi pediu a “sinização das religiões”, que visa garantir que o Partido Comunista Chinês seja o árbitro da vida espiritual das pessoas, o controle do Estado sobre a religião aumentou.

Em 2021, a polícia prendeu pessoas que praticavam suas religiões fora dos parâmetros sancionados pelo Estado. Em maio, um tribunal de Shenzhen sentenciou quatro funcionários de uma empresa que vendia aparelhos de áudio que veiculavam a Bíblia de 15 meses a seis anos por “operar um negócio ilegal”. Em julho, cinco membros de uma “igreja doméstica” não autorizada na província de Shanxi foram detidos sob a suspeita de “cruzarem ilegalmente a fronteira” após comparecerem a uma conferência religiosa em janeiro de 2020 na Malásia. Em agosto, a polícia prendeu nove pessoas envolvidas com a Golden Lamp Church (em português, Igreja da Lâmpada de Ouro), uma “igreja doméstica” não autorizada em Linfen, na província de Shanxi.

As autoridades continuaram a empregar esforços para alterar o estilo arquitetônico das mesquitas e monumentos em todo o país para torná-los mais “chineses”, enquanto ativistas muçulmanos Hui afirmavam que a polícia tinha os perseguido por criticarem a medida.

Vigilância em massa

As autoridades investiram recursos na expansão de sistemas de vigilância em massa em todo o país, dada a ausência de proteções legais significativas contra a vigilância governamental ilegal ou abusiva. Empresas chinesas com vínculos declarados com o governo continuam a atrair atenção global quanto às suas práticas de coleta de dados.

O Comitê Permanente do Congresso Nacional do Povo aprovou a Lei de Proteção de Informações Pessoais (PIPL, na sigla em inglês) em agosto, uma regulamentação que representa um progresso significativo quanto à coleta de dados de consumidores pelas empresas. Embora esse mecanismo tem potencial para permita que cidadãos responsabilizem as empresas por meio de uma denúncia junto ao governo ou solicitando a representação legal de uma organização aprovada pelo governo, é improvável que esse mecanismo restrinja uso da vigilância em massa pelo Estado.

Direitos das mulheres e meninas

Março marcou o quinto aniversário da histórica Lei Contra a Violência Doméstica. Entretanto, as vítimas continuam a enfrentar uma difícil batalha ao buscarem proteção junto às autoridades e responsabilização de agressores. Em fevereiro, um artigo da ex-jornalista Ma Jinyu sobre os violentos abusos que ela sofreu por seu marido gerou uma acalorada discussão nas redes sociais sobre o persistente fracasso do governo em processar judicialmente casos de violência doméstica.

Questões de direitos das mulheres continuam a enfrentar censura online. Em abril, dezenas de contas nas redes sociais administradas por ativistas de direitos das mulheres, incluindo as contas das reconhecidas feministas Xiao Meili e Liang Xiaomen, foram abruptamente encerradas depois de serem atacadas e denunciadas por trolls nacionalistas.

Em junho, o governo chinês anunciou que relaxaria ainda mais as cotas de nascimento do país de dois para três filhos, depois da rígida política de “filho único” ter levado a uma crise demográfica e ao tráfico de pessoas. Muitas mulheres expressaram preocupação com o fato de que, sem medidas para aumentar o acesso à licença parental e aos cuidados equitativos, a mudança na política poderia exacerbar ainda mais a desigualdade de gênero. Uma pesquisa da Human Rights Watch concluiu que a política de dois filhos, em vigor de 2016 a 2021, piorou a discriminação de gênero no ambiente de trabalho.

Em setembro, o Conselho de Estado da República Popular da China, em suas “Diretrizes de Desenvolvimento da Mulher Chinesa” para 2021-2030, identificou a “redução dos abortos não medicamente necessários” como um passo em direção ao desenvolvimento das mulheres. Muitos expressaram preocupação de que o governo chinês poderia restringir ainda mais os direitos reprodutivos.

O movimento #MeToo ganhou nova força em 2021, depois que mais mulheres denunciaram assédio sexual cometidos por homens conhecidos. Em agosto, a polícia de Pequim prendeu o cantor Chinês-canadense Kris Wu por estupro. As autoridades em Hangzhou investigaram um gerente da gigante do comércio online, Alibaba, depois que alegações de estupro surgiram online. Em setembro, um tribunal de Pequim rejeitou um caso histórico de assédio sexual movido contra um conhecido apresentador de TV da emissora estatal CCTV depois de o juiz ter recusado os pedidos da parte autora de que fossem recolhidas provas essenciais, incluindo filmagens de câmeras de segurança.

Orientação sexual e identidade de gênero

Embora a China tenha descriminalizado a homossexualidade em 1997, o país carece de leis que protejam as pessoas da discriminação com base na orientação sexual ou identidade de gênero, além de uniões entre pessoas do mesmo sexo não serem legais. Em 2021 o governo chinês demostrou maior rigidez em relação à orientação sexual e às normas de gênero em 2021.

Em fevereiro, um tribunal da província de Jiangsu se manifestou a favor de um editor que descreveu a homossexualidade como um “distúrbio psicológico” em um material universitário. Em julho, a plataforma de rede social WeChat removeu dezenas de contas LGBT administradas por estudantes universitários, alegando que algumas haviam infringido as regras de comunicação online. Em setembro, o governo chinês baniu homens com estereótipos não masculinizados e a “estética anormal” do setor de entretenimento. O governo afirma ser necessário que a mídia estabeleça “padrões de beleza corretos” e divulgue “valores positivos”.

A Belt and Road Initiative

Anunciado em 2013, o Belt and Road Initiative (BRI, na sigla em inglês) é o programa de investimento e infraestrutura de um trilhão de dólares do governo da China que se estende por cerca de 70 países. Alguns projetos do BRI foram criticados por falta de transparência, por desconsiderar preocupações das comunidades locais e pelo potencial de degradação ambiental.

Em agosto, a Human Rights Watch publicou um relatório documentando violações dos direitos econômicos, sociais e culturais no Camboja, resultantes do deslocamento de quase 5.000 pessoas por conta da barragem de Lower Se San 2 entre 2013 e 2018 e os impactos na subsistência de dezenas de milhares de outras pessoas ao longo do rio. A barragem foi um projeto financiado pelo BRI principalmente por um banco estatal chinês e construído por uma empresa estatal chinesa de geração de energia.

A China Labor Watch, uma organização da sociedade civil, relatou, em abril, que trabalhadores chineses empregados  em projetos de infraestrutura do BRI no exterior, em países como a Argélia, Indonésia, Paquistão e outros, foram vítimas de tráfico de pessoas e trabalho forçado, inclusive sendo enganosamente recrutados para trabalhar ilegalmente, mantidos contra sua vontade e forçados a trabalhar enquanto infectados com COVID-19 no início e meados de 2020.

Políticas e ações de mudança climática

A China é de longe o maior emissor de gases de efeito estufa do mundo, contribuindo de maneira significativa à crise climática que está impactando cada vez mais os direitos humanos em todo o mundo. A China foi responsável por quase 70% das emissões globais em 2018, embora suas emissões per capita a coloquem apenas entre os 40 principais países. Grande parte da energia que alimentou o crescimento econômico da China provém do carvão, recurso que impulsiona essas emissões. A China é produtora de metade do carvão mundial e também é o maior importador de petróleo, gás e carvão.

A China é o maior financiador e empreendedor mundial de projetos de carvão no exterior, alguns deles por meio do BRI. O presidente Xi anunciou na Assembleia Geral da ONU em outubro que a China não iria mais “empreender novos projetos de energia movidos a carvão no exterior”. A China continua a desenvolver projetos de carvão internamente.

Em setembro de 2020, Xi anunciou que a China atingiria a neutralidade de carbono em 2060 e alcançaria o pico de emissões de carbono antes de 2030. Apesar dessas metas aprimoradas, o Climate Action Tracker (em português, Rastreador de Ação Climática) classifica a meta doméstica da China como “altamente insuficiente” para cumprir os objetivos do Acordo de Paris de limitar o aquecimento global a 1,5 °C acima dos níveis pré-industriais.

A China também lidera o uso de energia renovável no mundo e é o maior financiador de projetos renováveis ​​no exterior, alguns dos quais, no entanto, estão relacionados a violações dos direitos humanos. A China tem grande parte da capacidade de produção mundial dos materiais necessários para uma transição global para a energia renovável, incluindo turbinas eólicas, painéis solares e minerais. Alguns desses materiais são supostamente produzidos ​​em Xinjiang, suscitando preocupações sobre o emprego de trabalho forçado.

As importações de commodities agrícolas da China geram mais desmatamento globalmente do que as de qualquer outro mercado - incluindo as importações de todos os 27 estados membros da União Europeia juntos. Esse desmatamento é amplamente ilegal. Em novembro, em uma declaração conjunta da China e EUA emitida no contexto da cúpula global sobre o clima em Glasgow, os dois países afirmaram que contribuiriam para eliminar o desmatamento ilegal global, aplicando suas respectivas leis que proíbem as importações ilegais de madeira. A China ainda não aplica a restrição às importações ilegais de madeira que adotou em 2019.

Principais atores internacionais

O Canadá, a União Europeia, o Reino Unido e os Estados Unidos impuseram sanções coordenadas e bilaterais direcionadas a funcionários do governo chinês e empresas responsáveis ​​por graves violações dos direitos humanos, incluindo crimes internacionais, em Xinjiang. Os EUA também impuseram sanções a vários altos funcionários de Hong Kong por instituírem a Lei de Segurança Nacional. Em agosto, os EUA concederam à população de Hong Kong nos Estados Unidos um “refúgio” temporário de 18 meses.

Em setembro, a Alta Comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos, Michelle Bachelet, expressou “pesar” pelas autoridades não a terem concedido acesso significativo a Xinjiang e disse que seu escritório publicaria uma avaliação sobre os direitos humanos naquela região. Seu anúncio ocorreu após uma declaração conjunta manifestando preocupação por 44 governos na 47ª sessão do Conselho de Direitos Humanos da ONU. Uma declaração semelhante foi realizada por 43 governos na Assembleia Geral da ONU em outubro de 2021.

Parlamentares da Bélgica, Canadá, República Tcheca, Lituânia, Holanda e Reino Unido aprovaram resoluções acusando o governo chinês de cometer genocídio contra os uigures; alguns também solicitaram aos seus governos que limitassem a participação nos Jogos Olímpicos de Inverno de Pequim em 2022. O Parlamento do Reino Unido aprovou uma moção não vinculante de apoio a um boicote diplomático aos Jogos. Membros do Parlamento Europeu suspenderam a proposta de Acordo Global de Investimento da UE com a China, citando preocupações com os direitos humanos e paralisando a avaliação de negociações enquanto estiverem as sanções a Pequim forem aplicáveis. Em setembro, também foi adotada uma recomendação de uma nova estratégia da UE para a China, mais assertiva e melhor coordenada, que coloca os direitos humanos em primeiro plano.

Os Estados-Membros da UE continuaram a adotar fortes declarações no âmbito das Nações Unidas condenando os abusos de direitos humanos da China. Em julho, a Comissão Europeia publicou uma nota diretiva para ajudar empresas a lidar com o risco de trabalho forçado e, em setembro, a presidente da Comissão, Ursula von der Leyen, prometeu que a UE apresentaria uma legislação que proíba a entrada de produtos produzidos por  trabalho forçado no mercado da UE.

Empresas multinacionais enfrentaram maior pressão para cessar suas operações de Xinjiang devido a preocupações com o trabalho forçado. As empresas que expressaram publicamente suas preocupações sobre o assunto, incluindo H&M e Nike, foram alvo de um boicote por consumidores na China.

As empresas internacionais de tecnologia continuaram a facilitar a censura em suas operações na China. De acordo com uma reportagem do New York Times de maio, a Apple criou um mecanismo para rejeitar ou remover proativamente aplicativos que a empresa acredita que possam entrar em conflito com a censura do governo. Em junho, a Apple anunciou que não lançaria sua nova medida de privacidade, Private Relay, na China (a Apple se recusou a responder oficialmente a uma carta da Human Rights Watch sobre as questões). Também em junho, o New York Times relatou que o site de busca Bing, de propriedade da Microsoft, bloqueou os resultados de imagem e vídeo para a frase “homem tanque” em países como os EUA, Alemanha e Suíça. A Microsoft atribuiu o incidente a “erro humano acidental”. O LinkedIn, também de propriedade da Microsoft, citando a necessidade de cumprir as leis locais, bloqueou os perfis de alguns críticos do governo chinês e de pessoas associadas a organizações consideradas críticas ao governo, incluindo um funcionário da Human Rights Watch. Em outubro, o LinkedIn anunciou que estava encerrando seu serviço de networking profissional na China, apontando um “ambiente operacional desafiador”.

Poucas universidades em países democráticos adotaram medidas para proteger a liberdade de expressão de seus alunos e acadêmicos envolvendo críticas ao governo chinês. Na Austrália, uma pesquisa da Human Rights Watch constatou apenas fracos esforços para tratar desses problemas. Ao mesmo tempo, nenhuma das universidades com vínculos acadêmicos com Hong Kong desafiou publicamente o ataque claro das autoridades de Hong Kong à liberdade acadêmica no território, incluindo o assédio à associações estudantis e a demissão de professores pró-democracia.

Política externa

O governo chinês confirmou o uso da “diplomacia de reféns” ao libertar dois canadenses, Michael Kovrig e Michael Spavor, poucas horas depois de o Canadá permitir que o executivo da Huawei Meng Wanzhou, detido por supostas violações da lei de sanções dos EUA, retornasse à China.

No âmbito das Nações Unidas, as autoridades chinesas continuaram a reagir contra as críticas às violações de direitos humanos. O governo propôs uma resolução sobre o “combate ao legado do colonialismo” e continuou a apresentar outras resoluções – priorizando o desenvolvimento econômico, a “cooperação mutuamente benéfica” e “proporcionando uma vida melhor para todos” (sendo que a última foi retirada por falta de apoio) – as quais enfraqueceriam as normas internacionais ao mudarem o foco da responsabilização por violações de direitos. A China também bloqueou o acesso à fóruns da ONU a grupos da sociedade civil que se referem à Taiwan como um país independente.

Em agosto e setembro, o governo chinês agiu rapidamente para oferecer apoio ao novo e abusivo governo do Afeganistão, controlado pelo Talibã, deixando claras as suas preocupações de que a instabilidade naquele país não deveria permitir ameaças à segurança de Xinjiang ou do BRI.

Uma nova pesquisa mostra que campanhas de desinformação vinculadas ao governo chinês se difundiram em maior alcance, em mais idiomas ​​e em maior número de plataformas em todo o mundo, incluindo em 2021 sobre a origem da COVID-19.

Em resposta às sanções impostas em março à funcionários do governo, empresas e agências chinesas,  as autoridades chinesas acusaram vários funcionários da UE e grupos da sociedade civil de “espalhar maliciosamente mentiras e desinformação” e impuseram vagas sanções a eles. Em julho, Pequim anunciou outra rodada de sanções contra indivíduos e organizações com sede nos Estados Unidos, incluindo a Human Rights Watch.