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Brasil: Combata a Violência Policial no Rio e em São Paulo

Execuções Extrajudiciais Comprometem a Segurança Pública

(Rio de Janeiro) - Policiais do Rio de Janeiro e de São Paulo recorrem à força letal de forma rotineira, frequentemente cometendo execuções extrajudiciais e exacerbando a violência nos dois estados, afirmou a Human Rights Watch em relatório lançado hoje.

O relatório de 134 páginas, "Força Letal: Violência Policial e Segurança Pública no Rio de Janeiro e em São Paulo", examinou 51 casos nos quais policiais teriam executado supostos criminosos reportando em seguida que as vítimas haviam morrido em tiroteios enquanto resistiam à prisão.

As polícias do Rio e de São Paulo juntas matam mais do que 1.000 pessoas por ano em supostos confrontos. Embora alguns desses casos de homicídios cometidos pela polícia após suposta "resistência" sejam atos de legítima defesa, muitos outros são execuções extrajudiciais, concluiu o relatório.

 "A execução extrajudicial de suspeitos criminosos não é a resposta ao crime violento," disse José Miguel Vivanco, diretor da divisão das Américas da Human Rights Watch. "Os moradores do Rio e de São Paulo precisam de um policiamento mais eficaz e não de uma polícia mais violenta."

Homicídios ilegais cometidos pela polícia acabam por minar os esforços legítimos nos dois estados de combate à violência do crime organizado fortemente armado. No Rio, essas facções são em grande parte responsáveis por uma das mais altas taxas de homicídios do hemisfério. Em São Paulo, apesar da redução da taxa de homicídios na última década, a violência das facções criminosas também constitui uma grande ameaça.

A Human Rights Watch obteve provas críveis em 51 casos de "resistência" que contradizem as alegações dos policiais de que as vítimas teriam morrido em tiroteios. Por exemplo, em 33 casos, provas forenses não eram aparentemente compatíveis com as versões oficiais sobre o ocorrido- inclusive 17 casos nos quais os laudos necroscópicos demonstram que a polícia atirou nas vítimas à queima roupa. Os 51 casos não representam a totalidade do número de possíveis execuções extrajudiciais, mas servem como indicativo de um problema mais amplo, concluiu o relatório.

O relatório também se baseia em entrevistas detalhadas com mais de 40 autoridades da justiça criminal inclusive promotores e procuradores importantes que vêem as execuções extrajudiciais cometidas pela polícia como um grave problema nos dois estados.

Dados estatísticos governamentais apoiam a avaliação dos promotores de que o problema é generalizado:

  • As polícias do Rio e de São Paulo mataram mais de 11.000 pessoas desde 2003.
  • O número de homicídios cometidos pela polícia do Rio atingiu o nível recorde de 1.330 em 2007 e em 2008 o número de homicídios era o terceiro mais alto, atingindo 1.137 homicídios.
  • O número de homicídios no estado de São Paulo, embora seja menor do que no Rio, também é comparativamente alto: por exemplo, nos últimos cinco anos, a polícia do estado de São Paulo matou ao todo 2.176 pessoas, número maior do que as mortes cometidas por policiais em toda a África do Sul (1.623) no mesmo período de cinco anos, sendo que a África do Sul possui taxa de homicídio bem maior do que São Paulo.

O elevado número de homicídios cometidos pela polícia é ainda mais dramático ao lado dos comparativamente baixos números de civis feridos não fatalmente e de óbitos policiais.

  • O Comando de Policiamento de Choque da Polícia Militar de São Paulo matou 305 pessoas no período de 2004 a 2008, deixando apenas 20 feridos. Em todos esses supostos "tiroteios", a polícia sofreu um óbito.
  • No Rio, a polícia em 10 áreas, cada uma sob responsabilidade de um batalhão da polícia militar, foi responsável por 825 homicídios classificados como "autos de resistência" em 2008 sofrendo, no mesmo período, um total de 12 óbitos policiais.
  • A polícia do Rio prendeu 23 pessoas para cada pessoa que mataram em 2008 e a
    polícia de São Paulo prendeu 348 para cada vítima fatal. Comparativamente, a polícia dos Estados Unidos prendeu mais de 37.000 pessoas para cada vítima fatal em supostos confrontos no mesmo ano.

"Policiais são autorizados a usar força letal como último recurso para se protegerem ou protegerem outros," afirmou Vivanco. "Mas a noção de que esses homicídios seriam cometidos em legítima defesa ou seriam justificados pelos altos índices de criminalidade, é insustentável."

Além dos muitos homicídios após "resistência" cometidos todos os anos por policiais durante o expediente, policiais matam mais centenas enquanto atuam fora do expediente, frequentemente quando agem como membros de milícias no Rio e em grupos de extermínio em São Paulo.

Os policiais responsáveis por homicídios no Rio e em São Paulo raramente são levados à Justiça. A causa principal dessa falha crônica de responsabilizar os policiais em casos de assassinatos, o relatório afirmou, é que os sistemas de justiça penal dos dois estados atualmente dependem quase que inteiramente de investigadores da polícia para resolver
esses casos.

A Human Rights Watch conclui que policiais frequentemente tomam medidas para acobertar a natureza real dos homicídios após "resistência". Além disso, investigadores da polícia geralmente não tomam as medidas necessárias para determinar a verdade dos fatos, garantindo dessa maneira que não se possa determinar a responsabilidade criminal nos casos e que os autores dos crimes permaneçam impunes.

"Enquanto couber às polícias investigar a si mesmas, essas execuções continuarão e os esforços legítimos de combater a violência nos dois estado serão enfraquecidos," disse Vivanco.

O relatório apresenta recomendações para as autoridades do Rio e de São Paulo para reduzir a violência policial e melhorar a aplicação da lei. A recomendação central é a criação de unidades especializadas dentro dos Ministérios Públicos Estaduais para investigar homicídios após "resistência" e garantir que os policiais responsáveis por execuções extrajudiciais sejam responsabilizados criminalmente.

O relatório também detalha medidas que as autoridades estaduais e federais deveriam tomar para maximizar a eficácia dessas unidades especiais,  dentre elas:

  • Exigir que os policiais notifiquem o Ministério Público sobre homicídios após
    "resistência" imediatamente após o ocorrido;
  • Estabelecer e rigorosamente implementar procedimentos para a preservação da cena do crime que impeçam que policiais realizem falsos "socorros" e outras técnicas de acobertamento; e
  • Investigar possíveis técnicas de acobertamento, inclusive falsos "socorros", e processar criminalmente os policiais que assim atuarem.

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