O governo brasileiro não cumpriu seu compromisso de lançar o Programa Nacional de Redução de Agrotóxicos hoje, Dia Mundial de Luta Contra os Agrotóxicos. O Brasil está entre os maiores consumidores de agrotóxicos do mundo, muitos dos quais são altamente perigosos.
Embora o plano tenha sido elaborado em 2014, o Ministério da Agricultura e Pecuária (MAPA) tem repetidamente bloqueado seu avanço. O fracasso dos ministérios envolvidos em chegarem a um acordo no dia de hoje é decepcionante para os cientistas, ativistas e agricultores familiares que lutam pelo programa há mais de uma década.
Possíveis atualizações no conteúdo do plano não foram divulgadas. O grupo interministerial responsável pelo plano deveria levá-lo adiante com urgência, sem mais adiamentos e sem enfraquecer a proposta de 2014.
O plano original de redução de agrotóxicos tem seis eixos. Inclui iniciativas para melhorar o monitoramento e a pesquisa sobre a exposição a agrotóxicos e os impactos na saúde, fortalecer as regulamentações sobre a pulverização de agrotóxicos, criar zonas livres de agrotóxicos, eliminar os benefícios fiscais aos agrotóxicos e incentivar alternativas agroecológicas, inclusive aumentando o acesso a créditos financeiros para produtores orgânicos.
De acordo com o plano original, o processo de registro deverá aplicar o princípio da precaução na avaliação de agrotóxicos, o que significa que o Brasil limitaria ou proibiria o uso de um agrotóxico sempre que houver razão para acreditar que ele poderia causar danos. Essa medida é ainda mais importante após a aprovação do “Pacote do Veneno”, que reduziu o papel dos ministérios da saúde e do meio ambiente na aprovação do uso de agrotóxicos, deixando o protagonismo com o MAPA.
O plano original também busca fortalecer o processo de registro de agrotóxicos e interromper o uso de daqueles que são proibidos em outros países devido aos riscos à saúde ou ao meio ambiente. Entre eles estão agrotóxicos proibidos na União Europeia, mas exportados e vendidos no Brasil. Em setembro, o presidente Luiz Inácio Lula da Silva criticou esse duplo padrão e o que descreveu como pressão de “empresários dos agrotóxicos” sobre o Congresso.
Investigações recentes revelaram que alguns fabricantes de agrotóxicos estão se reunindo frequentemente com o governo brasileiro. O grupo de jornalismo investigativo O Joio e O Trigo recentemente publicouuma investigação que revela que lobistas do agronegócio e agroquímicos tiveram 752 reuniões entre outubro de 2022 e agosto de 2024 com autoridades do governo federal. Dessas reuniões, mais da metade foi realizada por um dos três fabricantes europeus de agrotóxicos: BASF, Bayer ou Sygenta. Uma pesquisa recente liderada pela Repórter Brasil, com a colaboração da Human Rights Watch, mostrou que os lobistas do agronegócio estão frequentemente visitando o MAPA por uma porta privada.
As autoridades que impulsionam o plano de redução de agrotóxicos enfrentam forte oposição do agronegócio e das indústrias agroquímicas, mas deveriam permanecer leais aos importantes compromissos do plano. Já se passaram dez anos desde que o plano foi elaborado. Não deveria levar mais dez para colocá-lo em prática.