(Nova Iorque) – Os Estados Membros da União das Nações Sul-Americanas (Unasul) devem pressionar o governo venezuelano para que resolva imediatamente os graves problemas de direitos humanos que o país enfrenta, declarou hoje a Human Rights Watch em uma carta endereçada a diversos Ministros das Relações Exteriores da América Latina.
Desde que inúmeras manifestações eclodiram na Venezuela a partir de 12 de fevereiro de 2014, a Unasul, representada pelos governos do Brasil, Colômbia e Equador, tem tentado promover o diálogo entre o governo e a oposição. O governo venezuelano tem respondido aos protestos com uso excessivo da força e os integrantes do sistema de justiça têm sido coniventes com os abusos cometidos pelas forças de segurança. O diálogo está paralisado e o envolvimento da Unasul tem falhado em alcançar resultados concretos para melhorar a situação dos direitos humanos no país.
"Organismos internacionais, incluindo os responsáveis pelo monitoramento da situação dos direitos humanos das Nações Unidas e o Parlamento Europeu expressaram preocupação com as violações de direitos humanos na Venezuela, mas a Unasul ainda deve se manifestar sobre os sérios abusos cometidos por agentes do Estado no país", disse José Miguel Vivanco, diretor da Divisão das Américas da Human Rights Watch. "A ausência de um judiciário independente para conter os abusos do governo na Venezuela torna ainda mais premente que a Unasul pressione a administração de Maduro para que proteja os direitos dos manifestantes."
Na carta que foi encaminhada aos Ministros das Relações Exteriores Héctor Timerman da Argentina, Luiz Alberto Figueiredo Machado do Brasil, Heraldo Muñoz do Chile, María Ángela Holguín da Colômbia, Ricardo Patiño do Equador, Gonzalo Gutiérrez Reinel do Peru e Luis Almagro do Uruguai, a Human Rights Watch descreve as conclusões do seu mais recente relatório sobre abusos cometidos durante os protestos na Venezuela, “Punidos por Protestar: Violações de Direitos nas Ruas, Centros de Detenção e no Sistema Judicial da Venezuela”.
A pesquisa da Human Rights Watch mostra que, a partir de 12 de fevereiro, membros da Guarda Nacional Bolivariana, da Polícia Nacional Bolivariana e das forças policiais estaduais fizeram uso indevido e excessivo da força rotineiramente contra manifestantes desarmados e terceiros.
Os abusos incluíram espancamentos, disparos com armas de fogo, disparos de pistolas de pressão e bombas de gás lacrimogêneo indiscriminadamente contra manifestantes, além de disparos de pistolas de pressão de forma deliberada e à queima-roupa contra indivíduos desarmados e que já se encontravam sob custódia das autoridades. Estas violações constituíram uma prática sistemática adotada pelas forças de segurança venezuelanas contra os manifestantes, apontou a Human Rights Watch.
As forças de segurança têm agredido deliberadamente jornalistas e pessoas fotografando e filmando a repressão contra manifestantes, tolerado esses ataques ou, ainda, por vezes, colaborado diretamente com grupos armados pró-governo que atacavam manifestantes impunimente.
Muitas vezes as pessoas detidas foram levadas para bases militares e mantidas incomunicáveis por 48 horas ou mais, antes de serem apresentadas a um juiz. Os abusos que essas pessoas sofreram durante o período em custódia incluíram espancamentos, choques elétricos, queimaduras, além de terem sido coagidas a se agachar ou ajoelhar e a ficarem imóveis por horas. Em alguns casos, os maus-tratos claramente constituíram tortura.
Integrantes do sistema de justiça têm falhado no cumprimento de seu papel de salvaguarda contra o abuso de poder do Estado, sendo, ao contrário, muitas vezes parte das sérias violações ao devido processo legal, disse a Human Rights Watch .
Tanto o Presidente Nicolás Maduro quanto a Procuradora-Geral Luisa Ortega Díaz reconheceram que as forças de segurança cometeram violações contra os direitos humanos se comprometendo publicamente a investigar esses casos. Entretanto, há razões para que se duvide da credibilidade destas investigações, incluindo o fato de que o judiciário venezuelano deixou em grande parte de funcionar como um poder independente do governo. Além disso, o governo tem de forma rotineira buscado responsabilizar seus opositores políticos pela violência, ou simplesmente a oposição como um todo, sem oferecer provas criveis.
De acordo com o Tratado Constitutivo da Unasul, de 2008, “a integração e a união sul-americana são baseadas nos princípios orientadores da... democracia, participação dos cidadãos e pluralismo; [e] os direitos humanos universais, interdependentes e indivisíveis.” O tratado também estabelece que “instituições democráticas plenamente eficazes e o respeito irrestrito aos direitos humanos são condições essenciais à construção de um futuro comum de paz, prosperidade econômica e social e para o desenvolvimento dos processos de integração entre os Estados Membros.”
Os Estados Membros da Unasul devem exigir que o Presidente Maduro e outras autoridades competentes interrompam o uso excessivo e indevido da força durante as manifestações e acabem com toda a retórica que incite a violência contra os manifestantes e jornalistas, declarou a Human Rights Watch. As autoridades venezuelanas devem prontamente conduzir investigações rigorosas e imparciais sobre todas as possíveis violações de direitos humanos e imediatamente soltar as pessoas detidas ilegalmente por exercerem seus direitos fundamentais, além de adotarem medidas para restabelecer a independência do poder judiciário.
“À luz dos princípios orientadores da Unasul, seus membros devem pressionar as autoridades venezuelanas para que modifiquem seu histórico de violações e adotem medidas concretas com fins de respeitar os direitos fundamentais de seus cidadãos,” disse Vivanco.