O Conselho Nacional do Ministério Público, o órgão máximo de supervisão e conduta dos promotores de todo país, deu um grande passo ontem ao aprovar uma resolução que pode levar a melhorias significativas nos direitos humanos dos mais de 10.000 adultos com deficiência que vivem em instituições de acolhimento no Brasil.
A nova Resolução elaborada a partir de esforços da Comissão de Defesa dos Direitos Fundamentais, presidida pelo Conselheiro Luciano Nunes Maia, e aprovada por unanimidade, a partir do voto da Relatora Sandra Krieger, exige que promotores conduzam inspeções obrigatórias anuais em instituições de acolhimento para adultos com deficiência e adotem medidas jurídicas contra abusos ou falhas nas suas obrigações administrativas. Infelizmente, a resolução excluiu da inspeção ‘unidades de saúde’, no âmbito das quais vivem muitas pessoas com deficiência no Brasil. A nova resolução substitui uma recomendação não vinculante sobre as inspeções, o que na prática significava pouca fiscalização pelo Ministério Público.
A Human Rights Watch documentou abusos e negligência em instituições de acolhimento para pessoas com deficiência, muitas das quais são deixadas nestes espaços ainda crianças e lá permanecem por toda a vida, privadas de qualquer poder de escolha. Em um relatório publicado em 2018, documentamos condições deploráveis em muitas dessas instituições, incluindo o uso de restrições físicas e uso involuntário e inadequado de medicamentos psicoativos, serviços de saúde inadequados e negação da capacidade legal às pessoas institucionalizadas. Algumas pessoas inclusive relataram que mesmo quando queriam sair da instituição para passear, eram obrigadas a obter a permissão de familiares. A fiscalização pelo Ministério Público é essencial para prevenir e remediar abusos como tais. Neste relatório, recomendamos ao Ministério Público a instauração da obrigação de realizar inspeções regulares e completas para acabar com os abusos dentro das instituições, bem como esforços acelerados no sentido de promover a desinstitucionalização.
A Resolução insta os promotores a “promoverem medidas para progressiva desinstitucionalização” das pessoas com deficiência, ou seja, medidas para apoiá-las a viverem de forma independente na comunidade, em vez de viverem em instituições. Este é um reconhecimento notável, pelo Ministério Público, sobre o direito humano fundamental que gozam as pessoas com deficiência, de decidirem onde, como e com quem viver, com o apoio necessário. Esse direito é negado às pessoas forçadas a viverem em instituições. Isso significa investir recursos nos serviços prestados no âmbito da comunidade, de forma individualizada, como os serviços de assistentes pessoais. A resolução determina que os promotores estaduais monitorem também decisões judiciais que restrinjam a capacidade legal das pessoas com deficiência, e determinem sua revisão.
Os sistemas de saúde e de assistência social também deveriam garantir que as pessoas com deficiência não sejam forçadas a viver em condições abusivas devido à falta de opções que viabilizem sua vida independente na comunidade. Institucionalizar pessoas com deficiência e impedi-las de sair e que possam fazer escolhas, as priva ilegalmente de sua liberdade, e está mais do que na hora de acabar com isso.