A poucos metros da entrada principal do Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento (MAPA), existe uma outra porta privativa. Para melhor compreender quem tem acesso a um dos ministérios mais poderosos do Brasil, a Repórter Brasil obteve um registro de quem entrou por esta segunda porta entre janeiro e novembro de 2023. A Human Rights Watch ajudou a digitalizar e transformar 381 páginas de uma lista de nomes manuscrita em um banco de dados pesquisável.
A Repórter Brasil identificou os 10 principais visitantes do ministério. Entre eles está João Henrique Hummel Vieira, peça-chave na fundação da Frente Parlamentar da Agropecuária (FPA), o maior grupo representando os interesses da agronegócio, e do Pensar Agro (Instituto Pensar Agropecuária), uma influente organização conhecida por suas atividades de lobby. Os registros mostram que Vieira fez 12 visitas ao ministério. Não se sabe o que exatamente estava na agenda cada vez que ele e outras pessoas se reuniram com servidores do MAPA.
Da mesma forma, o projeto de jornalismo investigativo O Joio e O Trigo recentemente analisou 752 reuniões entre representantes do governo federal e lobistas do agronegócio e da indústria química durante o período de outubro de 2022 a julho de 2024, e descobriu que as descrições dessas reuniões estavam frequentemente em branco ou eram genéricas.
Essas novas investigações evidenciam a opacidade em torno do lobby no Brasil e a necessidade urgente de regulamentações robustas que exijam transparência sobre o que é discutido e com quem, disponibilizando essas informações ao público por meio de registros pesquisáveis.
A falta de transparência é especialmente preocupante após os poderes do Ministério da Agricultura sobre os agrotóxicos aumentarem drasticamente em maio com a derrubada dos vetos do presidente Lula à “Lei do Veneno”. Notavelmente, a investigação do O Joio e O Trigo revelou que lobistas do agronegócio e da indústria química e empresas visitaram o Executivo com mais frequência durante abril e maio de 2024, quando o congresso ainda analisava os vetos do presidente Lula à “Lei do Veneno”.
Amplamente criticada por organizações locais, a “Lei do Veneno” concedeu ao MAPA a autoridade primária sobre a regulamentação dos agrotóxicos e abriu as portas para a aprovação regulatória de agrotóxicos nocivos no Brasil, que já é um dos maiores consumidores do mundo de agrotóxicos “altamente perigosos”.
A divulgação obrigatória de lobby e registros públicos pesquisáveis são essenciais para uma boa governança. Embora insuficientes por si só para limitar a influência corporativa sobre os órgãos públicos, essas medidas introduzem transparência. A União Europeia, o Canadá e os Estados Unidos têm registros públicos pesquisáveis.
Conglomerados globais que fabricam, importam ou exportam agrotóxicos, bem como empresas que adquirem produtos das fazendas brasileiras, deveriam estar cientes dos maiores riscos de direitos humanos ao operar em ambientes nos quais as aprovações rigorosas de agrotóxicos são enfraquecidas e o lobby corporativo é conduzido a portas fechadas.
A “Lei do Veneno” é um retrocesso para o escrutínio rigoroso dos agrotóxicos antes de serem aprovados. Agora, mais do que nunca, a transparência é fundamental para entender quem pode influenciar essa aprovação.